Harvard University. Revista BRASIL-EUROPA 128. Bispo, A.A. (Ed.). Organização de estudos culturais em relações internacionais





Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 128/23 (2010:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2679


A.B.E.



Da universidade na sua inserção em processos culturais transatlânticos I:
Harvard University, Boston
"Veritas" - Do puritanismo colonial à auto-afirmação, à educação e à política científica



Ciclo "Indian Summer" preparatório aos 300 anos da ida ao Canadá de Joseph-François Lafitau (1681-1746)
pioneiro dos estudos culturais comparados, da Antropologia Cultural e disciplinas afins
Harvard University, Boston


 
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  1. Fotos A.A.Bispo
    ©Arquivo A.B.E./I.S.M.P.S.e.V.



 
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Como considerado por esta revista no seu primeiro número do corrente ano, a proclamação, em Berlim, de 2010 como „Ano da Ciência“, motiva estudos e reflexões relativamente à inserção das ciências, de seu desenvolvimento e suas instituições em contextos e processos culturais globais.

A história e o presente da pesquisa científica e do pensamento científico, dos seus paradigmas e de seus métodos, inserindo-se na história e no presente cultural do homem, fazem parte de uma ciência da cultura compreendida no sentido amplo do termo. Uma culturologia nesse sentido, porém, não pode ser desenvolvida sem a consideração dos pressupostos da produção e da difusão de conhecimentos, exigindo a análise de rêdes sociais do trabalho científico. Como a Academia Brasil-Europa propõe, o escopo de desenvolvimento de uma ciência da cultura deve relacionar-se estreitamente com aquele de uma pesquisa da ciência (science of science).

Uma perspectiva culturológica do desenvolvimento do pensamento científico dirige a atenção à inserção de universidades em contextos histórico-culturais. A época e as circunstâncias da fundação de uma universidade, a sua inserção em correntes do pensamento religioso ou filosófico, a sua motivação política, a continuidade ou discontinuidade na sua história - por exemplo na escolha de reitores e professores -, além de outros fatores, contribuem à configuração de um complexo cultural que caracteriza a instituição e marca o trabalho daqueles que nela atuam e se formam.

Culturas universitárias assim determinadas influenciam a docência e a pesquisa, determinam predominâncias em correntes de pensamento, concepções, marcam atitudes e estilos de agir que ultrapassam as fronteiras da própria universidade, assumindo muitas vezes amplas dimensões político-culturais. Essa influência nem sempre ocorre de forma expressa e consciente, agindo através de imagens, de símbolos, de tradições e de espírito corporativo.

O estudo cultural de universidades surge como de particular relevância no presente, em particular em países que, como a Alemanha, no âmbito da procura de equivalências quanto à formação e a títulos no contexto global europeu, experimentam processos niveladores que podem representar perda de características e valores diferenciadores, dificultando a compreensão do vir-a-ser universitário como parte de processos culturais.

No âmbito dos trabalhos desenvolvidos em 2010 pela A.B.E. relativamente a esse complexo de questões, salientam-se aqui visitas realizadas a universidades norte-americanas, procurando-se observar o desenvolvimento das reflexões teóricas e da prática científica universitária sob enfoques mais particularmente relevantes para os estudos euro-brasileiros. Entre elas, deu-se especial atenção à Universidade de Harvard, uma vez que a ela  é concedida uma posição de especial excelência entre as universidades do globo.

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Contexto originário de Harvard: colonização e puritanismo

A corrente histórico-cultural em que se insere a Universidade de Harvard não pode ser compreendida sem a consideração de suas origens no contexto da colonização da América e dos processos histórico-culturais de fundamentação religiosa que determinaram a vinda e a vida dos colonos.

Os seus fundamentos foram implantados com a fundação de um colégio da Massachusetts Bay Colony em 1636, poucos anos após a chegada dos Pilgrims a bordo do Mayflower, em 1620.

Com isso, essa primeira instituição de ensino dos Estados Unidos tem as suas raízes no universo religioso-cultural que determinou a decisão de vida daqueles críticos separatistas da Igreja da Inglaterra, adeptos da autonomia comunitário-congregacional e que, abandonando a Europa, compreenderam o seu ato como peregrinação. Esse universo foi marcado pelo puritanismo e por conflitos relativos à concepções religiosas no contexto do  antinomianismo, ou seja, da discussão se apenas a fé justifica (Sola Fide).

O nome da instituição lembra do teólogo inglês John Harvard (1607-1638), formado em 1632 no Emmanuel College da universidade de Cambridge. Em 1637, juntamente com a sua esposa, emigrou para a Nova Inglaterra, estabelecendo-se em Charlestown, Massachusetts, onde atuou na igreja local. Logo falecendo, doou a sua biblioteca, constante de 320 livros, ao colégio que havia sido fundado na localidade de Cambridge por Nathaniel Eaton (1610-1674), mestre-escola e clérigo, seu colega de estudos em Cambridge. Também doou parte dos seus bens à instituição. Poucos anos depois, em 1643, os meios financeiros já permitiam a concessão de bolsas.

Uma placa colocada pelo Harvard University Native American Program, em 1997, lembra que o Indian College foi o primeiro edifício em alvenaria da universidade, de acordo com o escopo da universidade em proporcionar educação tanto a jovens ingleses como a indígenas. No edifício localizava-se a imprensa universitária, onde imprimiu-se a primeira bíblica da América do Norte. A placa recorda de vários nomes dos primeiros indígenas que ali estudaram, salientando Caleb Cheeshahtteaumuck, da tribo Wampanoag, o primeiro graduado do College, em 1665.


Na segunda metade do século XVIII, em 1780, o colégio foi transformado em universidade. O sistema de ensino foi determinado, na sua estrutura, pela tradição inglêsa, no seu espírito, porém, que marcou a vida universitária e a orientação teórico-filosófica dos estudos, pela visão e modo de vida da tradição colonial puritana.

A criação de uma instituição de ensino já nos primeiros anos da colonia demonstra o intento de possibilitar-se às novas gerações formação e, sobretudo, alcance de titulações na nova terra. A ida à Grã-Bretanha para esse fim implicava em grandes custos e afastamento da vida de trabalho, dificuldades para muitos impossíveis de serem superadas.

Esse intuito de alcance de titulações pode ser visto como uma característica de regiões coloniais de expansão, ainda hoje constatado em países como o Brasil, e cujas implicações e consequências necessitariam ser analisadas em profundidade.

Essa procura de títulos pode ser vista também como expressão de concepções voltadas ao sucesso material e social, ao crescimento econômico, distintas daquelas dirigidas primordialmente ao alcance de conhecimentos, à ciência pura efilosofia de antigas universidades européias, explicável, no caso, pela situação colonial de pioneiros e por uma visão do mundo e do homem marcada por tendências da Reformação.

Veritas na discussão reformatória

Essa orientação dirigida ao sucesso material, pessoal e social com fundamentação religiosa, apenas pode ser entendida na sua contextualização histórico-cultural. Ela pode ser analisada como resultado de uma determinada interpretação das Escrituras, compreendida como a única fonte da Verdade, e marcada pelo seu entendimento literal.

Diferentemente da tradição hermenêutica católica, que acentuava a tensão tipológica-antitipológica entre o Velho e o Novo Testamento, a nova e a antiga Aliança, expressando e determinando visões do mundo, do homem e do seu caminho na História, o entendimento antes literal das Escrituras implica numa acepção mais marcada pela linearidade, com uma consequente valorização do Velho Testamento, onde se descreve a caminhada do povo escolhido.

A concepção de que, na vida bem sucedida neste mundo, também do ponto de vista material, se manifesta a Vontade Divina para com aqueles que seguem os seus preceitos, indica uma proximidade àquela emprestada ao povo escolhido da Bíblia.

Essa concepção por assim dizer desenvolvimentista marcou a própria história da universidade, sobretudo pós a emancipação das colonias americanas, quando a instituição experimentou uma considerável expansão. Essa expansão disse respeito também ao espectro disciplinar, marcado que foi por uma ampliação de ofertas de ensino, o que, por sua vez, trouxe à universidade um aumento de estudantes e pesquisadores.

Essa tendência pode ser considerada também como resultado da natureza privada da instituição, marcada necessariamente por uma atitude realista e pragmática relativamente às suas bases financeiras. Talvez como um dos resultados dessa orientação e como expressão de uma tendência utilitarista poderia ser vista a abertura da instituição para a empiria e a prática, manifestada na criação, já em 1811, de uma clínica universitária para o ensino, o Massachusetts General Hospital.

Recapitulações européias como expressão de processos culturais da sociedade


Ainda que inserida em corrente histórica fundamentada nas circunstâncias da colonização e que levou à independência, imbuída de espírito de afirmação e expansão da sociedade americana, Harvard manteve o seu referenciamento pelas universidades européias, até mesmo acentuando essa orientação na segunda metade do século XIX.


Esse elos com a Europa poderiam ser analisados como uma das expressões do processo identificatório dos Estados Unidos, marcado por tendências apenas aparentemente contraditórias, por uma auto-consciência diferenciadora e, ao mesmo tempo, por um anelo de superação dos modêlos europeus, de sobrepujá-los, e de ver reconhecida a sua capacidade em fazê-lo.


Uma análise teórico-cultural dessa natureza poderia esclarecer mais pormenorizadamente a razão pela qual se constata em Harvard da época manifestações tão intensas de assimilação de modêlos europeus, de recapitulações, repetições e mesmo cópias, realizadas, porém, em grau de alta qualidade técnica.


As mais impressionantes expressões desse desenvolvimento podem ser encontradas na música, nas artes e na arquitetura. Obras musicais de relevantes compositores da Nova Inglaterra da época manifestam uma tal proximidade a modêlos alemães, em particular a L. v. Beethoven, que poderiam ser consideradas negativamente como expressões de falta de originalidade e emulação, caso não sejam analisadas contextualmente sob o aspecto do processo cultural norte-americano.


Um desses exemplos é a Symphony N° 1 em do menor, op. 23 de John Knowles Paine (1839-1906), principal responsável pela importância concedida aos estudos musicais em Harvard, onde atuou como professor, a partir de 1873.


Leitura da história cultural universitária nas edificações do campus


As edificações do campus universitário de Harvard manifestam a intensidade dos impulsos recebidos da Europa em fins do século XIX. Construções de estilos neo-clássicos e sobretudo neo-góticos indicam continuidade e desenvolvimento de correntes estilísticas preparadas no período colonial, revitalizadas e intensificadas no espírito historicista do romantismo europeu.


As construções neo-góticas de Harvard, perpetuando espaços e ambientes profundamente impregnados de concepções do século XIX, representam manifestações de uma integração de anelos de progresso e conservação ou recuperação patrimonial, de aumento do herdado, não o de sua superação.


Esses edifícios, de extraordinária qualidade técnico-construtiva, são valorizados pela sua disposição espacial e paisagística, criando um campus universitário mais impressionante do ponto de vista estético e mais intenso nas suas qualidades simbólicas do que qualquer outra área universitária européia. Também essa importância da disposição paisagística, - e que marca também várias outras universidades americanas -, poderia ser analisada sob enfoques teórico-culturais do processo do vir-a-ser estadounidense.



Essa área inclui, entre outros, quatro bibliotecas, edifícios centrais da universidade e da Faculdade de Artes e Ciências, o Massachusetts Hall e o Harvard Hall, cinco edifícios com salas de aulas e departamentos acadêmico, assim como treze prédios-dormitórios para estudantes.


Das suas edificações, o Massachusetts Hall, que abriga os escritórios do presidente da universidade, merece ser particularmente salientado sob o aspecto histórico, uma vez que foi construído em 1720.

O Harvard Hall, edifício situado defronte ao Massachusetts Hall, foi construído em 1766 em substituição a um anterior destruído por incêndio, em 1764. Dos demais edifícios da área, deve-se mencionar o Lehman Hall, que abriga a instância administrativa para os não-residentes.

  1. O mais representativo edifício do campus é o Memorial Hall Building, situado na área triangular The Delta, cuja construção foi iniciada em 1870, sendo aquele que também possui a maior carga simbólica.
O edifício foi resultado de um concurso no qual participaram vários arquitetos de renome da época, todos formados em Harvard. A iniciativa remontou a um grupo de alunos que havia solicitado fundos para a ereção de um monumento em memória aos graduados de Harvard que haviam lutado pela casa da União na Guerra Civil americana.


Um comitê de alunos sugeriu que o memorial fosse concretizado na forma de um edifício que lembrasse as qualidades cívicas e o heroísmo dos combatentes e servisse de teatro para solenidades.


Sugeriu-se um Hall of Alumni com o escopo de promoção da consciência universitária e do espírito corporativo dos estudantes e graduados. Para isso, o espaço deveria apresentar símbolos, dizeres, retratos e esculturas de presidentes, fundadores, benfeitores e personalidades de renome que haviam estudado na universidade.


Uma doação destinada à criação de um teatro para ser usado em festividades de início do ano letivo, de exibições de trabalhos de curso e para encontros da sociedade estudantil foi associado ao projeto anterior, possibilitando a sua concretização.


Charles William Eliot (1834-1926). Da universidade às Ciências da Educação


Uma personalidade que marcou um período de extraordinário florescimento de Harvard foi a de Charles William Eliot,  o seu presidente de 1869 a 1909. Sob a sua direção, a universidade alcançou a relevância supra-regional que a caracteriza. Essa transformação  foi marcada por reformas atualizadoras de antigos institutos, entre êles dos de Direito e Medicina, e pela criação de novas escolas, entre elas nas áreas da Economia, das Artes e da Odontologia.



Charles W. Eliot foi um intelectual de múltiplos talentos, professor de química e matemática, tendo realizado estudos na Europa, onde se dedicou a estudos de sistemas de educação na França e na Alemanha. Tornou-se presidente da National Education Association (NEA), membro da Carnegie Foundation for the Advancement of Teaching e da Rockefeller-Stiftung, presidente de honra da Progressive Education Association.


Essas suas atividades demonstram o quanto o espírito de Harvard, resultante de sua antiga tradição e inserção no processo de formação cultural da Nova Inglaterra, sob impulsos recebidos da Europa, manifestou-se na sua tendência fundamentalmente educativo-formativa. Foi sob a presidência de Eliot que se criou, em 1897, o Radcliffe College para a formação universitária feminina.



Abbott Lawrence Lowell (1856-1943). Da perspectiva jurídica às Ciências Políticas


O período marcado pela presidência do sucessor de Eliot, Abbott Lawrence Lowell, de 1909 a 1933, caracterizou-se pela reforma da formação oferecida pelo sistema dos Colleges em Harvard.


O processo expansivo e a liberdade temática - em prosseguimento à tradição européia de formação acadêmica - haviam levado a problemas resultados de uma excessiva especialização, de atomização do saber, passando-se a sentir a necessidade de uma maior concentração do ensino a temas centrais, reflexo de uma concepção programática dirigida a panoramas e a um repertório de saber considerado como fundamental, a um cânone de conhecimentos vistos como essenciais.


Ao mesmo tempo, para garantir-se a necessária amplitude no alcance de conhecimentos e a liberdade no desenvolvimento das aptidões, passou-se a oferecer cursos paralelos e a possibilitar uma vida acadêmica aos estudantes não-graduados em intensa atmosfera colegial através da sua moradia em edifícios situados no próprio campus universitário. Criou-se a Harvard Society of Fellows.


Nessas reformas, poder-se-ia ver um resultado da formação jurídica do seu autor, com uma atenção sobretudo dirigida a regulamentos, direitos e deveres, ao mesmo tempo, porém, como expressão de seu interesse pelas ciências políticas como presidente, desde 1909, da American Political Science Association. Nessa área, destacou-se por várias publicações, entre elas Essays on Government (1889), Governments and Parties in Continental Europe (1896), Colonial Civil Service (1900) e The Government of England (1908).


James Bryant Conant (1893-1978). Política Científica e Diplomacia. EUA e Alemanha


A atenção especial dada à Educação, marcada sobretudo pela personalidade e pela obra de Charles W. Eliot, experimentou uma nova fase de particular intensidade sob a presidência de James Bryant Conant, de 1933 a 1953.


Químico como Eliot, autor de um General Education Programm, foi, porém, também diplomata e um dos nomes significativos da história da política científica.


Conant foi o mentor do teórico Thomas S. Kuhn (1922-1996), impulsionando-o a passar da Física aos estudos histórico-científicos, o que trouxe profundas consequências para o desenvolvimento do pensamento teórico.


Tendo exercido a sua presidência em período marcado pela Segunda Grande Guerra, as concepções de Conant necessitam ser consideradas na sua contextualização político-cultural.


A sua proveniência das ciências naturais não pode ser esquecida, uma vez que determinou a sua conpreensão do procedimento científico e da pesquisa. Principal atenção emprestou Conant à elevação de nível através de maiores exigências de conhecimentos na aceitação de estudantes e no trabalho universitário.


A sua posição inseria-se no complexo político-científico e militar da época da Guerra, por êle decisivamente influenciado como presidente do National Defense Research Committee (NDRC). Impulsionou, juntamente com o Office of Scientific Research and Development (OSRD), o „projeto Manhattan“ de desenvolvimento da bomba atômica. Permaneceu vinculado à política atômica após a Guerra como conselheiro da comissão de energia atômica e da National Science Foundation.


Sob o pano de fundo da história de vida e da atuação de Conant compreende-se o significado que adquire o fato de ter atuado como representante dos Estados Unidos na Alemanha após a Guerra. Conant foi nada menos do que Alto Comissário dos EUA na Alemanha, de 1953 a 1955, e o primeiro embaixador do seu país na República Federal da Alemanha, de 1955 a 1957.


As relações transatlânticas nessa fase fundamental da Alemanha de pós-guerra foram, assim, marcadas pela atuação de um cientista que, vindo de um espírito puritano-utilitário de Harvard e das Ciências Naturais, passara ao campo de aplicação científica na área militar, e ao desenvolvimento atômico.



Elos históricos entre a Universidade de Harvard e o Brasil


Múltiplos são os elos que unem a história da universidade de Harvard ao Brasil. Dois nomes devem ser particularmente salientados: o do suíço-americano Jean Louis Rodolphe Agassiz (1807-1873), e o do canadense Charles Frederic Hartt (1840-1878), ambos vinculados ao Museum of Comparative Zoology da universidade.


Agassiz, nascido na Suíça, de família protestante, tendo realizado estudos de Medicina em Lausanne, Zurique, Heidelberg e Munique, ao lado de Ciências Naturais, em particular de Botânica, doutorou-se em Filosofia, em Erlangen, em 1829, e em Medicina em Munique, em 1830. Em Paris, sob a influência e.o. de Alexander von Humboldt (1769-1859), passou a dedicar-se à Geologia e à Zoologia; entrou na história das ciências sobretudo pelos estudos da era glacial e como ictiólogo.


Essa sua especialização em peixes deveu-se sobretudo ao fato de dar continuidade aos trabalhos de Johann Baptist von Spix (1781-1826) na coleção por este e por Carl Friedrich Philipp von Martius (1794-1868) trazida do Brasil. Após um período de docência em Neuchâtel, com o apoio do rei da Prússia, dirigiu-se aos Estados Unidos, em 1846, para desenvolver estudos de História Natural e Geologia. Foi convidado a proferir uma série de aulas sobre Zoologia em Boston e, considerando as possibilidades econômicas ali existentes, permaneceu nos Estados Unidos. Tornou-se, em 1847, Professor de Zoologia e Geologia da Harvard.


Com o seu empenho ao ensino e o método que empregava, de confrontar os estudantes com a Natureza, exerceu influência significativa no desenvolvimento desses ramos científicos nos Estados Unidos.


Já desde a sua época de estudos em Munique, encontrava-se intimamente relacionado com o Brasil. Em 1865/66, realizou a longamente sonhada viagem de pesquisas ao país. Com apoio financeiro de Nathaniel Thayer (1769-1840), congregacionalista, tomou parte na Thayer Expedition ao Amazonas. Os seus relatos a respeito das riquezas do Amazonas contribuiram para o incremento internacional dos interesses científicos e econômicos pela região. No Pará, o já mundialmente famoso cientista foi convidado para inaugurar a exposição preparatória à Exposição Mundial de Paris.

O seu relato de viagem ao Brasil, traduzido para o francês por M. Vogeli, foi publicado em 1868 (Voyage au Brésil), alcançando grande popularidade e contribuindo grandemente para a caracterização da imagem do país na Europa. Uma edição popular, resumida, foi preparada por J. Belin-de Launay e lançada pela Librairie Hachette, de Paris, em 1872.

Esse livro foi realizado com a colaboração da esposa de Agassiz, que escreveu o relato das impressões e das aventuras quotidianas. O cientista tratou da parte teórica, ou seja, os resultados científicos dos trabalhos desenvolvidos durante 16 meses da viagem, de abril de 1865 a julho de 1866.

Louis Agassiz entrou na história das ciências sobretudo com antagonista da teoria da evolução, defendendo princípios criacionistas. Essa sua atitude era fundamentada nas suas convicções religiosas. O caminho que Agassiz encontrou para justificar as transformações dos seres viventes foi a de desenvolver uma teoria de criações sucessivas. Defendia também a idéia da origem múltipla das raças humanas. Por essa teoria racial recebeu severas críticas por parte de teólogos. Essas cíticas foram recentemente (2007) renovadas na Suíça, e que levaram à rejeição de concepções de Agassiz por órgãos governamentais suíços por associarem-se a idéias de uma política de Apartheid.


A partir de 1860, Hartt, que era não apenas cientista mas também intelectual com aptidões artísticas e musicais, passou a trabalhar como assistente de Agassiz no museu de zoologia comparada de Harvard. Após cinco anos, acompanhou-o no âmbito da Expedição Thayer. Passou quinze meses no Brasil, dedicando-se a observações várias e criando elos afetivos com o país. Retornando aos Estados Unidos, passou a atuar na Cornell University, em Ithaca, Nova Iorque, sem, porém, perder as suas intenções de voltar ao Brasil. Publicou, em 1870, Geology and physical geography of Brazil.


Entre 1870 e 1878, participou de quatro expedições ao Brasil, as assim-chamadas Expedições Morgan. Nessas expedições, coletou dados e realizou estudos científico-naturais, geográficos, linguísticos e etnográficos. As espécimes que coletou em grande quantidade durante a sua última viagem, doou-as ao Museu Nacional do Rio de Janeiro. Tornou-se o fundador da seção de geologia do museu, dirigindo-a entre 1866 e 1867. Em 1875, deu impulsos à criação da Comissão Geológica Imperial.


Hartt faleceu no Brasil, com febre amarela. Fora abandonado pela sua espôsa e seus filhos, que preferiram retornar aos Estados Unidos.


A contribuição de Hartt para os estudos culturais referentes ao Brasil é particularmente relevante devido a seus estudos mitográficos relativos a culturas indígenas em fase de transformação cultural. Já anteriormente, outros autores tinham salientado a importância de mitos transmitidos oralmente, entre outros a espôsa de Agassiz. A Hartt cabe o mérito de ter chamado a atenção para a necessidade de estudos sistemáticos na mitografia. Êle era da convicção que haveria constantes na forma dos mitos indígenas.





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Indicação bibliográfica para citações e referências:


Bispo, A.A. (ed.). "Da universidade na sua inserção em processos culturais transatlânticos I: "Veritas" - Do puritanismo colonial à auto-afirmação, à educação e à política científica". Revista Brasil-Europa 128/23 (2010:6). www.revista.brasil-europa.eu/128/Harward-University.html




  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização Brasil-Europa, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens relativos à Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência (culturologia e sociologia da ciência), a seus institutos integrados de pesquisa e aos Centros de Estudos Culturais Brasil-Europa: http://www.brasil-europa.eu


  2. Brasil-Europa é organização exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. Não tem, expressamente, finalidades jornalísticas ou literárias e não considera nos seus textos dados divulgados por agências de notícias e emissoras. É, na sua orientação culturológica, a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. A A.B.E. insere-se em antiga tradição que remonta ao século XIX.


  3. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações, academias de letras ou outras páginas da Internet que passaram a empregar designações similares.



 

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