George Enesco: elos com o Brasil. BRASIL-EUROPA 134/31. Bispo, A.A. (ed.). Academia Brasil-Europa e ISMPS





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BRASIL-EUROPA

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Ateneu de Bukarest

Enescu, Bukarest

Festival Enescu, Bukarest 2011

Ateneu de Bukarest

Enescu, Bukarest

Enescu, Iasi

Ateneu, Bukarest

Ateneu, Bukarest

Festival Enescu, Hermannstadt 2011

Fotos A.A.Bispo
©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 134/31 (2011:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2840


Academia Brasil-Europa


George Enesco (1881-1955) nos seus elos e paralelos com o Brasil



Trabalhos da A.B.E. pelo ano Liszt 2011 e pelos 130 anos de George Enesco. Bucareste, Festival Enescu

 

O presente ano de 2011 é marcado, na vida musical internacional, pelas comemorações dos 200 anos de Franz Liszt. No âmbito dos estudos euro-brasileiros, os trabalhos foram abertos por pesquisas relativas ao papel desempenhado pela pianista brasileira Guiomar Novaes (1895-1979) na divulgação de obras de Liszt nos Estados Unidos. Nesses estudos, salientou-se o significado da França na vida e na divulgação da obra de Liszt, acentuando-se a necessidade de uma orientação das atenções a contextos internacionais e interculturais nos estudos musicais. (vide http://www.revista.brasil-europa.eu/129/Henry_Finck_e_a_musica_do_Brasil.html) Os trabalhos tiveram continuidade considerando-se os complexos histórico-culturais que dizem respeito às relações entre processos de identidade na Europa Central e no do Sudeste e a França no contexto da Romênia.

Não se pode esquecer que parte do território da atual Romênia pertenceu à Hungria no século XIX, integrando esta o Império Austro-Húngaro. O passado vinculado à Hungria dessas regiões de antiga colonização alemã e a acentuada presença húngara na população de algumas cidades, assim como o processo de magiarização no contexto político interno da Dupla Monarquia, surgem de forma contrastante com o movimento nacional romeno. É compreensível, sob essa perspectiva, que a passagem 200 anos de Liszt tenha sido comemorada juntamente com datas referentes a outros compositores de importância para o país, em particular a dos 130 anos de George Enescu (1881-1955), visto na Romênia como o maior vulto de sua história musical.

Aproximações teórico-culturais a partir de enfoques brasileiros

Como ponto de partida para uma consideração de orientação teórico-cultural do vir-a-ser de Enescu oferece-se a sua inserção em complexo contexto cultural no qual o violino desempenhava importante papel.

Esse significado do violino em cidades pequenas do interior e mesmo em regiões rurais do passado não é desconhecido da pesquisa no Brasil; em regiões afastadas de grandes centros, por exemplo em cidades do São Francisco no Nordeste ou em regiões costeiras de São Paulo, tem-se constatado que o violino demorou mais a ser substituido pelo piano como principal instrumento da vida musical no século XIX, surgindo no exercício doméstico da música e como instrumento de mestres locais, passível de ser transportado em viagens por ocasião de execuções em outras cidades.

Em época anterior ao predomínio do órgão nas igrejas,  marcada pela prática da música orquestral, o violino surgia, no Brasil, como instrumento conotado com esferas mais elevadas artisticamente e de maior erudição na vida social e musical. Oferecia-se como instrumento por excelência para o ensino de jovens que demonstravam aptidões musicais, correspondendo a anelos de ascensão social e cultural de seus pais. Fora das igrejas, era o instrumento-guia de "mestres" em grupos tradicionais, aquele dos rabequistas de bailes e, em situações menos favoráveis, de penúria, de ganha-pão de mendicantes nas suas andanças.

Esse quadro sumário, necessariamente impreciso, chama a atenção a aspectos que devem ser considerados na pesquisa do papel desempenhado pelo violino em processos culturais. Foi o instrumento que, em passado remoto, possibilitava àquele inserido na dinâmica transformatória de culturas, desencadeada sobretudo por atividades missionárias, demonstrar o domínio da cultura do agente transformador, da sua integração e identificação com a cultura da sociedade predominante.

Tornou-se, assim, veículo de afirmação pessoal à procura de reconhecimento a partir do domínio técnico do instrumento. Esse processo integrativo era marcado por labilidade decorrente da situação social marcada por ambivalências causadas pelos laços com o meio de origem e os anelos de superá-los. Esses ímpetos contraditórios parecem poder esclarecer aspectos dos meios de expressão em situações marcadas por processos de mudanças culturais, em particular aqueles que indicam acentuadas necessidades auto-expressivas de cunho afetivo-emocional.

As condições histórico-políticas e culturais das regiões que passaram a constituir a Romênia na sua configuração atual parecem permitir a aplicação de perspectivas resultantes de estudos desenvolvidos em contextos brasileiros. Foi um espaço europeu marcado historicamente por encontros e alternâncias de supremacia de poderes e dominâncias culturais.

Enescu em Paris 1911

Processo de auto-afirmação romena e referenciais austríaco-alemães

À época do nascimento de Enescu, em 1881, ano em que datam os primeiros documentos relativos a contatos da Romênia com o Brasil (vide http://www.revista.brasil-europa.eu/134/Bucareste-Academia-Romana.html), o jovem país, resultante da união do Moldau e da Valáquia, era produto e encontrava-se inserido em processos culturais de auto-afirmação romena. Considerável parte do território que atualmente consistui a Romênia fazia parte do Império Austro-Húngaro, e as populações dos Siebenbürgen, região limítrofe á Bucovina, empenhavam-se em fortalecer a sua identidade alemã através da cultura e da educação perante a política de magiarização.

Sobretudo na esfera musical, a cultura musical austríaco-alemã surgia como modelar e orientadora de tendências. Hinos nacionais e música de representação de compositores alemães e austríacos marcavam simbolicamente a vida oficial e de Corte. Por um lado, o movimento romaniano, particularmente ativo em Iaşi (vide http://www.revista.brasil-europa.eu/134/Universidade-Iasi.html), vinculava-se, nos seus anelos político-culturais de valorização do romeno e de emancipação com a França, que os apoiava. Por outro lado, a cultura alemã continuava a ser a dominante, em particular na esfera musical. Poder-se-ia dizer, de modo sumário, que o campo de tensões franco-alemão que se manifestou sobretudo na Guerra Franco-Prussiana de 1870, teve reflexões nessa distante região da Europa. Essa polaridade de orientação segundo a França e o mundo musical austríaco-alemão marcou a vida e a obra de Enescu.

Nascido em região marcada pela provincialidade, no povoado de Liveni-Virnav, e crescido em Cracalia, a partir de 1884, Gheorghe Enescu cresceu em família de acentuados anelos de ascensão social e cultural e na qual a música desempenhava importante papel. Assim, o seu pai, cujo instrumento era o violino, era regente de coro, e a sua mãe tocava piano. O principal fator determinador de identidade era o da religião, a consciência de pertencimento ao universo da ortodoxia de tradição bizantina. Esse fator necessita ser considerado com especial atenção na formação de George Enescu, uma vez que o seu tio era religioso e músico sacro.

Parece ser significativo dar-se particular atenção à indicação de ter sido Enescu, com apenas quatro anos, introduzido no violino por um músico pertencente a um grupo populacional relacionado com complexos problemas de integração: o dos ciganos. A imitação de elementos e formas do repertório clássico e as tentativas composicionais do menino de apenas cinco anos poderiam ser interpretados como expressões da força dos impulsos à auto-afirmação no processo ascensional de integração em esfera cultural percebida como superior. Pelo diretor do Conservatório de Iaşi, Eduard Caudella (1841-1924), foi enviado a estudar em Viena. Compreende-se essa recomendação, uma vez que Caudella era filho do músico austríaco Franz Seraphim Caudella (1812-1867) que desempenhou papel significativo na vida musical de Iaşi, tendo êle próprio realizado estudos em Berlim e Frankfurt a.M. (vide artigo sobre a música sacra em Sibiu/Hermannstadt).

Na capital do Império Áustro-Húngaro, um dos principais vultos de violinista era Joseph Hellmesberger sen. (1828-1893), professor, diretor do Conservatório da Sociedade dos Amigos da Música, regente da Capela Real, que se salientou, sobre muitos outros aspectos, por esforços de profissionalização da atividade musical. Enescu habitou, a partir de 1888, com o professor de violino Josef Hellmesberger jr. (1855-1907). Quanto à sua formação teórica, foi marcado pelo ensino de Robert Fuchs (1847-1927), professor de teoria do Conservatório, tendo estudado contraponto com Johann Nepomuk Fuchs (1842-1899). Os estreitos elos de George Enescu nesses anos com a música alemã e nos conflitos internos do universo musical alemão se demonstram na sua proximidade a Johannes Brahms (1833-1897) e, quase que contraditoriamente, no fascínio que sobre êle exerceu o Wagnerianismo.

Formação, integração na França e reorientações identificatórias

Apesar dos profundos elos com o mundo musical alemão de sua formação, Enescu, correspondendo também aos ditames da orientação político-cultural romaniana à França, transferiu-se para Paris, em 1894. No Conservatório de Paris, onde os seus estudos se prolongaram até 1899, estudo primeiramente com Jules Massenet (1842-1912) e logo a seguir com Gabriel Fauré (1845-1924), ou seja, penetrou no universo músico-cultural marcado por aspirações de identidade francesa e de latinidade desses co-fundadores da Société Nationale de Musique. A inserção nessa esfera impregnada de anelos á galicanidade, explicáveis em parte como reação à derrota na Guerra Franco-Prussiana, parece explicar a transformação cultural experimentada por Enescu, que procurou integrar-se na cultura francesa.

A sólida formação teórica adquirida em Viena pode ter continuidade com aulas de contraponto e fuga sob André Gedalge (1856-1926), a sua inserção cultural, porém, passou a ser francesa. Essa perspectiva teórico-cultural dirigida a processos de integração e transformação de identidades elucida o fato constatado que algumas de suas obras, como um Andantino de Suite Orquestral de 1896, que denota ainda a presença da sua proximidade com Brahms em Viena, já sugerem o espírito francês na orquestração. Essa perspectiva, porém, sugere que se veja, na combinação da solidez  técnica e no rigor construtivo motívico e contrapontístico da sua formação alemã com uma elegância e élan de qualidades estéticas adquiridas na França uma mudança de posicionamento cultural: o da sua integração francesa.

Assim, por assim dizer em mudança prismática, é a partir de Paris que o desenvolvimento alemão passa a ser visto. Enescu, já marcado dos círculos que frequentou em Viena tanto pela a tradição que levava a L. van Beethoven como pela música de R. Wagner, parece ter passado a vê-los sob a perspectiva da capital francesa, que vivenciava, na sua época, o fascínio do Wagnerianismo e da revelação de obras de Beethoven. As conotações wagnerianas do sua Primeira Sinfonia, de 1903, necessitaria, assim, ser considerado sob essa perspectivação determinada pela recepção francesa da obra de Wagner.

O processo integrativo e de transformação cultural passado por Enescu em Paris não poderia deixar de ter influência na sua própria identidade cultural. A tomada de posição na visão dos desenvolvimentos a partir da França, deslocando-o relativamente àquele de Viena, acentuou a sua identificação com o movimento romaniano, com a valorização do romeno e da cultura romena de inspiração nacional que havia levado à constituição do reino originado da união do Moldau e da Valáquia.

Essa intensificação de sentimentos nacionais romanianos a partir de seus elos com a latinidade manifestou-se no opus 1 de sua obra, o Poème roumain, de 1898, apresentado nos Concerts Colonne, a 6 de fevereiro. O profundo cunho romantismo que inbuiu o movimento romaniano, de tão fortes vínculos de décadas com os círculos romenos de Paris, impregna essa obra com os seus traços que trazem Felix Mendelssohn Bartholdy (1809-1847) à lembrança.

Algumas semanas depois, a primeiro de março de 1898, Enescu dirigiu o Poème roumain no Athenäum de Bucareste, edifício simbólico dos elos culturais da Romênia com o mundo latino, inspirado no Ateneu de Madrid. Dando continuidade a esse direcionamento estético, alcançou sucesso com as suas Rapsódias Romenas op. 11, de 1901.

A dedicação à música de câmara de Enescu no início do século XX merece particular atenção sob a perspectiva dos estudos culturais. Foi na prática camerística, que assumiu crescente importância na vida musical da capital francesa na época, que estudantes e jovens músicos, sobretudo estrangeiros, encontravam possibilidades de atuação.

Como compositor de obras de câmara, escreveu, entre outras, obras para concursos finais do Conservatório, de cujas comissões examinadoras passou a integrar, entre elas para flauta e piano (Cantabile et presto), para viola e piano (Concertstück) e para trompete e piano (Légende). Em 1908, criou as Sept chansons de Clément Marot. Em 1902, Enescu fundou um Trio com Alfredo Casella (1883-1947) e o celista Louis Fournier. Casella havia sido o seu colega de estudos na classe de composição de Gabriel Fauré  e, como assistente de Alfred Cortot (1877-1962), representava o elo de Enescu com o círculo de estudantes desse pianista e destacado wagneriano. Em 1904, criou o Quarteto que passou a levar o seu nome.

Elos com o Brasil na França

George Enescu estudou violino não apenas com Martin Pierre Marsick (1847-1924), professor do Conservatório de Paris e também membro da Société Nationale de Musique, mas sim também com José Silvestre White Lafitte (1836-1918), o violinista cubano que havia vivido e atuado por dez anos no Rio de Janeiro, dirigido o Conservatório Imperial. José White, protegido pela Princesa Isabel, fora nomeado violinista da Côrte e fundara, com Arthur Napoleão (1843-1925), em 1883, a Sociedade de Concertos Clássicos.

No ano da proclamação da República no Brasil, José White passou a viver em Paris.

"Come abbiamo detto, egli venne a Rio de Janeiro nell'anno 1879, ove, oltre l'ammirazione del pubblico, si ebbe la valida ed onorata protezione della Principessa Isabella, di cui fu maestro d'accompagnamento e, del figlio, al quale diede lezioni di violino. Mercè quest'appoggio - appoggio che non venne mai meno, durante il lugo periodo della sua permanenza nella capitale dell'Impero - quivi rimaneva sino al giorno della proclamazione della Repubblica, svolgendo un programma di attività artistica veramente utilissima. Fondò, sotto gli auspici della detta Principessa, la Società dei Concerti Classici che, oltre alla musica da camera, organizzò e diresse vari eccellenti concerti sinfonici, i quali, al par di quelli del Club Beethoven, esercitarono un grande influsso sull'arte strumentale, in Rio de Janeiro.

Non sprovvisto di una certa cultura musicale, scrisse, per il violino, alcuni pezzi interessanti. Ben concepiti sono i suoi studi op. 13 e i novelli studi op. 35. Ad onta di ciò, egli soleva ricorrere, per destare maggiore entusiasmo, a due pezzi di ritmi bizzarri e di nullo pregio musicale; la Violonesca e la Zamacueca, danza cilena, colorita di suoni armonici e di pizzicati, rese interessanti dalla sua virtuosità." (Vincenzo Cernicchiaro, Storia della musica nel Brasile: dai tempi coloniali sino ai nostri giorni 1549-1925, Milão: Fratelli Riccioni 1926, 478)

Em Paris, como esse autor menciona, destacaram-se as sessões de música de câmara de José White na sala Flawland, em 1894. Através de José White, Enescu teve contato com um músico que conhecia profundamente o ambiente musical brasileiro e era estreitamente vinculado com a família imperial e, correspondentemente, com o movimento abolicionista. Assim, os elos da Romênia com Pedro II° através da França, documentados na solicitação feita pelo etnólogo Louis Léon Prunol de Rosny (1837-1914) para a condecoração de Vasile Alexandrescu-Urechia (1834-1914), que, criando singular paralelo, se inspirara, numa de suas principais obras, no movimento de emancipação norte-americana para a promoção dos anelos romenos (vide http://www.revista.brasil-europa.eu/134/Universidade-Iasi.html), teve continuidade com a proximidade de Enescu a José White.

Destacados músicos brasileiros que estudaram em Paris tiveram os mesmos professores de Enescu, recebendo, assim, similares impulsos estéticos. Pode-se lembrar aqui de Carlos de Mesquita (1864-1953), discípulo de Jules Massenet (http://www.revista.brasil-europa.eu/107/Carlos-de-Mesquita.htm). Daqueles que se deixaram fascinar pelo Wagnerianismo na sua recepção francesa pode-se citar Silvio Deolindo Fróes (http://www.revista.brasil-europa.eu/121/Deolindo-Froes.html)

Enescu era violinista e compositor de renome à época de estudo e de início de carreira européia de duas pianistas brasileiras que também receberam formação no Conservatório de Paris: a acima mencionada Guiomar Novaes e Magdalena Tagliaferro (1894-1986). Assim, em 1911,  ano em que Guiomar Novaes se apresentou na sala Érard com um recital que lançou as bases de sua carreira internacional, teve lugar, em Paris, um grande Festival Beethoven sob o patrocínio da Sociedade Francesa dos Amigos da Música, no qual também tomou parte Georges Enescu (http://www.revista.brasil-europa.eu/106/Paris-Guiomar-Novais.htm). O violinista romeno apresentou-se como executante do Concerto para violino de Beethoven, no dia 8 de maio desse ano, evento ao qual esteve presente a pianista brasileira.
Contato mais estreito houve entre Enescu e a pianista Magda Tagliaferro que, após a sua formação no Conservatório, deu continuidade a seus estudos sob a orientação de Alfred Cortot.  Pertencente assim a círculo com elos estéticos afins, desenvolveu-se colaboração artística entre Enescu e Tagliaferro, chegando a realizar tournées de concertos camerísticos. Esses elos com o círculo de Cortot teriam continuidade nos anos vinte, quando, em 1928, Enescu passou a orientar cursos na instituição vinculada ao nome e à tradição de Cortot, a École Normale de Musique.
Os anos da Primeira Guerra e aqueles que imediatamente a precederam foram marcadas por atividades intensas na Romênia. Em 1912, criou, em Bucareste, o Prêmio Enescu para composição. Os impulsos que Enescu ganhara da vida musical de Paris, sobretudo aqueles marcados pelo entusiasmo por L. v. Beethoven e R. Wagner marcaram as suas atividades na vida musical da Romênia. Assim, em 1914, dirigiu a primeira apresentação completa da IX. Sinfonia de Beethoven na Romênia. Pode-se dizer que esta foi uma repercussão do mencionado Festival Beethoven promovido em Paris por Félix Weingartner (1863-1942) em 1911.

Atividades na Romênia e paralelos com desenvolvimentos no Brasil

Enescu procurou ampliar o repertório de concertos, passando a desenvolver uma intensa atividade de difusão de obras pouco conhecidas na Romênia. Também a música de órgão foi por êle considerada, criando arquivo de partituras para o órgão do Ateneu de Bucareste. O seu renome e a sua influência, também junto à Côrte, manifestou-se no fato de ter sido nomeado, em 1916, membro honorário da Academia Romana, centro de irradiação do romanianismo.

Devido à Guerra, com a transferência da Côrte para Iaşi, também passou a viver nessa capital do Moldau, fundando uma orquestra com músicos locais e exilados, contribuindo, com os seus concertos, para a vida cultural e para o levantamento moral da população. Com a fundação da Sociedade de Compositores Romenos, tornou-se o seu primeiro presidente.

Uma de suas iniciativas foi a da promoção da criação de uma casa de ópera em Bucareste. Em 1921, manifestando o seu profundo conhecimento da obra de Wagner, dirigiu Lohengrin, inaugurando a Ópera Nacional. Dedicou-se, nesses anos, ao trabalho de composição daquela que seria a sua obra mais representativa, a ópera Oedipe.

Correspondendo à intensificação do interesse pela pesquisa do folclore romeno nesses anos posteriores à Guerra, a sua terceira sonata para violino (1926) testemunha uma atenção dirigida à cultura tradicional do país.

Também relativamente ao desenvolvimento de Enescu nos anos vinte, em particular nos últimos da década, constata-se paralelos com tendências no Brasil e que merecem atenção da pesquisa. Dentre os aspectos de sua vida que devem ser considerados paralelamente a aqueles de músicos brasileiros contam-se sobretudo a sua vida e atividades nos Estados Unidos, intensificadas nessa época. Assim, em 1928, dando aulas na Harvard University, inseriu-se em rêde de contatos e em contextos histórico-culturais aos quais também pertenceu Guiomar Novais.

Sob o aspecto político-cultural, também a pesquisa dedicada à atuação de músicos brasileiros ganha em diferenciação considerando-se a posição e as experiências do violinista e compositor romeno, cuja vida, nessa década, foi marcada primeira audição da sua ópera Oedipe na Ópera de Paris, em 1936.O seu interesse pela cultura popular romena, que se manifesta na sua terceira suite orquestral villageoise, de 1938, indica transformações de concepções sobre o nacional na música com relação àquelas de décadas anteriores que deveria ser considerado paralelamente com desenvolvimentos brasileiros.

A necessidade de considerações político-culturais nos estudos de Enescu e de seu significado também para a elucidação de tendências a que se filiaram significativos compositores e instrumentistas brasileiros é documentada pela intensidade de seu posicionamento anti-comunista: assim, a partir de 1946, após uma viagem pelos Estados Unidos, não mais retornou à Romênia. Em New York, passou a dar aulas na Mannes School of Music. Em 1952, deu início à realização de master-cursos em violino em Bryanstone e em Sienna, Itália, e que se prolongaram até 1954.


Círculo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo



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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "George Enesco (1881-1955) nos seus elos e paralelos com o Brasil". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 134/31 (2011:6). http://www.revista.brasil-europa.eu/134/George-Enescu.html




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