Université Laval, Québec e Laval de Montemorency. Revista BRASIL-EUROPA 128. Bispo, A.A. (Ed.). Organização de estudos culturais em relações internacionais





Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 128/24 (2010:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2680


A.B.E.



Da universidade na sua inserção em processos culturais transatlânticos II
Université Laval/ULAVAL: da história cultural universitária de expressão francofone no Canadá
na tradição de François Laval de Montemorency (1623-1708)

Ciclo "Indian Summer" preparatório aos 300 anos da ida ao Canadá de Joseph-François Lafitau (1681-1746)
pioneiro dos estudos culturais comparados, da Antropologia Cultural e disciplinas afins
Québec, Université Laval/ULAVAL



 
Quebec.Foto A.A.Bispo©


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  1. Fotos A.A.Bispo
    ©Arquivo A.B.E./I.S.M.P.S.e.V.

 
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Como relatado no primeiro número desta revista do corrente ano, a Academia Brasil-Europa vem desenvolvendo uma série de estudos motivados pela declaração, na Alemanha, de 2010 a "Ano da Ciência". No âmbito desses trabalhos procedem-se estudos relativos à inserção de universidades em contextos culturais, na Europa e em outros países, considerando-se elos entre as instituições.

Esses estudos têm como escopo trazer de forma mais intensa à consciência que a ciência e as instituições de pesquisa e ensino não se situam à parte de processos culturais, nem mesmo apenas os determinam, mas são elas próprias resultados desses processos e neles inseridas. Essa preocupação corresponde ao escopo da A.B.E. de relacionar estreitamente os estudos culturais ao estudo das próprias condições de produção do saber, com a análise de rêdes sociais envolvidas em contextos globais (science of science).

Também as universidades possuem características culturais próprias, que se manifestam na sua imagem, na sua identidade, na consciência de seus docentes e estudantes, influenciando o direcionamento de suas atividades, da pesquisa e das reflexões.

Esses trabalhos da A.B.E. vêm de encontro a exigências atuais, sobretudo em países europeus - como na Alemanha - nos quais reformas destinadas à homogeneização de programas e equiparações de títulos no âmbito do "Processo de Bologna" se revelam como questionáveis sob muitos aspectos, correndo-se o risco uma nivelação de instituições e, consequentemente, de empobrecimento da diversidade cultural e da perda de consciência quanto à inserção de universidades em processos histórico-culturais.

A consideração de universidades fora dos limites geográficos da Europa pode despertar a atenção para o significado de contextualizações, uma vez que as mais tradicionais dessas institucionais foram marcadas pela época e pelas circunstâncias de sua fundação por europeus, pela atividade de professores vindos da Europa ou nela especializados, prendendo-se assim a determinadas correntes de pensamento que marcaram a respectiva história institucional, determinaram continuidades mas também discontinuidades, transformações, adaptações e inovações exigidas pelas diferentes circunstâncias.

O estudo do posicionamento histórico-cultural e da função cultural-científica dessas universidades, sobretudo no continente americano, necessário para ações refletidas no ensino e na pesquisa, apenas pode ser feita a partir da consideração de seus pressupostos europeus. Reciprocamente, um estudo mais aprofundado do significado cultural de universidades européias ganham a partir da consideração de seus resultados, de suas extensões, de suas consequências e possibilidades de transformação em situações fora do continente europeu.

Universidade Laval (Université Laval, ULAVAL)


A Universidade Laval, das mais renomadas universidades canadenses, principal centro de formação cultural e científica de Québec e, em geral, da comunidade de língua francesa do Canadá, é uma das mais antigas do continente americano. A sua fundação é datada em 1663, no ano de ereção da Communauté des prêtres du Séminaire de Québec, origem do Grand Seminaire de Québec.


Surgiu, assim, nos seus fundamentos, apenas três décadas mais tarde do que o colégio que deu origem à Universidade de Harvard, na esfera inglêsa das colonias americanas. O seu vir-a-ser, porém, e o contexto cultural a que se prende diferem-na fundamentalmente da de Harvard.


A história da Universidade Laval insere-se no desenvolvimento do Catolicismo na Nouvelle France e à criação do seminário, importante instituição da história eclesiástica franco-canadense. Somente em 1852, com anuência do Govêrno real britânico, esse seminário passou a designar-se como Universidade Laval. Em 1878, a universidade abriu uma dependência em Montréal.


A Universidade Laval está, assim, estreitamente vinculada com a história da presença francesa na América do Norte. A sua história, atuação, significado e irradiação apenas podem ser estudados adequadamente neste contexto do Catolicismo franco-canadense e de contextos determinados por processos de identidade cultural.


A Universidade Laval, porém, não deve ser vista apenas como expressão de uma extensão de cultura universitária francesa ao continente americano. O Seminário, do qual se originou, nascido de exigências locais, estreitamente vinculado com movimentos do pensamento e da espiritualidade francesa de sua época, atuou no próprio desenvolvimento dessas tendências na Europa, adquirindo, assim, um significado que extrapola os limites da Nova França.


Quebec.Foto A.A.Bispo©


François Laval de Montmorency (1623-1708) na memória de Québec


A designação da Universidade Laval lembra a personalidade e a ação de D. François Laval de Montemorency, figura de particular relêvo na história eclesiástica e missionária do Canadá, cuja memória é perpetuada em monumento que marca, na sua encenação urbanística de alto poder sugestivo, a passagem da cidade baixa à parte alta da cidade de Québec.



Após ter sido escolhido como Vicário Apostólico da Nouvelle France, e ter sido sagrado, em Saint-Germain-des-Prés, em Paris, a bispo titular de Petra in Palaestina, François Laval de Montmorency partiu para o Canadá na data simbolicamente significativa da festa da Imaculada Conceição, a 8 de dezembro de 1658. Chegou a Québec a 16 de junho de 1659.


A sua Diocese abrangia uma área de extraordinárias dimensões, indo do São Lourenço à Acádia e ao Mississipi.


Poucos anos após a sua chegada fundou a já citada Comunidade de Sacerdotes do Seminário de Québec, em 1663, criada com a aprovação de Luís XIV (1638-1715). Em 1668, criou o Petit Seminaire de Québec, uma instituição que, após a tomada britânica, em 1765, foi transformada em escola pública.


O estreito relacionamento entre as atividades eclesiásticas de François Laval de Montmorency e a política colonial é testemunhado pelo fato de ter exercido por duas vezes o Govêrno Geral da Nouvelle France, respectivamente em 1663 e 1682.



Pressupostos da ação de Laval no Canadá: jesuítas e crise cultural


Ao chegar no Canadá, a missão católica entre os indígenas já contava com algumas décadas de atividades. Québec havia sido fundada em 1608, e a missão indígena iniciara-se em 1615, conduzida primeiramente por Franciscanos Recoletos.


Em 1625, a ação missionária foi assumida pelos jesuítas, tendo esses desenvolvido intensas atividades. A história missionária contava já com mártires, o que havia causado grande impressão na França e dado impulsos à causa.


Entre 1642 e 1648, ou seja, uma década antes da chegada de Laval, oito jesuítas, seis sacerdotes e dois irmãos, que viviam entre os Horones e Iroqueses, haviam sido mortos, transformando-se nos „mártires canadenses“: J. de Brébeuf, Antoine Daniel (1598-1648), Charles Garnier (1606-1649), Gabriel Lallemant (1610-1649), Noel Chabanel (1616-1649), e o grupo americano constituído por Isaac Jogues (1607-1646), René Goupil (1607-1642) e Jean de la Lande (†1646).



Desenvolvimentos críticos na Nouvelle France e repercussões na França


François Laval de Montmorency, atuando no Canadá, manteve contínuas relações com a França, garantindo, assim, recíprocas influências no desenrolar das correntes do pensamento teológico e missionário em ambos os contextos. No Canadá, realizou várias viagens pelo interior, sob condições adversas e enfrentando riscos de vida, o que marcou a historiografia.


Como as representações glorificantes do monumento de Québec demonstram, o seu nome ficou registrado sobretudo como protetor dos indígenas. Empenhou-se no combate ao álcool, utilizado pelos comerciantes para reduzir os índios a situações de dependência, destruindo-os fisica- e psiquicamente.


Esta preocupação seria também a de Joseph-François Lafitau SJ (1681-1746), chegado a Québec poucos anos após a morte de François Laval de Montmorency. Também êle constatou os problemas criados pelo convívio de indígenas com comerciantes europeus de peles, dos quais uma das expressões era o acostumar os indígenas ao álcool. Uma das soluções  era aqui vista na transferência dos nativos para regiões mais distantes. Despertar a consciência das autoridades européias para essa situação crítica foi uma das razões que levou Lafitau a retornar à Europa após poucos anos, o que pensava ser apenas uma volta temporária.


Esses fatos chamam a atenção para um dos problemas fundamentais dessa fase da história de processos transformatórios no Canada: a da falta de ética - e de sentimentos humanitários - de comerciantes de peles animais, ou seja, a do exemplo negativo dado pelos próprios cristãos aos indígenas e que prejudicavam os intuitos e a ação dos missionários.


Sob esse pano de fundo compreende-se que uma das principais preocupações tenha sido a de oferecer exemplos positivos do Cristianismo através de personalidades que encarnassem o que pregavam no seu modo de ser e no seu comportamento pessoal.


Entende-se, assim, a razão pela qual a história missionária do Canadá - e a sua história cultural em geral - foi marcada por uma forte tendência dirigida à exemplaridade de sacerdotes e religiosos, por correntes de cunho ascético-místico, obtendo assim antes um cunho de missão interna. Nesse esforço à exemplaridade, o Canadá vinculou-se a correspondentes movimentos então em desenvolvimento na França, neles também atuando e, assim, influenciando-os.


Os Sulpicianos em Québec


A criação da Comunidade de Sacerdotes do Seminário de Québec e do próprio Seminário, origem da Universidade Laval, não pode ser compreendida sem a consideração da história do movimento sulpiciano. Sulpicianos haviam chegado em 1657 a Québec, e em 1658 fundou-se o Vicariato Apostólico da Nouvelle France, cujo primeiro vicário foi Laval.


A história dos Sulpicianos remonta à transferência, para St. Sulpice, em Paris, de um seminário sacerdotal que estava sendo estabelecido, por Jean-Jacques Olier (1608-1657). A direção do seminário foi assumida pela Congregação dos Sulpicianos, então constituída. Construiu-se um edifício, inaugurado em 1651, para ser um Grand Séminaire para alunos de todas as dioceses franceses.


A Comunidade de Sacerdotes e o Seminário de Québec, criados poucos anos depois, demonstram a contemporaneidade dos acontecimentos e o estreito e recíproco relacionamento existente entre o Canadá e a França dessa época.


Essas iniciativas em ambos os continentes foram resultados de um desenvolvimento do pensamento religioso que explica o significado dado à formação sacerdotal. Trata-se aqui da École française de spiritualité, que, sob a ação do mencionado Jean-Jacques Olier, passou a ter o seu centro no Grand Séminaire e, em Québec, no seminário criado por Laval.


O Grand Séminaire de St. Sulpice alcançou grande renome e exerceu profunda influência no desenvolvimento do pensamento teológico e da ação religiosa na sociedade, uma vez que, atuando na formação da personalidade de sacerdotes, criou multiplicadores que garantiram a continuidade dos seus ideais.


École française de spiritualité na tradição jesuítica e do Oratório


As origens da Universidade Laval, portanto, inserem-se num movimento da religiosidade e do pensamento religioso francês que salientava o significado da formação espiritual de sacerdotes e o papel que nela devia desempenhar a ascese.


A denominação de École française de spiritualité é posterior, difundida por Henri Bremond (1865-1933), que a assim denominou na sua monumental Histoire littéraire du sentiment religieux en France depuis la fin des guerres de religion jusqu‘à nos jours (1916-1936).


O termo "escola" deveria ser aqui entendido no sentido de uma rêde de pensadores e religiosos marcados sobretudo por uma consciência da necessidade de uma formação interior do homem, em particular dos sacerdotes, e pelo método para alcançá-la. Esses intentos ficaram vinculados sobretudo com o nome do Cardeal Pierre de Bérulle (1575-1629).


Pierre de Bérulle, teólogo, tendo obtido formação no colégio da Companhia de Jesus de Clermont, foi, por sua vez, marcado pelos Exercícios espirituais da tradição jesuítica. Estudando posteriormente na Sorbonne, tornou-se um dos mais diligentes representantes da Reforma católica no espírito do Concílio Tridentino ou Contra-Reforma na França. Desenvolveu uma ação política que visava, entre outros aspectos, a recatolização da Inglaterra.


Seguindo Filippo Neri  (1515-1595), criador do Oratório, fundou a Congregatio Oratorii Jesu et Mariae Immaculata, aprovada em 1613, tornando-se o primeiro Superior Geral. Essa congregação reunia sacerdotes seculares e preparava-os para a ação de cura de almas e para os estudos, sendo marcada por uma orientação ascético-mística. Do ponto de vista teológico, essa orientação centralizava-se na contemplação do mistério do Verbo incarnado.


Elos com a tradição lazarista da Missão Popular


Um de seus discípulos foi o mencionado Jean Jacques Olier, fundador dos Sulpicianos. Este trazia uma formação lazarista, marcada pela Missão Popular.


Pode-se dizer, assim, que a prática da Missão Popular integrada no movimento ascético-místico na tradição do Oratorio de sacerdotes seculares repercutiu na Nouvelle France, representando uma nova fase da atividade missionária até então desenvolvida pelos Jesuítas.


Sob a perspectiva dos estudos culturais, pode-se afirmar que houve, nas relações dos europeus com os indígenas uma modificação de perspectivas e métodos. De uma orientação antes de cunho pragmático militante dos jesuítas, dirigida ao Outro, disposta à adaptação às circunstâncias e ao reconhecimento dos valores culturais indígenas, metamorfoseando-os, Laval teria desempenhado antes uma função que poderia ser comparada com aquele que age na própria cultura e que se preocupa sobretudo em dar, com a própria vida, um exemplo. Essa atitude, sob o ponto de vista teológico, baseava-se no esforço de compenetrar-se da sua participação no mistério da Incarnação, vivendo segundo virtudes interiores.


Relações França/Inglaterra e o Canadá sob a soberania britânica


A intenção do Cardeal Pierre de Bérulle em recatolizar a Inglaterra evidencia os elos entre a reformação interna católica e a Contra-Reforma. Esses elos não poderiam deixar de ter um significado especial em regiões coloniais marcadas por tensões e conflitos entre a França e a Inglaterra, como era o caso da Nouvelle France. Compreende-se, assim, que a história cultural do Canadá apresenta nomes de autoridades eclesiásticas marcadas ao mesmo tempo por um zêlo pela própria situação interior, com severa clareza de princípios e pela diligência ao combate ao protestantismo.


Entretanto, uma das personalidades da história eclesiástica do Canadá francês surpreende pelo seu pragmatismo político e possibilita exames mais diferenciados das tendências contra-reformatórias vinculadas ao movimento de reformação interna do Catolicismo. Trata-se de Olivier Briand (1715-1795), desde 1741 em Québec. Êle chegou à Nouvelle France numa época de tensões que levaram a uma gradual perda da soberania francesa. Com a Paz de Utrecht, em 1713, a França perdera a Nova Escócia, a Terra Nova e a Baía de Hudson, o que procuraram compensar com penetrações ao oeste, até as montanhas rochosas. Em 1763, com a Paz de Paris, a França foi obrigada a entregar praticamente toda a região à Inglaterra. Essa, após tentativas de introduzir a Reformação na população católica francofone, passou a conceder certa liberdade religiosa aos católicos.


O movimento emancipatório das colonias americanas, que levaria à Revolução e à configuração dos Estados Unidos, colocou a população católica no impasse de tomar partido em situação marcada pelo confronto de duas tendências conflitantes no próprio Protestantismo, o das colonias revolucionárias, de formação sobretudo derivada dos separatistas e congregacionalistas de séculos passados da Inglaterra, e os anglicanos do poder colonial, muito mais próximos do Catolicismo.


Por parte da Grã-Bretanha, havia, por outro lado, o interesse e a necessidade de conquistar e manter a lealdade dos católicos. Assim, esses foram dispensados do juramento da supremacia anglicana, permitindo-se a introdução de leis francesas de culto. Olivier Briand foi aceito como "superintendente" da Igreja Católica na província de Québec, desempenhando importante papel na manutenção de lealdade dos habitantes à Coroa britânica por ocasião da Guerra de Independência americana, proibindo o apoio aos americanos dos franceses e descendentes de franceses locais.


Devido a essa atitude, foi, em 1813, oficialmente reconhecido como bispo de Québec pelos ingleses. Em 1819, Québec foi elevada a Arcebispado.


Notre-Dame de Québec: Barroco e transformações de expressões artísticas


François Laval de Montmorency encontra-se sepultado na cripta da catedral-basílica Notre-Dame de Québec, onde também se encontram os restos mortais de outros bispos e vários governadores da Nouvelle France.



Situada no local da igreja dedicada a Notre-Dame-de-la-Recouvrance, construída pelo fundador de Québec, Samuel de Champlain (1567-1635), em 1633, a Notre-Dame de Québec foi edificada em 1647, sob a invocação de Notre-Dame-de-la-Paix. Tornou-se, em 1664, a primeira igreja paroquial da América do Norte e, com a nomeação de Laval a bispo da então criada diocese, a primeira catedral do Canadá.


Apesar de suas várias reconstruições e transformações, a catedral apresenta um interior de alto significado artístico-arquitetônico para estudos de expressões barrocas e das transformações estilísticas no contexto de mudanças político-culturais. O seu significado histórico para a antiga França é salientado por um lustre oferecido por Luís XIV.


O espaço anterior, marcado pelo baldaquim dourado do altar, apresenta obras de importantes representantes da história das artes do Canadá, estando vinculado de forma complexa à história de vida e obra de família de artistas que marcam a história da arquitetura canadense: Jean Baillairge (1726-1805) e seu filho, François Baillairge (1759-1787). Após um incêndio em 1922, a decoração do coro foi reconstruída segundo planos concebidos por François Baillairgé.




Problemas relacionados com desenvolvimentos políticos europeus


Sendo o desenvolvimento sulpiciano inserido num determinado contexto da história eclesiástica e da história cultural da França, marcado pela Reforma católica ou Contra-Reforma, compreende-se que, posteriormente, no período revolucionário, haja sido visto como expressão de uma situação superada do antigo regime e de tendências reacionárias.


O próprio edifício so seminário de St. Sulpice foi demolido, em 1811. Após a Restauração, foi construído novo prédio, entre 1820 e 1838, no qual o Seminário desenvolveu as suas atividades até 1906, quando foi extinto com a lei da separação da Igreja e do Estado. Houve, assim, no século XIX, uma restauração, uma retomada de continuidade interrompida, e essa fase da restauração sulpiciana foi de particular significado para o Canadá. Como se pode deduzir da situação acima esboçada, o Canadá até mesmo antecipou a restauração européia dos sulpicianos.


A atitude da autoridade católica de Québec à época da Revolução da Independência americana preparou e possibilitou o desenvolvimento religioso-cultural do século XIX no Canadá francofone. No espírito sulpiciano, o ímpeto contra-reformatório assumiu antes um cunho de fomento de conversão interna de protestantes a partir da interiorização, do despertar de e vivificar de emoções e da exemplaridade de sacerdotes. Exemplo dessa ação sulpiciana na cultura canadense é a basílica de Notre-Dame de Montréal, com a conversão de seu próprio arquiteto (Veja artigo a respeito neste número).


Uma nova fase nesse desenvolvimento histórico das relações entre o Catolicismo e o Protestantismo no Canadá, ao mesmo tempo uma diferenciação das tendências sulpicianas foi o catolicismo político do bispo D. Ignace Bourget (1799-1855). (Veja artigo nesta edição).


Essa transformação da história do pensamento religioso canadense, com todas as suas consequências para as expressões culturais, também não pode ser compreendida sem a consideração de sua inserção em desenvolvimentos europeus, no caso, sobretudo, o da ameaça aos Estados Pontifícios na decorrência do movimento de unificação nacional da Itália.


Essa transformação foi marcada pelo retorno dos jesuítas e pela vinda de outras congregações religiosas. Em 1841, vieram os Oblatos da Imaculada Conceição de Maria, que passaram a missionar entre os indígenas do Oeste e do Norte, a partir de 1847, e, posteriormente (1911), entre os esquimós. Em 1842, retornaram os Franciscanos. Em 1844, fundou-se a província eclesiástica de Québec, em 1852 a de Halifax, quando a Igreja da Inglaterra deixou também de ser Igreja de Estado. Em 1874, Pio IX elevou a igreja de Québec a basílica menor, a primeira do continente, dedicada a Nossa Senhora da Imaculada Conceição. Em 1886, o Arcebispo E. A. Taschereau de Québec tornou-se o primeiro cardeal canadense. Em 1888, fundou-se o Colégio Canadense em Roma.  Desde 1899, a Santa Sé passou a manter um delegado apostólico em Ottawa. Em 1908, o Canadá, com exceção das missões indígenas, passou da esfera da Propaganda Fide à Congregação Consistorial. Em 1909, teve lugar o primeiro Concíclio Provincial Canadense.


Irradiações da École française de spiritualité fora do contexto francês


O Oratorium francês e sobretudo os Sulpicianos exerceram influências que ultrapassaram os limites franceses e da Nouvelle France. A recepção de suas tendências foi particularmente intensa nos Países Baixos, na Savóia e na Polonia.


Também exerceu influência em outros países, inclusive no Brasil. Entretanto, essas irradiações necessitam ser consideradas diferenciadamente sob o pano de fundo das interrupções de continuidade da corrente histórica sulpiciana na França, relacionando-se - como é o caso do Brasil - com uma fase posterior da sua história.


Ainda que insuficientemente estudado, o movimento sulpiciano foi de importância para a história cultural do Brasil, manifestando a sua influência mesmo em contextos inesperados. Assim, José Bonifácio de Andrade e Silva (1763-1838), antes conhecido por tendências liberais, defendeu, em 1823, nas suas observações relativas à política indígena, métodos baseados nas concepções do Oratorio de S. Felipe Neri, uma das bases do movimento sulpiciano, sugerindo a formação de um colégio para sacerdotes seculares que atuariam na catequese.




Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.
Indicação bibliográfica para citações e referências:


Bispo, A.A. (ed.). "Da universidade na sua inserção em processos culturais transatlânticos II. História cultural universitária de expressão francofone no Canadá na tradição de François Laval de Montemorency (1623-1708)". Revista Brasil-Europa 128/24 (2010:6). www.revista.brasil-europa.eu/128/Universidade-Laval.html



  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização Brasil-Europa, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens relativos à Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência (culturologia e sociologia da ciência), a seus institutos integrados de pesquisa e aos Centros de Estudos Culturais Brasil-Europa: http://www.brasil-europa.eu


  2. Brasil-Europa é organização exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. Não tem, expressamente, finalidades jornalísticas ou literárias e não considera nos seus textos dados divulgados por agências de notícias e emissoras. É, na sua orientação culturológica, a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. A A.B.E. insere-se em antiga tradição que remonta ao século XIX.


  3. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações, academias de letras ou outras páginas da Internet que passaram a empregar designações similares.



 

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