Bandas no Havaí, Alemanha e portugueses. Revista BRASIL-EUROPA 126. ACADEMIA BRASIL-EUROPA. Bispo, A.A. (Ed.) e Conselho Especializado. Organização de estudos culturais em relações internacionais

 
 

O papel desempenhado pelas bandas de música na vida cultural das cidades brasileiras a partir de meados do século XIX vem sendo já há muito reconhecido. Entretanto, a pesquisa específica depara-se com dificuldades, em grande parte resultantes de orientações disciplinares e de perspectivas teóricas.

Na historiografia musical, deu-se sempre maior atenção a compositores e obras consideradas representativas de uma esfera de criação musical erudita. Nos estudos culturais, em particular na área da pesquisa do folclore, e apesar da constatação do significado da banda de música em festas populares, a prática não correspondeu a critérios vistos como definidores do objeto de estudo: ela representa, sobretudo em cidades do interior, uma esfera artística da vida musical, e, sob outros aspectos, não é resultado tão imediato da transmissão oral e de uma "cultura espontânea".

Também nos estudos da música popular a banda de música encontrou obstáculos para ser adequadamente considerada, apesar do papel que desempenhou na consolidação e popularização de gêneros e configurações rítmicas e melódicas: era por demais próxima à esfera erudita, inseria-se em outros contextos àqueles criados pela rádio, pelo teatro musicado e, posteriormente, pela televisão.

Assim, semi-erudita e semi-popular, tradicional mas não folclórica, a banda de música não se inseriu nas áreas disciplinares constituídas segundo concepções de esferas ou áreas da cultura, erudita, folclórica e popular.

Um importante fenômeno da história e do presente cultural do Brasil permaneceu assim insuficientemente estudado por décadas, pois os questionamentos e a metodologia de trabalho das diferentes disciplinares não se mostravam adequados para tratá-lo.

Essa foi uma das preocupações quando da fundação do Centro de Pesquisas em Musicologia da Sociedade Nova Difusão, em São Paulo, em 1968, e que hoje é representado por institutos que o herdaram no âmbito da organização Brasil-Europa e da Academia Brasil-Europa (ISMPS/IBEM). Como no nome da entidade o indica, procurou-se caminhos para a renovação dos estudos culturais e musicais a partir de um direcionamento a processos, de difusão, de recepção, de transformação. Expressões até então consideradas sob a perspectiva de esferas passaram a ser estudadas na sua inserção em processos.

No início da década de 70, em viagens de pesquisas por vários Estados do Brasil, procurou-se reconstruir rêdes sociais de músicos e de transmissão de partituras, gêneros e práticas de execução. Como discutido em sessões realizadas no então Museu de Artes e Técnicas Populares de São Paulo e em conferência sobre a orientação  da pesquisa da banda de música sob critérios da network analysis da Antropologia Social britânica realizada no Centro Comercial de São Paulo, em 1973, o necessário desenvolvimento dessa área de estudos pressupunha maiores reflexões quanto ao trabalho interdisciplinar, com particular consideração de estudos sócio-econômicos e político-culturais dessas corporações. (A.A.Bispo, "Bases para a pesquisa das corporações musicais, 1973", Brasil-Europa & Musicologia, Colonia: ISMPS 1999, 156-165)

Na mesma época, por ocasião do Primeiro Congresso Nacional de Educação Musical, salientou-se, com base nesses trabalhos, o significado da pesquisa específica para uma consideração adequada do papel educativo e formador desempenhado pelos mestres e músicos de banda.

As questões levantadas pela pesquisa da banda de música contribuiram, assim, de forma relevante, à percepção dos problemas causados pela divisão disciplinar tradicional da pesquisa musical em particular e, em geral, dos estudos culturais.

A perspectiva dirigida a processos de criação de rêdes sociais e daqueles que nelas se desenvolveram, de transmissão de repertórios, de gêneros, de práticas de execução, considerados na sua inserção na história cultural, levou necessariamente à constatação do significado da participação de imigrantes de diversas nações na história da banda de música de várias cidades e regiões do Brasil.

A banda de música surgiu, também aqui, uma objeto de estudo que contribuia de forma relevante ao desenvolvimento dos estudos coloniais e de imigração, devendo ser, ao mesmo tempo, conduzidos à luz dos conhecimentos ganhos na pesquisa dos pressupostos culturais dos imigrantes, de sua integração, assimilação e manutenção de práticas de seus países de origem. A banda de música pode oferecer campo de estudos produtivo para análises referentes a identidades de grupos e à sua transformação.

A atenção dirigida à participação de estrangeiros e seus descendentes em várias corporações brasileiras evidenciou a necessidade de se considerar essa prática não apenas na sua inserção em rêdes locais e regionais, mas sim também no âmbito de desenvolvimentos internacionais. Em 1974, realizaram-se as primeiras pesquisas em bandas de música de Portugal, comparando-as com aquelas de portugueses e luso-brasileiros no Brasil. Processos de tradicionalização e inovação, mudanças de instrumentos, de gêneros e práticas de execução precisam ser estudados nos seus elos com movimentos e situações supra-nacionais.

Também aqui, porém, as dificuldades encontradas foram muitas, pois também na Europa a pesquisa da banda de música esbarrava, ainda na década de setenta, com delimitações derivadas da divisão da musicologia em histórica, etnomusicológica e sistemática. O seu desenvolvimento apenas pode ocorrer de forma paralela à transformação da concepção da disciplina e da luta que se então travou para uma reorientação teórico-cultural da musicologia segundo os princípios teóricos desenvolvidos no Brasil.

Essa reorientação transdisciplinar da musicologia incluiu, entre outros aspectos, o empenho por uma superação de uma delimitação da "Musicologia Histórica" aos limites geográficos europeus, com a inclusão de países geograficamente extra-europeus, de áreas e questionamentos tradicionalmente da área da Etnomusicologia, e, por parte desta, da consideração mais precisa de processos históricos.

A banda de música representou, assim, um dos complexos de estudos que mais contribuíram ao desenvolvimento de estudos de processos inter-e transculturais em contextos globais e da música nas relações internacionais segundo o escopo da Organização Brasil-Europa, de sua Academia (A.B.E.) e de seus institutos. No âmbito desse trabalho de décadas, realizaram-se pesquisas em cidades e países de diferentes regiões do mundo, entre outras no Oriente, particularmente em Macau, na área atlântica, por exemplo em Tenerife, no Norte da África (Tunísia), na área do Mediterrâneo, em especial em Malta, e em várias ilhas do Caribe.

Para as comemorações dos 25 anos do registro europeu da instituição que remonta ao primeiro centro de estudos em musicologia constituído no Brasil, em 1968, o Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (e.V. 1985), resolveu-se retomar o complexo temático referente às bandas de música, agora no contexto do Pacífico.

Como a A.B.E. vem desenvolvendo um programa de atualização dos estudos atlânticos e interamericanos sob especial consideração das relações entre o Atlântico e o Pacífico, pareceu ser oportuno e relevante dar maior atenção à inserção histórico-cultural da banda de música no complexo dinâmico global resultante da descoberta das ilhas do Pacífico e de sua transformação cultural.

Tendo os contatos euro-pacíficos decorridos em séculos que também conheceram o desenvolvimento da prática da banda de música, tais estudos surgem como de particular significado para a elucidação de relações culturais internacionais e de processos de transformação de identidades. Promete, assim, trazer novos conhecimentos e abrir novas perspectivas para o desenvolvimento dos estudos mais especificamente referentes ao Brasil.

Significado da banda de música no Havai

Uma posição de especial relevância cabe, neste contexto, à tradição da música de banda do Havai. Honolulu possui, na sua The Royal Havaiian Band, não apenas uma das mais antigas instituições e de maior tradição de suas ilhas, mas também, desde a anexação aos Estados Unidos, a mais antiga banda municipal dos Estados Unidos.

Assim, paradoxalmente, justamente uma forma de prática musical de representação de situações políticas do passado autônomo do Havai passa a ocupar uma posição de particular respeitabilidade no rico espectro da prática da banda de música norte-americana.

A The Royal Havaiian Band corporifica não apenas um monumento memorial de antigas configurações político-culturais do Havai, mas sim de processos euro-pacífico-atlânticos. A sua história e o seu presente são marcados pela sua inserção tanto na vida cultural e social local, com os seus concertos regulares, como na representação internacional do Havai através de apresentações no Exterior e na recepção e na despedida de cruzeiros.

Essa banda, no seu vir-a-ser histórico, apresenta também estreitos laços com tradições e desenvolvimentos histórico-musicais de países europeus, em particular da Alemanha e da Áustria. A sua época de apogeu coincidiu com aquela da imigração portuguesa ao arquipélago, sendo que músicos portugueses chegaram a criar entidades que até hoje existem.

A banda desempenhou papel de particular relevância no processo de configuração da própria identidade havaiana, tornou-se um emblema do Havai que procurava mostrar-se como país autônomo e progressista, à altura das demais nações, aberto à modernização, à educação, sem porém descuidar de sua consciência nacional.

A banda de música entrou não apenas na história da hinografia nacional e patriótica do Havai, mas também na da difusão de novos gêneros e práticas musicais, de música militar, e, em arranjos, de aberturas de óperas, de música de dança e de salão. Foi, também, uma instituição de cunho educativo e formador, transportando para o Havai normas de organização e disciplina provenientes da Europa.

Heinrich (Henri) Berger (1844-1929)

Um dos nomes mais conhecidos da história da música havaiana é justamente o de um antigo mestre dessa banda (1871-1915), o músico prussiano, naturalizado havaiano, Heinrich August Wilhelm Berger (Henri Berger) (1844-1929). É lembrado em publicações e em homenagens a êle prestadas no Havai, em outras regiões dos Estados Unidos e na Alemanha. Tornou-se, assim, um nome significativo para os estudos transatlânticos, compreendidos na Alemanha sobretudo como estudos Alemanha/Estados Unidos.

É lembrado como um dos mais memoráveis ex-moradores da pequena cidade de Coswig, da região de Anhalt, atual Saxônia-Anhalt. Em 2004, quando rememorou-se o nome de Berger pelos 75 anos de sua morte, no âmbito da 17a. edição dos "Dias Musicais de Verão" (17. Sommer-Musik-Tage e das 250 realizações da festa dos Atiradores da Schützengilde e.V. Coswieg (Anhalt), foram considerados vários aspectos de sua vida e, sobretudo, o seu papel no contexto dos elos entre a Alemanha e o Havai. No Havai, o Henry Berger Archives é mantido pela sociedade The Friends of the Royal Havaiian Band, fundada em 1979.

O interesse musicológico pelo Havai na Alemanha, porém, devido à divisão disciplinar, tem sido mais marcado por um cunho etnomusicológico dos questionamentos, dando-se menos atenção à banda de música. A mudança da situação com a reorientação culturológica da disciplina, defendida pelo editor desta revista desde meados da década de 70,  leva a uma maior consideração de processos culturais para além de divisões em esferas culturais e áreas disciplinares.

Esse desenvolvimento corresponde também, no próprio Havai, a um recrudescimento da atenção pela história músico-cultural do arquipélago e que se manifesta em várias públicações (entre elas: Tony Todaro, The Golden Years of Havaiian Entertainment, Tony Todaro Publ, 1974; George S. Kanahele, Havaiian Music and Musicians, Honolulu: University Press of Havaii, 1979; Scott C.S. Stone, The Royal Havaiian Band: Its Legacy, Waiopahu: Island Heritage, 2004); Niklaus R. Schweizer, Havai'i und die deutschsprachigen Völker, Berna/Frankfurt a.M./Las Vegas, 1982; S. E. Solberg, "Havaiian Music, Poetry and Dance: Reflextions on Protection, Preservation and Pride", Melos 10/1, Ethnic, Literature and Music (Primavera 1983), 39-63); David W.  Bandy, "Bandmaster Henry Berger and the Royal Havaiian Band", The Havaiian Journal of History 24(1990), 69 ss..

Pressupostos históricos: músicos em naves européías

Os polinésios tomaram contato com a tradição européia da música instrumental para conjuntos de sôpro com os músicos que viajavam nas naves. Referências em relatos de viagens oferecem pontos de partida para considerações relativas às tradições musicais a que se prendiam os instrumentistas, de acordo com as suas origens.

Organização do Estado e "Banda do Rei"

Com a erosão da antiga cultura e estrutura social, sobretudo sob a ação de missionários, a música de banda passou a ser elemento de prestígio e representação da autoridade real. Já em 1836 existia, no Havai um grupo denominado de The King's Band, então dirigido por um mestre de nome Oliver. Tudo indica que esse grupo teria sido constituido sobretudo por serviçais de estrangeiros que já viviam na região, mestiços e pessoas de posição social menos favorecida, pois a regência da banda foi exercida, entre 1845 e 1848, por um escravo fugido: George Washington Hyatt (Petersburg, Virginia, 1815-?), denominado de "Black George", flautista e clarinetista. Tinha pertencido à banda como instrumentista, passando depois a ser mestre.

Essa fase da banda do rei caiu no período  de Kamehameha III (1814-1854), uma época marcada por transformações sociais e culturais do Havai, pela implantação da agricultura em escala maior, sobretudo da cana, do café e do abacaxi, para o qual se necessitava de mão de obra. O esforço dos missionários era sobretudo dirigido à educação dos chefes e do povo segundo critérios ocidentais. O ensino da música consistuiu parte significativa desses atividades. (Veja artigo nesta edição)

A função da banda de música do rei precisa ser considerada nesse contexto da organização social e política do país, - época do código civil, da constituição e da mudança da capital para Honolulu - e sobretudo no fato de Kamehameha III e a rainha Kalama procurarem ao mesmo tempo dar maior brilho às recepções de visitantes estrangeiros e agradar ao povo, mantendo a popularidade da monarquia.

Sob direção alemã: Wilhelm Merseberg (1814-1879)

Compreende-se nessa situação histórica, a contratação de um músico de ascendência alemã para dirigir a banda, uma iniciativa que indica intentos de elevação do nível técnico e artístico do conjunto, do seu prestígio e de sua disciplina. Contratado inicialmente por cinco anos, Wilhelm Merseberg /William Merseburg (1814-1879), nascido em Weimar, foi mestre da banda no longo período entre 1848 a 1870. Atuou, assim, no período de Kamehameha IV (1834-1863), que reinou a partir de 1855, e da rainha Emma (1836-1885), marcado por um fascínio pela cultura européia, pelo cultivo da música e das artes e pela procura de aprimoramento da vida social.

O comandante militar do rei, o seu irmão Lot, seu sucessor a partir de 1863 como Kamehameha V (1830-1872), marcou uma mudança na orientação político-cultural, de cunho mais conservador, enérgico e disciplinador, emprestando particular atenção à imagem de autoridade e representação. Na sua época ocorreu a visita do navio de guerra britânico Galatea e de Alfred Ernest Albert (1844-1900), Duque de Saxe-Coburg e Gotha e Duque de Edinburgh, segundo filho da Rainha Vitória (1819-1901).

Cortejos reais, como o seu retorno ao palácio após a abertura e o encerramento de sessões do Legislativo eram acompanhados por militares, e a retirada dos soldados às suas casernas dava-se ao som de marchas executadas pela banda. A mudança de orientação política e as suas consequências culturais pode explicar o desenvolvimento que a banda teria nos anos seguintes e que manifesta intentos de dotá-la de maior disciplina militar.

No início da década de 70, sentiu-se a necessidade de uma revitalização da banda real e de renovação do repertório. Essa tarefa foi tentada por William Northcott, em 1870/71, vindo da Nova Zelândia, que procurou um rejuvenescimento do quadro de músicos com a integração de doze jovens que haviam aprendido a tocar instrumentos num reformatório.

Um músico português de Minstrels e a Banda

De 1871 tem-se uma primeira e singular referência sobre a presença de um português na história da banda havaiana. Chamado de Frank Medina, veio ao Havai como membro de um grupo denominado de Brook's Minstrels, e foi ali convidado para reger a banda.

Tais grupos viajantes, nos quais cantores e instrumentistas, com a face pintada de preto, imitavam de forma grotesca negros e seus costumes, desempenharam papel significativo na história da música popular dos Estados Unidos e da difusão caricatural de instrumentos, rítmos e gêneros conotados como afro-americanos, em várias regiões do mundo, entre outros a do banjo.

Sendo brancos que representavam de forma cômica negros, eram aceitos pelo público branco. A face pintada de preto passou também a possibilitar que africanos e seus descendentes passassem a participar de forma camuflada desses espetáculos, ainda que ridicularizando-se a si próprios e a sua própria cultura.

Aqui poderia residir uma explicação ao fato de Frank Medina ter logo saído do Havai, em direção de Nebraska, supostamente por motivos de dívidas, dizendo ser verdadeiramente "black". Como os portuguêses na época eram muitas vezes considerados como sendo de cor, ou seja não "caucásicos", torna-se difícil saber se Medina era ou não mestiço de ascendência portuguesa.

Sob a direção de Medina, a banda apresentava-se nas viagens vespertinas de barco da rainha Kapiolani (1834-1899) (Veja artigo sobre Serenatas nesta edição). Executou, na partida de uma nave alemã, o "The Watch on the Rhine", ou seja, Die Wacht am Rhein (texto de Max Schneckenburger, de 1840, músíca de Karl Wilhelm, de 1854). Já se conhecia, assim, na época, peças do repertório patriótico alemão.


Contatos com o Império Alemão

As tendências políticas e político-culturais mais autoritárias e os intuitos de engrandecimento da autoridade da posição real  do governo de Kamehameha V permitem que se compreenda o pedido feito ao imperador da Alemanha Guilherme I° (Wilhelm Friedrich Ludwig, 1797-1888) para que enviasse um músico capaz para a direção da banda real.

Não se pode esquecer que a Guerra Franco-Prussiana acabara de chegar ao fim com a derrota da França, levando à ereção do Império Alemão. Guilherme I, Imperador Alemão desde 1871, era desde 1861 rei da Prússia, tendo sido anteriormente, desde 1858, Regente.

Com o seu passado militar, Kamehameha procurou, assim, uma personalidade adequada para a reorganização do corpo de músicos junto à potência vitoriosa, conhecida pela sua tradição de música militar. A escolha feita pelo imperador alemão não poderia ser mais apropriada para a situação e a orientação política do Havaí, o que faz supor cuidadosas reflexões. Selecionou-se um músico que estava tanto em condições para a organização do corpo musical havaiano segundo critérios de disciplina prussiana, quanto de representação monárquica, acostumado também a situações experimentais relativas a questões de regulamentos e ordem, ou seja, a adaptações.

Heinrich Berger e o "Regimento da Guarda Imperador Francisco" da Prússia

O músico enviado pelo Imperador alemão ao Havai, o já citado Heinrich Berger, contratado por quatro anos, era de Potsdam, filho do comerciante de tecidos Johann Gottfried Wilhelm Berger. Crescera na pequena cidade de Coswig, região de Anhalt, atual Estado da Saxônia-Anhalt.  Após estadias em Breslau e em Treuenbrietzen, viajou na sua juventude como músico (tuba, baixo duplo) sob a direção de Johann Strauss Jr. (1825-1899) por várias cidades da Europa. Em Berlim, serviu no Segundo Regimento da Guarda pedestre, localizado em Berlim.

O Regimento da Guarda era uma parte da tropa pertencente à Guarda, e, assim, diferentemente dos Regimentos de Linha, uma tropa particularmente próxima ao chefe de Estado. Assim, o chefe do 1° Regimento da Guarda era sempre o respectivo rei da Prússia.

Pertencendo a esse corpo, Berger atuou em exercícios típicos de guarda palacial e de representação. Estava acostumado com questões relativas a normas, uniformes, tipos de armas e organização, pois a tropa servia como corpo de ensino e de experimentação, nela sendo aplicados novos regulamentos antes de serem ordenados para todo o exército.

O Regimento, sediado em Berlim, fora instituído a 14 de outubro de 1814 a partir dos batalhões de Granadeiros da Pomerânea, da Prússia Ocidental e da Silésia. Possuia uma respeitável tradição militar, tendo participado de combates na França, em 1815, quando perseguiu os soldados bonapartistas até Paris, de lutas nas ruas de Berlim, em 1848, mais recentemente, já à epoca de Berger, da guerra com a Dinamarca, contra a Áustria, em 1866, e, sobretudo, na então recente Guerra Franco-Prussiano de 1870/71. Dentre os seus comandantes salientaram-se nomes renomados da história militar prussiana.

Fascínio pela música vienense no Havai

Há, porém, um outro aspecto do Segundo Regimento da Guarda que marcou a tradição à qual se prendia Henri Berger. Esse regimento trazia a designação do imperador da Áustria, tendo sido seus chefes o Imperador Franz (1814-1835) e Imperador Franz Joseph (1849-1916). Os seus membros eram tão conscientes dessa tradição que se designavam a si próprios de "cães de Franz" ("Franzer Bluthunde"). Esse aspecto da cultura músico-militar de Henri Berger abre novas perspectivas esclarecedoras do significado que a Áustria e a música austríaca desempenharia no Havai.

O entusiasmo pela música de banda austríaca e sobretudo pela valsa vienense era anterior à chegada de de Berger. Remontava a uma visita da fragata austríaca Donau em Honolulu, em 1870, onde ficou estacionada para reparos durante vários meses. (Conrad Anders, "Der preußischer Kapellmeister", Hawaii, Munique: Prestel 1975,144-146)

"Melodias vienenses nunca antes escutadas sob as palmeiras do Pacífico - uma premiere de extraordinário sucesso - despertou logo uma sêde insaciável pela música cheia de verve, sendo o rei coberto de pedidos para fundar uma banda semelhante no Havai. As tentativas dos próximos dois anos permaneceram de início sem resultados, e o rei não viu outro caminho do que pedir ajuda a seu colega soberano na Alemanha, Imperador Guilherme I. O Imperador ajudou e enviou o representante do mestre-capela (Vice-mestre-capela) de sua guarda pessoal, o jovem Henri Berger, que, à frente da banda após a Guerra dos 70, entrara como primeiro soldado vitorioso em Paris. A sua entrada no coração dos Havaianos não decorreria de forma menos gloriosa" (op.cit. 144)

Memória de Kamehameha I° e Heil Dir im Siegerkranz

Henri Berger chegou ao Havai em 5 de junho de 1872, a bordo da nave Mohango, demonstrando logo a sua intenção de usar de métodos prussianos para levá-los ao estudo de seus instrumentos e à disciplina nos ensaios. Chegou a ameaçar, respondendo à menção do rei a respeito da falta de aplicação de seus músicos, tão mal pagos, de trancá-los em quarto fechado. O rei ofereceu-lhe simbolicamente um cacete para a disciplinação dos músicos. Após poucos ensaios, apresentou-se já no dia 11 de junho.

A sua atenção foi dirigida a uma prática consciente da música, ensinando os seus músicos rudimentos de teoria musical. Sabendo ler música, e não tocando apenas de ouvido, haveria maior possibilidades de renovação do repertório e de execução de obras mais ambiciosas. Também passou a dar aulas de piano a musicistas indicados pelo rei.

Vindo de uma Alemanha que vivenciava anos de entusiasmo patriótico pela vitória da Guerra contra a França e pela criação do Império, Berger sentiu, no Havai, a falta de um hinário pátrio. Na realidade, já existia um canto nacional composto por Liliuokalani (1838-1917) (Veja artigo a respeito nesta edição), não correspondia, porém, às novas tendências políticas.

Significativamente, criou o Hino a Kamehameha I, executado por ocasião da primeira celebração do Dia de Kamehameha, "O Grande". Inspirou-se, para isso, no hino Heil Dir im Siegerkranz. Esse canto patriótico passara a ser muito cantado no Império alemão então recentemente fundado, sobretudo em solenidades referentes ao Imperador, em aniversários e jubileus, assim como em comemorações da fundação do Império. É compreensível, portanto, que Henri Berger o adaptasse à celebração de Kamehameha I, o unificador do Havai.

Estabeleceu, assim, musicalmente, um paralelo entre a unificação do Havai sob Kamehameha e a união dos vários estados alemães no Império. O texto do Heil Dir im Siegerkranz, de 1793 (Balthasar Gerhard Schumacher), com o subtítulo de God Save the King, era cantado com a melodia do hino ao rei inglês. O God Save the Queen era já há muito conhecido no Havai devido à presença inglêsa e ao entusiasmo pela Grã-Bretanha em determinados círculos da família real, em particular da rainha Emma (1836-1885). (Veja artigo neste número)

A adaptação da melodia ao soberano inglês às condições havaianas foi apenas um dos vários exemplos de sua utilização para a o louvor de soberanos, como no caso do czar russo, do rei da Baviera e do príncipe do Liechtenstein. A utilização dessa melodia para a celebração de Kamehameha I documenta a orientação conservadora, de fortalecimento do poder real da época no Havaí, posta em perigo pela influência norte-americana.


Tendências reliberalizadoras e a banda de música

Poucos meses após a vinda de Henri Berger, faleceu Kamehameha V°, em dezembro de 1872. A época de Lunalilo (1835-1874), embora curta, foi marcada por uma tendência de reliberalização da política. Berger dedicou-se a aprender rapidamente o idioma havaiano e a tradução de termos técnicos do italiano ao idioma local.


O desenvolvimento político e político-cultural sob o reinado de Kalakaua (1836-1891) decorreu com tendências diversas àquelas que levaram à vinda de Henri Berger. O próprio rei Kalakaua escreveu novo texto para o Hino a Kamehameha I, em 1874, sendo cantado pelo coro da Igreja de Kawaiaha'o no aniversário de Kalakaua, a 16 de novembro de 1874. Instrumentado para banda, o hino deve ter sido enviado para países que o rei percorreu durante a sua viagem pelo mundo, pois foi executado para a sua recepção no Japão por uma banda militar.

O Hawa'i Pono'i de Kalakaua, por êle arranjado, tornar-se-ia hino nacional (oficializado em 1967). Substituiu a composição de Liluokalani He Mele Lahui Havaii, até então utilizada.

Terminado o seu contrato, Berger retornou à Alemanha em 1876, ali permanecendo seis meses. De volta ao Havaí, ffoi nomeado em 1877 regente da Royal Havaiian Band. Em 1879, naturalizou-se havaiano.

O período sob Kalakaua foi marcado por brilho social e cultural, favorável a cerimônias representativas e a eventos de dança e música, e, portanto, à música de banda. Henri Berger contribuiu à difusão de repertório europeu e de novidades musicais da Europa no Havaí, em particular na esfera da música ligeira e de dança. Entre os vários gêneros cultivados, a valsa alcançou grande popularidade.

Tudo indica que Berger foi veículo importante na difusão da música vienense, uma vez que participara de orquestras de Johann Strauss Jr., tendo assim percorrido a Europa. Embora sendo o período de brilho social e cultural sob Kalakaua favorável a cerimônias representativas e, portanto, à música de banda, Henri Berger, pela sua formação e pelas condições políticas sob as quais viera ao Havaí, estava antes próximo a círculos que viam com preocupação a influência norte-americana no país. Compreende-se, assim, que se tornou amigo de Liliuokalani, terminando o primeiro manuscrito do seu famoso Aloha Oe, realizando arranjos de suas canções e instrumentando-as para banda.


O Schellenbaum como símbolo

Na Alemanha, porém, mantinha-se a visão conservadora que justificara a ida do músico prussiano do 2° Regimento da Guarda a Honolulu. Quando, em 1881, no âmbito de sua viagem pelo mundo, Kalakaua visitou vários países europeus, recebeu do imperador Guilherme I, como presente, um Schellenbaum, ou seja uma "arvore de guisos", com a inscrição, em havaiano, "Lembrança de Berlin"("no ka hoomanao ana ia Berlin"), encimada por uma águia.

Em carta que enviou de Berlin à Liliuokalani, então regente, Kalakaua dizia ter-se encontrado com a irmã de Berger e anunciava mandar um programa de concerto que deveria servir de orientação para a escolha de músicas da Royal Havaiian Band.

Esse presente, aparentemente singular, indica o papel relevante da banda de música nas relações entre os dois países. O Schellenbaum passou a ser emblema da Royal Band, levado em cortejos, marchas e presente em concertos.

A importância desse instrumento ou emblema instrumental apenas pode ser compreendido através de estudos mais aprofundados da linguagem simbólica da organologia e de suas transformações no decorrer da história. O Schellenbaum, que apresenta não apenas referências claramente identificáveis com a música, no caso a lira, é marcada por elementos sem aparente função musical, tais como a meia lua, à qual é sobreposta uma estrêla.

Tem-se interpretado em geral esse símbolo no seu aspecto mais superficial, histórico, considerando o seu uso após as guerras contra o perigo turco na Europa. Representaria uma "contribuição turca" ao instrumental europeu e, ao mesmo tempo, um troféu da vitória das forças européias. Qual seria, porém, o sentido de presentear o rei havaiano com um troféu que lembrava a vitória contra os turcos ou mesmo contra o Islão?

O sentido mais profundo do Schellenbaum deve ser procurado antes na simbologia dos guisos e, ainda mais longe, do antigo sistro. Não se pode esquecer que também à época das Descobertas, os navegadores portuguêses levaram guisos para presentear os nativos das regiões alcançadas. isso o faziam não apenas por considerarem os nativos infantís ou por serem os presentes baratos, mas sim por trazerem uma carga simbólica que havia-se perpetuado em expressões culturais européias através dos séculos.

Participantes de danças tradicionais, em particular naquelas que representavam simbolicamente lutas e competições, utilizavam-se de guisos nos tornozelos ou instrumentos que produziam sons similares. Também podiam ser acompanhados por um "bobo" ou "palhaço", cheio de guizos, que tal como símbolo lembrava do cunho lúdico das expressões.

Essa linguagem simbólica fundamentava-se em antigo edifício de concepções músico-antropológicas, explicado mitologicamente, na qual o sobrepujar do sistro pela lira desempenhava o papel central. Mais explicitamente do que a simples lira como símbolo da música, o Schellenbaum relembra o processo de transformação do homem, daquele descendente, sujeito às necessidades e ao trabalho, escravizado aos elementos, àquele ascendente, que se  movimenta, liberta e sobe.

O homem físico e o próprio mundo na sua realidade material surgem como instrumento nessa ascensão, marcada pela alegria do homem que luta e alcança a sua libertação do jugo e conquista um estado intermediário no caminho do aperfeiçoamento.

Se as antigas expressões tradicionais de danças e músicas relacionadas com festividades religiosas do ciclo anual - tais como ainda se conhece no Brasil - haviam desaparecido ou perdido a sua importância sobretudo em estados europeus marcados pelo Reforma ou mais atingidos pela secularização da vida, a sua simbologia manteve-se no Schellenbaum das bandas de músicas.

Lembrava, aos assistentes, continuamente, que a banda de música - significativamente também denominada de lira - possuía um significado mais profundo, que unia, na lúdica, um processo ascensional do homem em direção a um aperfeiçoamento ao da sociedade em direção ao progresso.

Em alguns casos, como naqueles que não receberam o Schellenbaum, a presença dessa simbologia se manifesta diretamente na própria música, na utilização de instrumentos que imitam o ruído de guisos ou de entrechoque de lâminas metálicas ou de madeira e que indicam o processo de movimentação, o motor que agita e que dirige, em atmosfera de alegria, ao despertar de entusiasmo. Nessa fundamentação imagológica, transformada pela secularização, explica-se o fenômeno da popularização de determinados efeitos sonoros, sobretudo de "tapêtes" rítmicos de ruídos de istrumentos de fricção e entrechoque na música popular.


Difusão da música européia, arranjos e composições

Sob o pano de fundo dessas considerações relativas à inserção da prática da banda de música na linguagem imagológica compreende-se que esta não pode ser estudada sob o ponto de vista disciplinar que parte da distinação de esferas culturais, do erudito, do popular e do folclórico. Henri Berger, com a sua sólida formação musical, atuou de forma diversificada, servindo como organista na igreja de Kawaiahao, onde atuava ao lado de Liliuokalalani. Tambem atuou em outras igrejas, entre elas na Igreja Metodista e na Igreja Cristã Coreana.

"Logo os concertos tornaram-se concorridas festas populares. Nas tardes de domingo, os ricos escutavam a música de suas carruagens, enquanto que os de menores posses se estendiam sob os grandes coqueiros, árvores-pão e pandanus ou se encostavam às grades do coreto. Logo até mesmo os polinésios mais simples assobiavam árias de óperas  à frente de suas cabanas ao amassar o poi diário; através de Berger, a música ocidental tornou-se parte da vida do dia-a-dia" (C. Anders, op. cit. 146)

A atuação de Berger foi também favorável ao desenvolvimento da arte lírica. O entusiasmo de círculos havaianos pela ópera expressou-se no Honolulu Amateur Dramatic Club.

A banda de música tornou-se elemento de importância na representação do Havai como país marcado ao mesmo tempo pela alegria de vida e pelo seu espírito de progresso. Assim, Henri Berger, que desenvolveu uma intensa atividade de concertos, introduziu o costume de apresentar-se com a sua banda à chegada e à partida de navios nas docas 10 e 11 na torre "Aloha" do porto de Honolulu.

Ponto alto da história da banda foi alcançado em 1883, quando Berger, à frente da Banda Real, ganhou o primeiro prêmio em concurso realizado em San Francisco. Essa premiação representou um primeiro marco na projeção da música havaiana nos Estados Unidos.

Com a proclamação da república, em 1893, ainda que a banda não tenha sido extinta, foi-lhe vedado o uso do Schellenbaum tão emblemático do regime anterior. Entretanto, o conjunto, vinculado estreitamente ao Havai como país independente, teve dificuldades em aceitar a sua anexação aos EUA. Assim, na cerimônia, a 12 de agosto de 1898, os músicos tiveram a permissão de Berger para abandonar a solenidade antes de seu término. Entretanto, em 1905 e 1906, a banda realizou viagens pelos Estados Unidos, contribuindo à consolidação da imagem do Havaí como uma sociedade extraordinariamente caracterizada pelo amor à música e pelo espírito do progresso.

Como os mestres de banda de inúmeras cidades do Brasil, também Berger desenvolveu não apenas papel significativo na difusão de obras de compositores europeus, adaptadas  à banda de música, mas também intensa atividade como compositor, escrevendo marchas e obras de música mais ligeira ou de salão, tal como a Nu'uanu Valley Polka, relativa ao histórico local da unificação do Havaí sób Kamehameha I, e a Valsa Pua Alani, de 1916. Dedicando-as a expressões culturais do Havai, então valorizadas por Kalakaua (The Hula March) e a cidades e regiões (Hilo March, Kohala March), contribuiu à criação de emblemas identificatórios de comunidades. Também como os mestres-compositores do Brasil, dedicava obras a autoridades influentes, como por exemplo a sua Marcha ao Presidente do Govêrno Provisório.

Uma particular consideração sob o ponto de vista teórico-cultural merece a atividade de Berger dirigida à recuperação e divulgação de expressões tradicionais havaianas. Nesse sentido, o seu empenho não pode ser entendido sem aquele de Liliuokalani e de seu círculo. Berger publicou coleções de canções havaianas por êle registradas (e.o. Royal Collection of Havaiian Songs, Honolulu: The Havaiian News Co, 1907).

Empenho pela Educação Musical

Desde o início de suas atividades no Havaí, Berger viu no ensino musical uma das mais importantes e necessárias tarefas a serem empreendidas. Procurou atuar educativamente em vários sentidos, na formação teórica de seus músicos, na organização da Industrial School Band (Waiale'e Reform School Band) ou do departamento de música das Escolas Kamehameha.

Um dos seus sucessores, de 1917 a 1920, foi o neto do antigo mestre William Merseburgh, Robert H. Baker, que atuara na banda. Outro de seus alunos, Mekla Kealakai, executante de vários instrumentos de sôpro e de piano, teve as suas qualidades como flautista reconhecidas durante uma tournée pelos EUA por John Philip Sousa (1854-1932), o "rei da marcha"; Kealakai foi mestre da banda havaiana de 1920 a 1926.

O trabalho educativo de Henri Berger teve duradorouras consequências, e instrumentistas que tiveram experiências na prática musical tornaram-se conhecidos internacionalmente. 

Com a anexação aos EUA, músicos militares dos navios americanos estacionados em Honolulu contribuiram ao desenvolvimento da música orquestral. Em 1902, com a fundação da Honolulu Symphony Society, lançou-se o fundamento da atual Orquestra Sinfônica de Honolulu. sob a direção do músico de origem prussiana Franz A. Ballaseyus (1852-1922).

Em 1912, Berger visitou pela última vez a Alemanha. Recebeu, pelos seus méritos como regente no Havai, uma medalha de ouro do Imperador Guilherme II (1854-1932).



Imigração portuguesa e a Hilo Portuguese Band

Os portugueses das ilhas atlânticas que vieram para o Havai contribuiram de forma relevante para a história da banda de música do Havaí. Os açorianos vieram como trabalhadores das plantações de açúcar de Pauka, de propriedade de Judge SL Austin. Para a recreação dos trabalhadores, procurava-se incentivar a prática musical, tendo Chun Afong (1825-1906), em 1880, trazido instrumentos de fabricação alemã para uso dos trabalhadores. Esses instrumentos seriam adquiridos pelos portugueses.

Em 1883, os irmãos açorianos Joaquim (Joaquin) Carvalho (+1924), como mestre e professor, e o cornetista Jules (Júlio?) Carvalho, que atuavam profissionalmente como barbeiros em Hilo, fundaram a banda que passou a ser designada como Hilo Portuguese Band ou, simplesmente, Hilo Band. Joaquim Carvalho atuava também como compositor, tendo escrito um "Andante" que se tornou popular em fins do século XIX.

Essa fundação portuguesa foi, assim a segunda grande formação instrumental da história havaiana, perdendo em tradição apenas relativamente à banda real. Diferentemente da Banda Real, surgiu como banda de músicos amadores provenientes das mais diferentes profissões. Enquanto os músicos da Banda Real usavam de uniforme inspirado no da Guarda Prussiana e nas suas cores, o da Banda Portuguesa de Hilo adotaria o uso de camisas estampadas em branco e vermelho, e que diz-se remontar a tecidos importados da Escócia para os trabalhadores das plantações de açúcar.

A sua área de ação foi naturalmente sobretudo em Hilo e em outras cidades de Big Island. Após a anexação do Havai pelos EUA, quando o país tornou-se território (1898-1959), foi assimilada pela administração regional, tornando-se o Havai'i County Band, em 1905. Os músicos passaram a ser contratados, não em regime de tempo parcial, pelo Departamento de Parques e Reacreação.

Na vida social e cultural de Hilo, com o seu considerável contingente de portugueses, a banda portuguesa desempenhou papel de particular importância com os seus concertos em praças, por exemplo no parque Mo'oheau, onde levantou-se um coreto em 1904, dedicado ao negociante local Admiral George Beckley. Músicos que ganharam a sua experiência na banda passaram a tocar em teatros e cinemas. Sendo entidade municipal, passou a emoldurar musicalmente cerimônias cívicas, inaugurações de edifícios e outros eventos públicos.

Após a morte de Joaquim Carvalho, foi dirigida por músicos de ascendência portuguesa, entre êles Urban Carvalho, filho de Júlio Carvalho,  regente de 1943 a 1963. Músico que ganhou experiência profissional nessa banda e que fêz carreira foi Frank Vierra. Tendo estudado no Conservatório de Illinois, atuou na banda de Henri Berger e, posteriormente, tornou-se seu mestre (1934-1939). Com a transmissão radiofônica de concertos realizados no parque Kapi'olani, Vierra contribuiu à divulgação ampla  da música de banda.


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Indicação bibliográfica para citações e referências:

Bispo, A.A.. "A música de banda no Havaí nos seus elos com o Império Alemão e com a imigração portuguesa. Significado para a pesquisa das bandas de música no Brasil". Revista Brasil-Europa 126/15 (2010:4). www.revista.brasil-europa.eu/126/Bandas-no-Havai.html



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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 126/15 (2010:4)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg.1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2622





A música de banda no Havaí nos seus elos com o Império Alemão e com a imigração portuguesa
Significado para a pesquisa das bandas de música no Brasil


Pelos 25 anos da oficialização alemã do Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa
(
Institut für Studien der Musikkultur des Portugiesischen Sprachraumes - ISMPS e.V.)

 








  1. Imagens: Título e coluna (2). Pavilhão da Coroação de Kalakau nos jardins do Palácio Iolani, hoje também conhecido como coreto da Banda Real Havaiana.

  2. No texto: Kamehameha V Post Office (1871), Honolulu

  3. Duas últimas no texto. Sala de concertos da Filarmonia de Honolulu e cinema Palace de Hilo.


  4. Fotos A.A.Bispo e H. Hülskath©

 

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