Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©

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Fotos A.A.Bispo, Stavanger (2012) ©Arquivo A.B.E.











 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 139/11 (2012:5)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização de estudos de processos culturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência -

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2012 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N°2929




O ver ouvindo e o ouvindo ver nas transformações do edifício cultural
De referenciações históricas de conhecimentos empíricos no exemplo de St. Swithin (ca. 800-862)
à Cartilagem auricular do Barroco protestante nórdico

 
Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©
Um dos mais importantes monumentos do patrimônio histórico e artístico-arquitetônico da Noruega é a catedral de Stavanger, a mas antiga sede episcopal do país.

Se a partir da metade do século XVII deixou de ser bispado, recuperou essa posição em 1925.

Hoje, apresenta-se como centro religioso, cultural e artístico-musical, onde a música adquire um papel particularmente relevante nos ofícios religiosos e onde se realizam recitais de órgão e concertos de projeção em todo o país e mesmo internacional.

Procurado justamente pela música no culto e pelos concertos que ali se realizam por visitantes de diferentes partes da Noruega e do Exterior, a catedral de Stavanger tornou-se exemplo de um novo tipo de peregrinação, onde a audição de obras musicais no espaço histórico serve à procura de vivência espiritual.

Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©
Também aqueles que se distanciaram da religião ou que não se identificam com a igreja e mesmo o Cristianismo surgem como peregrinos nessa acepção músico-cultural de peregrinação.
Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©
A audição de obras musicais no espaço histórico permite aqui uma experiência interior sem necessariamente exigir identificações conscientes e explícitas, de forma vaga mas atuante, pois possibilita o receptor a percepção de formas, estruturas e princípios de organização musical intrínsecos ao que ouve.

Nesse sentido, a catedral torna-se quase que local de um culto musical, que age nos participantes através de sua movimentação interna no sentido de um aguçamento da percepção para o subjacente à música que se desenvolve no tempo e que revela uma arquitetura interior.

Da percepção auditiva da música que decorre no tempo, o ouvinte é sensibilizado ou mesmo educado a perceber estruturações intrínsecas ou construções de natureza espacial. Percebendo que esse edifício se encontra imanente à música que se desenvolve no tempo e que o move interiormente, o ouvinte é preparado para perceber a vigência de um princípio que se move e movimenta assim manifestado na decorrência sonora e que leva ao que não se movimenta.

Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©
A experiência estético-musical pode servir, assim, como sensibilização para uma compreensão do mundo que vem de encontro a concepções de remotas origens transmitidas através dos séculos cristãos em doutrinas teológicas.

Essa experiência contribui a que mesmo o peregrino distanciado da igreja e do Cristianismo, mesmo o não-cristão e o agnóstico passe a perceber o mundo que reconhece pelos sentidos e a própria existência, sempre em movimento, como expressão de um movimentado que possibilita o reconhecimento de mecanismos e ordenações a êle intrinsecos.

Estas, invisíveis mas passíveis de serem reconhecidas pelo intelecto, que levam à acepção de um princípio original que não se movimenta e tudo move.

Singularmente, assim, a experiência auditiva dos peregrinos que procuram o histórico espaço da catedral relaciona-se com a leitura do mundo perceptível nos seus sentidos e, assim, com a visão. Do que foi "visto" ao ouvir a música, aquele assim preparado passa a ouvir no mundo que vê uma lógica inerente que se manifesta movendo e movimentando, ou seja uma espécie de música intrínseca. Esta pode ser compreendida antes como um canto, pois pode ser reconhecida pelo intelecto tal como um canto através de suas palavras. Levando à acepção de uma instância última que não se move e tudo movimenta, este surge como o que emite a palavra cantante, do emitente que fala e o todo surge sob um signo acústico ou musical em sentido figurado.

Catedral de Stavanger.Foto A.A.Bispo 2012 ©

Há assim interações entre o ouvindo ver e o ver ouvindo, entre a experiência músico-auditiva da percepção do espaço no tempo e da experiência visual da percepção de decorrências de tempo no espaço, da vivência do ouvinte que, sem se mover, ouve vendo, e daquela do que percorre o espaço da catedral que, movendo-se, ouve. Essas interações entre música e arquitetura e suas implicações e consequências mais profundas, que se tornam conscientes ao peregrino que se dirige antes pelo culto à música e à vivência do espaço à catedral de Stavanger merecem necessariamente e por diversos motivos atenção nos Estudos Culturais.

A procura do edifício religioso também por não-cristãos para experiências interiores possibilitada pela arquitetura e pela música, as transformações de culto a que esse desenvolvimento leva e que fundamenta inclusive tentativas de emprêgo da música e da arquitetura para fins de evangelização manifestam processos culturais de amplas dimensões no presente e que podem ser estudados de forma exemplar na catedral de Stavanger como centro secular de peregrinações. Constata-se nele, entre outros aspectos, uma tendência à abstração quanto ao histórico dos textos bíblicos, resumindo-se estes em sessões espirituais catedralícias dominadas pela música a meditações contemplativas e a breves orações.

A leitura de textos do Velho e do Novo Testamento e as pregações, de central importância no Protestantismo que tanto marcou a história da catedral de Stavanger na sua Reformação e que se manifesta no seu púlpito como principal foco de atenção do seu interior, passam a sua função de primazia à música.

Aquele que procura a catedral e se encontra presente, continua a ser aquele que ouve, agora já não tanto as palavras do leitor e pregador, cujo conteúdo por muitos não pode ser mais aceito, mas dos sons do órgão e de outros instrumentos ou da música vocal.

A recepção auditiva, o ver através do ouvir mantém-se como princípio predominante.

Assim considerando, em visão retrospectiva da história, a Reformação, dirigindo antes a atenção à leitura dos textos bíblicos e à compreensão literal das Escrituras, acentuando o histórico-narrativo em prejuízo ao entendimento de estruturas, imagens e sentidos velados, levou, por complexos caminhos que surgem como paradoxais, a uma intensificação da recepção auditiva do homem que, agora, passa a dispensar referenciações históricas do narrado, recuperando a capacidade do ver o sistemático imanente ao que decorre no tempo.

A catedral de Stavanger traz, assim, à consciência da necessidade de uma maior diferenciação no tratamento teórico de relações entre a narratividade e o estrutural, ou seja, do prosseguimento das discussões do ciclo de estudos mediterrâneo-atlânticos. (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/138/Estudos-e-Esclarecimento.html)

Retrospectivamente, esse direcionamento dado ao narrativo e ao sentido literal da Reformação surge como uma preparação aos desenvolvimentos constatados no presente e que se caracterizam pela manutenção da primazia da recepção auditiva concomitantemente à perda do narrativo de referenciações históricas.

Nesse sentido, um processo de início reducionista na leitura e no entendimento do edifício cultural teria levado a uma situação promissora quanto ao Esclarecimento, pois teria acentuado a sensibilidade perceptiva do ouvir do homem e, através dela, ao ver o não-visível. Os riscos obscurantistas de fundamentação religiosa no presente residiriam não em ocorrências do passado, mas sim em tendências atuais de re-acentuação da referenciação histórico-narrativa.

Assim considerando, a atenção dos Estudos Culturais dirige-se a analisar mudanças que teriam ocorrido entre uma primazia do ver ouvindo de um passado mais remoto àquela do ouvir vendo do Cristianismo e que teriam tido um momento crucial na Reformação.


A catedral de Stavanger como centro de peregrinações da Idade Média

Para esses estudos e reflexões, a catedral de Stavanger oferece condições particularmente favoráveis. Se hoje pode ser considerada sobretudo como centro de peregrinação daqueles que a procuram pela vivência espiritual de sua música e arquitetura, no passado medieval foi um dos principais centros de peregrinação do Norte da Europa, cuja maior riqueza eram as muitas relíquias que possuía.

A ela dirigiam-se caminhos de diferentes regiões, constituindo foco de rêde de vias e comunicações de vasta região. Desempenhou papel importante na formação de um sentido de comunidade de identificação cristã na Noruega a partir de referenciações históricas determinadas pelos santos nela cultuados e que teve o seu fim com a Reforma protestante.

A consciência histórica possibilitada pelo culto de santos mantinha viva a memória dos caminhos seguidos pela Cristianização do território da atual Noruega nos seus elos com as ilhas britânicas. Um bispo de origem inglêsa, Reinald (+1135), deu início , em 1100, à construção da catedral no local de uma igreja mais antiga, sendo a obra terminada apenas em 1150. A catedral remonta assim à época da fundação do bispado pela sua separação daquele de Bergen e que foi aquela da elevação de Stavanger a cidade (1125).

Os elos com as ilhas britânicas manifestam-se da forma mais evidente no estilo anglo-normano da construção e que pode ser constatado apesar das várias reconstruções por que a catedral passou no decorrer dos séculos. Assim, em 1272, por ter sido danificada por um incêndio que assolou a cidade, a igreja foi reconstruída, já apresentando elementos góticos, presentes ainda hoje no seu coro, no portal e narthex, onde se encontram sepulturas e epitáfios.

Os elementos mais antigos da construção apresentam figuras significativas do universo de imagens em que vivia o cristão medieval. Este é o caso sobretudo dos capitéis das colunas românicas que separam a nave central, mais elevada, das laterais. Como conhecido da arquitetura românica de outras regiões da Europa, predominam aqui representações de figuras animalescas e de demônios em diferentes formas que assolam o homem na sua existência.

Culto a Sto. Swithin nos seus vínculos com a história político-cultural britânica

Principal testemunho dos elos com as ilhas britânicas do culto de santos de Stavanger medieval é Sto. Swithin, que dá o nome à catedral.

Como em muitos outros casos, S. Swithin ou Svithun levanta problemas para os estudos hagiográficos devido à ausência ou deficiência de documentos comprovadores de muitos aspectos do seu culto. Sabe-se que, nascido em família anglo-saxã de antiga estirpe, entrou na Ordem Beneditina, tendo estudado teologia e sendo consagrado sacerdote.

A sua erudição e autoridade levaram a que desempenhasse papel político como conselheiro à época da regência do rei Egbert de Wessex (770-839), sepultado na catedral de Winchester. A história desse soberano é marcada por um período de exílio entre os Francos no continente europeu, onde viveu vários anos. Egbert entrou na história sobretudo pela sua conquista da parte ocidental do país de Gales em 815, passando desde então Cornwal a pertencer a Wessex. A seu domínio submeteram-se outros territórios, entre eles Kent, Surrey, Sussex, Essex, East Anglia e Northumbria, tendo conquistado Mercia. Saiu vencedor de um ataque de dinamarqueses, em 838.

A sua estadia no continente e o fato de ter-se casado com uma princesa dos Francos, Redburga, que se supõe ter sido familiar de Carlos Magno (742/748-814), indica os estreitos elos da história cristã das ilhas britânicas com a época carolíngia e o contexto no qual deve ser considerado a ação de Swithin como Lord conselheiro, a quem foi confiada a educação dos futuros reis Ethelwulf (ca. 800-858) e Alfred O Grande (Ca. 847-899). Em 852, Swithin tornou-se bispo de Winchester, sendo ali sepultado.

O culto a S. Swithin em Stavanger indica não apenas os estreitos elos entre os primórdios da história cristã da Noruega com um período de extraordinária importância histórica das ilhas britânicas, a do início da hegemonia de Wessex.

Esse culto ao padroeiro de Hampshire, Winchester, Southwark na Noruega indica também elos entre processos de transformação cultural aptos a serem leidos de concepções e práticas vinculadas com S. Swithin e remontantes ao mundo britânico, possivelmente também ao franco, para ali transportadas.

Ainda que pouco mencionado em documentos da época, após cem anos de sua morte foi escolhido como padroeiro de Winchester após a sua restauração, substituindo assim a anterior dedicação a S. Pedro e São Paulo.

Ao redor do ano 1000 surgiu a Vita S. Swithuni, de Lantfred e Wulfstan; textos posteriores apresentam narrativas de cunho biográfico escrigas por um monge que veio para a Inglaterra junto com o bispo de Salisbury Hermann (1058-1078). Muito do que se conhece a respeito de sua vida são derivadas desse texto posterior. Nas suas visitas pela diocese, oferecia banquetes aos quais eram convidados pobres.

Teria sido o ministro de assuntos espirituais do rei, enquanto que dois outros bispo, Ealhstan de Sherborne, era ministro de assuntos materiais. Teria acompanhado Alfred na sua visita a Roma, em 856. 

A popularidade do seu culto na Idade Média pode ser lida na veneração de suas relíquias: a sua cabeça na catedral de Canterbury, um braço na Peterborough Abbey. Várias igrejas foram a êle dedicadas no sul da Inglaterra, em especial em Hampshire. Outras em Lincoln, Worcester e no ocidente da Noruega.

O dia de S. Swithin e a chuva. Historização de constatações do ano natural

Segundo narrativas, Swithin teria manifestado o desejo de ser enterrado no átrio da antiga catedral de Winchester, em local onde aqueles que passassem pudessem pisar no seu túmulo, sôbre êles caindo "a chuva doce dos céus". Quis ser enterrado não na igreja, mas fora dela, em lugar ermo e de passagem. Apenas em 971 o seu corpo foi removido para o interior da igreja, sendo a urna colocada numa plataforma atrás do altar principal. 

Essa narrativa tem sido vista como explicação da crença expressa em ditado popular de que se no dia de S. Swithun - 15 de julho na Inglaterra, 2 de julho na Noruega - chover, há chuva por 40 dias; se nesse dia não chover, também não chove nos próximos 40 dias.

Na pesquisa folclórica e hagiográfica, tem-se considerado que essa crença de S. Swithun como "santo do tempo", também expressa em ditados populares, encontra-se em outros contextos culturais. Ela é registrada também na França com relação a S, Medard, festejado no dia 8 de junho, S. Gervais e S. Protais, festejado no dia 19 de junho e S. Godelieve em Flandres (6 de julho).

Todas essas festas, que caem igualmente em fins da primavera e início do verão europeu, indicam similares fenômenos relacionados com a chuva em diferentes regiões e que eram observados na vida agrícola. Significativamente, na Alemanha, o dia 27 de junho, que apresenta conteúdos comparáveis, é conhecido no calendário camponês não com o nome de um santo, mas sim como o dia dos "sete que dormem".

Como se conhece do sistema de imagens de constelações remontantes à Antiguidade greco-romana, que harmonizou-se com o das religiões célticas e germânicas, os períodos do ano eram relacionados com determinos tipos paradigmáticos de heróis e divindades. Em muitos casos pode-se comprovar a substiuição desses tipos por justos do Velho e dos seus correspondentes anti-tipos por santos do Novo Testamento, e o mesmo deve ter ocorrido no caso de S. Swithin.

Do homem visual ao homem que se orienta segundo o narrado

Tem-se, aqui, na referenciação de personificações de ocorrências lidas na natureza segundo a história político-cultural cristã britânica um exemplo do início de um processo de transformação do homem fundamentalmente orientado segundo o ver àquele que ouve uma narrativa e interpreta regularidades na natureza a partir do históriado.

Se os elos de S. Swithin com a chuva e outras narrativas de cunho lendário relacionadas com ovos permaneceram vivas no culto de santos dos peregrinos medievais, mantendo viva através dos séculos, ainda que de forma referencida segundo narrativas, concepções e imagens derivadas da observação do mundo visível, o processo de narrativação alcançou o seu momento crucial com a implantação da Reforma.

O púlpito de Stavanger e a "cartilagem barroca". Monumento do ouvir como princípio

Apesar da de-catolização, o antigo centro de romarias e de culto de santos de Stavanger continuou a manter o seu significado como centro de cultura religiosa de cariz popular. Esse interesse da igreja agora reformada para estudos da arte denotadora de impulsos da tradição popular manifesta-se na configuração artística do seu púlpito, de 1658, e que documenta a fase de revitalização de Stavanger após período de decadência.

O seu artista, Andrew Lawrenceson Smith (ca. 1620-ca. 1695), nascido na Escócia, de onde emigrou para Bergen, estabelecendo-se em zona rural nas proximidades de Stavanger, surge como mais um testemunho dos estreitos elos culturais entre as ilhas britânicas e as costas norueguesas.

O púlpito por êle criado, terminado em 1658, tornou-se um dos mais exponentes exemplos do Barroco na Escandinávia. De Smith sobreviveram também epitáfios na Catedral e outras obras de arte na região de Stavanger.

Na sua configuração plástica, nas suas
pinturas e nas suas cores, o púlpito denota a proximidade com a arte popular. Pelas suas formas, que lembram a de um ouvido humano, tem sido interpretado sob a expressão de exemplo de "cartilagem barroca".

Esse conceito, porém, não pode ser entendido apenas sob o aspecto superficial das semelhanças externas da obra na sua linguagem barroca com o ouvido.

Ela ganha em sentido mais profundo considerando-se que se trata de um púlpito, local de leitura de textos bíblicos e de pregação, centro das atenções no Cristianismo reformado.

Ainda que não colocado no centro, por detrás ou acima do altar, como em muitas outras igrejas, o púlpito de Stavanger chama a si todas as atenções.

A imagem do ouvido revela também outras conotações que devem ser consideradas em estudos do Barroco no universo protestante. A atenção é dirigida ao ouvir, à recepção da Palavra, transformando-se assim toda a comunidade em grande ouvido.

Compreende-se, sob este aspecto, o papel extraordinário concedido à música na história da Reformação.

As reflexões encetadas em Stavanger abrem perspectivas para o esclarecimento de questões relativas à interpretação do Barroco nos países católicos e nos reformados. Sendo o Barroco no mundo católico a expressão por excelência da Contra-Reforma, levando à reconfiguração barroca de cidades e regiões no processo de re-catolização, como na Europa Central, (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/133/Jesuitas-Boemia-Brasil.html) a ocorrência de igrejas barrocas em regiões protestantes levanta questões.

O Barroco protestante tem sido em geral considerado como resultado de influência cultural e de recepção de tendências artísticas, o que não soluciona o paradoxo do emprêgo de meios de expressão que teriam originalmente surgido com função missionária e contra-reformatória no próprio universo cultural reformado. Dificilmente apontam-se justificativas mais profundas para o emprêgo em igrejas protestantes de meios artístico-visuais teatrais e encenatórios, onde concepções marianas desempenham fundamental papel.

O púlpito de Stavanger, porém, sugere um caminho para a solução dessa aparente incoerência. A imagem da concha, de tanto significado para o Barroco católico e que se relaciona estreitamente com Maria, surge como ouvido, indicando a receptividade auditiva daquele que ouve as leituras e as pregações feitas do púlpito. A imagem surge aqui como uma diferente interpretação do "Fiat" no contexto cultural católico e no reformado: o do homem que vendo ouve, e o do homem que ouve, vê.

Grupo de estudos sob a direção de

Antonio Alexandre Bispo





Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "O ver ouvindo e o ouvindo ver nas transformações do edifício cultural. De referenciações históricas de conhecimentos empíricos no exemplo de St. Swithin (ca. 800-862) à Cartilagem auricular do Barroco protestante nórdico". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 139/11 (2012:5). http://www.revista.brasil-europa.eu/139/Stavanger-Catedral.html




  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização Brasil-Europa, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens relativos à Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência (culturologia e sociologia da ciência), a seus institutos integrados de pesquisa e aos Centros de Estudos Culturais Brasil-Europa: http://www.brasil-europa.eu


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  3. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações, academias de letras ou outras páginas da Internet que passaram a empregar designações similares.