Moorea e Rio de Janeiro. Forster e Humboldt. Revista BRASIL-EUROPA 125. ACADEMIA BRASIL-EUROPA. Bispo, A.A. (Ed.) e Conselho Especializado. Organização de estudos culturais em relações internacionais

 
 

A presença do Brasil no Mar do Sul manifesta-se de forma expressiva na ilha de Moorea, considerada como a mais bela da Polinésia. Moorea é uma das Ilhas Sociedade, com 125 quilômentros quadros e situada a 17 km de Tahiti. É uma presença derivada do deslumbramento de todos que dela se aproximam pela beleza da paisagem da antiga Eimeo, pela constatação do fascínio da contemplação da natureza e da força do sentimento estético.


Indução estética a reflexões filosófico-culturais

A beleza de Moorea, a antiga Eimeo impressionou os antigos navegantes e viajantes. William Ellis (1794-1872), missionário e pesquisador que ali viveu, salientou a impressão e a comoção romântica que causava.

É comum que viajantes, hoje, façam referências à entrada do Rio de Janeiro, que procurem tecer comparações entre as fisionomias de regiões tão distantes entre si. O Brasil torna-se assim presente na Polinésia através da constante lembrança das belezas naturais de sua antiga capital, em cotejos de beleza, magnificência e sensações de encantamento.

Na tentativa de dar mais precisão a sensações de entusiasmo e fascínio que o envolve, o observador sente-se tentado a tecer comparações com a música, lembrando-se da "melodia das montanhas" de Heitor Villa-Lobos (1887-1959) e tentativas similares de análise de contornos melódicos de paisagens e cidades de outros compositores. Altos e baixos de linhas do horizonte são traçados em partituras mentais, procura-se distinguir relações intervalares e mesmo impossíveis regularidades na configuração, simetrias, procura perceber ritmos inerentes à ondulação melódica. Percebe que há várias linhas definidas pelas montanhas, contra-cantos, até mesmo contrapontos. O pensamento dirige-se da contemplação horizontal das linhas à harmonia do todo, ao jogo de cores, à dominância de acordes. Sem o sentir, o observador é levado, assim, na contemplação da entrada de Moorea e na imagem que nele aflora do Rio de Janeiro a um complexo de questões que muito marcou tanto a história das reflexões estéticas, quanto a história das artes e das observações científicas de séculos passados: o da relação entre a visão e a música e, de ambas com a literatura, mais amplamente, entre a percepção do belo e o conhecimento.


A imagem do Rio de Janeiro não surge aos olhos internos do observador apenas ao aproximar-se da ilha, de fora, tal como espectador de um grande cenário. Também da perspectiva oposta, aquela que, da ilha, como de um palco, é dirigida à platéia dos mares, o Rio de Janeiro encontra-se sempre presente, aflorando à mente mesmo de observadores que nunca estiveram no Brasil.

Os visitantes que se dirigem ao ponto de observação do qual se descortina as duas baías principais de Moorea encetam constantemente comparações com vistas da Baía da Guanabara, são até mesmo a isso levados por guias, alguns até mesmo estabelecendo diferenças mais específicas com relação aos panoramas vistos do Corcovado, do Pão de Açúcar e da Mesa do Imperador. Salientam que um de seus montes, pela sua forma, representa um Pão de Açúcar da Polinésia, e o ouvinte pergunta-se, imediatamente, se o modêlo ao qual se refere o próprio Pão de Açúcar brasileiro não remonta a imagens ainda mais remotas, talvez da Madeira, talvez de outra região européia. O monte Mouaputa, com a sua luxuriante cobertura vegetal, é comparado também com montanhas do Rio de Janeiro, os picos agudos, à distância, com a Serra dos Órgãos.


Rio de Janeiro como referencial de comparações

Da platéia ou do palco, o espectador extasiado percebe que o Rio de Janeiro se transforma em referencial de comparações em singular concurso de beleza, no qual em geral Moorea sai prejudicada: sente-se a falta de amplidão e a grandiosidade da paisagem da Guanabara.

A lembrança do Rio de Janeiro em apreciações da beleza e magnitude de paisagens, sobretudo de baías e portos, é comum em muitas regiões do mundo. A baía da Guanabara é recordada e serve como termo de comparação mais ou menos feliz em Acapulco, em Waikiki, em Johannesburg, em Hong Kong e em muitas outras localidades.

Nessas comparações, não apenas fatos geográficos e topográficos são determinantes, mas sim associações das mais diversas. Trata-se, em parte, de cotejos de imagens, não apenas visuais, no sentido de constatações empíricas de aspectos físicos, mas também de visualizações.

No passado, o termo de comparação e a base para analogias e apreciações de viajantes europeus foi procurado sobretudo em baías, portos e cidades européias, entre outras Nápoles, com todas as suas consequências para associações literárias, mitológicas e simbólicas, como o manifesta a história cultural de Niterói e de várias outras regiões do Brasil. Há muito, porém, essas paisagens européias parecem ter cedido essa posição referencial ao Hemisfério Sul.

No caso de Moorea, a aproximação com a Baía da Guanabara possui também uma dimensão histórica, uma vez que é estreitamente vinculada à história dos descobrimentos e da navegação, sendo a sua principal baía designada segundo o capitão James Cook (1728-1779). Este navegador ancorou na Baía de Opanohu em 1777, não na vizinha de Paopao, hoje conhecida como Baía de Cook.

Mooreia e Rio de Janeiro na história das navegações e da ciência

Do ponto de vista histórico, Mooreia e Rio de Janeiro surgem relacionadas entre si pelo fato de navegadores do passado terem passado pelo Brasil na sua rota em direção ao Pacífico. Levavam, assim, consigo, a impressão já ganha na Guanabara.

Thomas Cook esteve no Rio de Janeiro na sua primeira viagem ao Oceano Pacífico e que duraria três anos (1768-1771). A viagem tinha objetivo científico. Astrônomos da Royal Society tinham calculado que haveria um trânsito de Venus em junho de 1769. Ainda que esse fenômeno pudesse ser observado em diferentes partes do globo, esperava-se que as observações pudessem ser realizadas da melhor forma no Pacífico. Em navio da Royal Navy, os cientistas foram enviados para essa região, em empreendimento sob a direção do geógrafo Alexander Dalrymple (1737-1808), cientista particularmente convicto da existência de um grande continente ao Sul do globo.

Para a realização dessa viagem científica, escolheu-se o navio The Earl of Pembroke, que foi remodelado e rebatizado como HM Bark Endeavour. Para o su comando, nomeou-se o jovem James Cook, ainda simples navegador, não oficial, que adquirira experiência em viagens anteriores em mares do Norte. Também destacara-se em observações astronômicas, tendo escrito um texto com observações relativas a uma eclipse solar. Para a direção das observações astronômicas, designou-se Charles Green (1735-1771). A nave deveria alcançar o Taiti em abril de 1769, em época certa para a observação do trânsito planetário.

O Pacífico passara a despertar as atenções na Grã-Bretanha, uma vez que, como mencionado, supunha-se ainda haver um grande continente, designado nos mapas como Terra australis incognita. No início de 1768, retornou à Grã-Bretanha o capião Samuel Wallis (1728-1795), que visitara o Taiti, trazendo notícias altamente favoráveis. Ao mesmo tempo, a França demonstrava atividades na região, sentindo-se a necessidade estratégica de marcar presença e criar direitos britânicos.

O empreendimento foi auxiliado pelo empenho de um cientista amador de posses, membro da Royal Society, Joseph Banks (1743-1820) (Veja a respeito artigo sobre a Botânica, nesta edição). Esse mecenas financiou a sua própria viagem e parte daquela dos cientistas, artistas e serviçais a bordo. Com essa comitiva, num total de 94 pessoas, a viagem tornou-se de excepcional importância para a história dos empreendimentos científicos de exploração do globo.

A passagem de Cook pelo Rio de Janeiro ficou marcada na história por um acontecimento singular e que não deixa de ser de interesse sob o aspecto da história cultural das navegações e da vida do quotidiano no mar. Para a consecução dos objetivos de tão difícil empreendimento, que envolvia a participação de cientistas e outros viajantes sem a experiência de mar, dera-se particular atenção à higiene e à boa alimentação da tripulação. Procurou-se sobretudo evitar o escorbuto, que até então causava muitas mortes em viagens transoceânicas. Para isso, fomentou-se o consumo de alimentos frescos e, em particular, de repolho (Sauerkraut), supondo-se ser essa comida favorável à manutenção da saúde. Por essa razão, a nave era obrigada a fazer, nos diferentes portos da rota, carregamentos de verduras frescas. Esse foi o caso já na ilha da Madeira, primeiramente alcançada na rota atlântica em direção ao Cabo Horn, onde contornaria a América do Sul para alcançar o Pacífico. Novo carregamento deveria ser feito no Brasil.

A expedição chegou ao Rio de Janeiro em fins de 1768. Passara-se apenas cinco anos desde que a capital do Brasil havia sido transferida de Salvador para o Rio de Janeiro, tornando-se residência do Vice-Rei. Tornara-se um porto de importância estratégica com o desenvolvimento da exploração aurífera das Minas.

Cook esperava ter uma recepção amigável, uma vez que Portugal aliava-se à Grã-Bretanha no cenário internacional, uma vez que sentia o risco representado pelos interesses da França relativamente às colonias portuguesas. Entretanto, a recepção foi hostil, suspeitando-se das finalidades da viagem de Cook. Pareceu estranho às autoridades portuguesas que os marinheiros de Sua Magestade Britânica se alimentassem de verduras, em especial de repolhos. Além do mais, a estadia de Cook no Rio de Janeiro foi marcada negativamente por incidente ocorrido no porto, onde faleceu o seu assistente Peter Flower (1748-1768). Após poucas semanas, a nave abandonou o Rio.

Os europeus deveriam construir um observatório no local do ancoradouro, na costa norte da ilha do Taiti, na baía de Matavai (Point Venus). As observações foram feitas no dia 3 de junho de 1769. Na partida, levaram um nativo de Raiatea que deveria servir de intérprete no caso de novos contatos à procura do suposto continente.

Conhecia-se já a Nova Zelândia, descoberta pelo holandês Abel Tasman (1603-1659). Na sua viagem, Cook tomou contato com a população maori, contatos que não decorreram sempre sem conflitos. Em direção a Batavia (Indonésia), Cook passou pela Nova Holanda (Austrália).Cook retornou à Europa após o reparo da nave em Batávia pelo Cabo da Boa Esperança, tendo que lamentar a morte de grande número de seus tripulantes.

Fisionomia do Taiti na pintura de paisagens: William Hodges (1744-1797)

A viagem, com as suas cartas marítimas, descrições geográficas e etnográficas, despertou grande entusiasmo na Grã-Bretanha, em 1771. Como não se havia encontrado o suposto Grande Continente, já se duvidando de sua existência, planejou-se uma segunda viagem, que deveria alcançar regiões ainda mais distantes. Cook pretendia circumnavegar o Polo Sul. Já agora como comandante, foi designado para dirigir a expedição formada com dois navios, o HMS Resolution e o HMS Adventure. Em lugar de Banks, adoecido, assumiu a liderança do corpo de cientistas Johann Reinhold Forster (1729-1798)  e seu filho George, ao lado de astrônomos como Williams Wales (ca. 1734-1798)  e do artista William Hodges. As obras de Hodges marcariam decisivamente a visão romântica do Taiti, sendo utilizadas como ilustrações de relatos de viagem de Cook. Estudos dedicados a relações entre artes visuais e música referentes às viagens de Cook e ao Taiti não podem deixar de considerar as obras desse pintor e que merecem posição saliente numa história das artes em contextos globais.

A segunda expedição de Cook partiu em 1772, em direção ao Cabo da Boa Esperança. Em 1773, atravessou o Círculo Antárctico. Impedido pelas condições polares, dirigiu-se à Nova Zelândia, dedicando-se à investigação do Pacífico Central e atingindo o norte do Taiti. Também aqui levou-se um nativo de Raiatea como tradutor. Após procuras de terras no Mar do Sul, tocou novamente o Taiti, em 1774, além dos atóis Palerston e Niue, chegando a Tonga. Algumas ilhas que haviam sido visitadas pelos espanhóis, há 170 anos antes, foram redescobertas, entre elas as denominadas as Novas Hébridas (Vanuatu) e Nova Caledonia. Esses contatos marcaram o início dos conhecimentos relativos à Melanésia.

No retorno, Cook atravessou o Pacífico, atingindo a América do Sul, tendo celebrado o Natal na Terra do Fogo. Em 1775, aportou em South Georgia, no Atlântico Sul, descobrindo pequenas ilhas, denominadas de South Sandwich Islands. Dirigiu-se daqui à Cidade do Cabo, na África do Sul. A nave Resolution passou por Santa Helena, Ascenção e pelos Açores na sua viagem de retorno. A viagem proporcionou copioso mapeamentos e descrições do Sul do Pacífico, representando um dos grandes feitos da história da navegação, demonstrando também a não-existência de um grande continente ao Sul.


James Cook em Moorea (1777). Obra pictórica de John Webber (1751-1793)

Moorea foi visitada por James Cook na sua terceira viagem (1776-1780). Esse empreendimento foi planejado com o objetivo da procura de uma passagem a noroeste, ao redor do norte do continente americano. Deveria também reconduzir à sua terra natal Mai, o nativo de Huahune, trazido na viagem anterior. Agora como capitão, Cook partiu com as naves HMS Resolution e HMS Discovery. Nessa viagem, não tomaram parte cientistas, sendo que o médico Wiliam Anderson (1750-1778) desempenhou os papéis de naturalista e etnologista, e John Webber o de artista. Este artista foi levado a participar da viagem como pintor pelo botânico Daniel Carl Solandeer (1733-1782). (Veja a respeito artigo sobre Botânica, nesta edição). Webber publicou os seus desenhos como gravuras, em 1784. Realizou um considerável número (16) de vistas do Mar do Sul, dos quais as primeiras foram publicadas em 1787.

As naves partiram separadamente em direção à cidade do Cabo em fins de 1776, passando ao Oceano Índico, as Ilhas Prince Edward e Kergueles, atingindo a Tasmânia. Passando pela Nova Zelândia, alcançou o Pacífico e as ilhas que seriam denominadas de Ilhas Cook. Tendo visitado Tonga, passou por Tubuai, a caminho do Taiti e por Tautira, antes de dirigir-se à Baía Matavai, onde foi recebido amigavelmente pelos chefes locais Tu e To'ofa. Com isso, porém, inseriu-se em problemas internos da região, fato que deveria obscurecer a sua estadia em Moorea. Fêz a sua primeira visita a Moorea em fins de setembro de 1777.

Moorea havia sido vista em 1767 por Samuel Wallis, sendo então denominada de The Duke of York's Island, L.-A. Boungainville (1729-1811) em 1768, Domingo de Bonechea (1713-1775) em 1774. Banks havia visitado o povoado de Papetoai. Cook apenas a visitou em 1777, vindo de Tahiti, tendo ancorado na Baía de Opunohu.


A estadia de Cook em Moorea permaneceu na história como uma das negativas da história desse navegador: ""Cook's visit to Moorea must be regarded as one of his least productive and most regrettable anywhere" (Enciclopédia pág. 152).

Não foi recebido pelo cacique local, Mahiune. Este provavelmente julgara que Cook apoiava chefes taitianos na sua guerra contra Moorea. Foi, porém, amigavelmente recebido pelo povo. O incidente que marcou a estadia de Cook foi o roubo de duas cabras trazidas no navio, e que se supôs terem sido levadas pelo chefe local. Como os marinheiros enviados para recuperá-las não as acharam, Cook realizou entrada pelas montanhas centrais, queimando cabanas e destruindo canoas no seu retorno. Dirigiu-se à Baía de Paopao, hoje Baía de Cook, onde também destruiu canoas.


Em dezembro de 1777, partiu para o Pacífico Norte, atravessando o Equador e alcançando as Christmas Island e o grupo insular do Hawai, atingindo Kauai e Niihau. Cook registrou a similaridade dos hawaianos quanto a costumes e ao idioma com aqueles do Taiti e da Nova Zelândia. Dando continuidade à sua viagem em direção à América do Norte, Coojk atingiu Oregon, Estreito de Juan de Fuca e Vancouver. Após várias tentativas, alcançou a passagem que conduzia ao Estreito de Bering e cruzou o Círculo Ártico. Retornou ao Sul, em direção ao Hawai. Em Kealakekua, no contexto de infelizes incidentes, Cook foi morto, juntamente com vários outros europeus, a 14 de fevereiro de 1779 . Sob a direção de Clerke, a expedição retornou ao Norte, novamente pelo Estreito de Bering, cruzado o Círculo Ártico. Após a morte de Clerke, sob a direção de Gore, retornaram à Grã-Bretanha pelo caminho do Japão e Macao, Oceano Índico e Cidade do Cabo.

A viagem não alcançou o pretendido objetivo de descobrimento da passagem a noroeste. As principais contribuições da viagem foram a de mapear e descrever a costa norte-americana, de Oregon ao Alaska e o litoral asiático, além de trazer descrições do Hawaii, de Cook, Tonga e do grupo insular Austral.


Charles Darwin (1809-1882) a respeito de Moorea


Em Taiti, Darwin observou a ilha de Moorea à distância, do alto de uma montanha do Taiti.


"Alcancei uma altitude de 600 metros e tinha uma boa vista da distante ilha vizinha de Eimeo, que ainda pertence à soberania de Taiti. Sobre os altos e dentados picos das montanhas elevavam-se torres de nuvens brancas, que flutuavam como ilhas no céu como a própria Eimeo no mar azul. Também essa ilha é cercada por recifes, que têm apenas uma porta para o mar. Daqui, a franja de corais podia ser reconhecida apenas como uma linha fina, bem traçada e que marcava a quebra das ondas do mar no muro de corais. Atrás estendia-se a superfície especular das lagunas, das quais elevavam-se as montanhas cobertas de florestas; lá fora, ondulavam-se em azul escuro a água eternamente intranquila do oceano. O todo marcou-se em mim como um quadro. Tive que pensar numa gravura emoldurada, na qual a moldura é a maré, o contorno de papel branco a laguna, e a gravura em si a ilha." (Charles Darwin: Ein Naturforscher reist um die Erde, C. Vollmer, ed., Leipzig: VEB F.A. Brockhaus, 1968, 263).


Impressões estéticas do Taiti e ciência. Forster e Alexander von Humboldt (1769-1859)


O significado das impressões ganhas no Taiti por cientistas e artistas para o desenvolvimento posterior dos estudos em contextos globais foi salientado pelo hoje pouco lembrado erudito e evolucionista alemão Wilhelm Bölsche (1861-1939) na sua obra "Novos mundos: A conquista do mundo em descrições de grandes pesquisadores naturais", publicada em 1917 (Neue Welten: Die Eroberung der Erde in Darstellungen großer Naturforscher, Berlin: Deutsche Bibliothek). Significativamente, abre a sua obra, que inclui também texto relativo aos indígenas do Brasil (Karl von den Steinen, "Unter den Naturvölkern Zentral-Brasiliens", 135-204), com um texto de Georg Forster, intitulado de "O Idílio do Taiti" ("Das Idyll von Tahiti", 1-66), encerrando-o com texto sobre a Terra do Fogo, de Charles Darwin ("Feuerland", 579 ss.)

No verão de 1790, com apenas 21 anos, Alexander von Humboldt visitou o já mencionado Joseph Banks na Inglaterra, em companhia de Georg Forster (1754-1794). Forster, que havia acompanhado a seu pai Johann Reinhold Forster ao Taiti, tendo escrito o relato dessa viagem (Veja artigo a respeito, nesta edição), desempenhou aqui um papel de mestre, amigo e conselheiro de Alexander von Humboldt, conduzindo-o àquele que havia sido um dos principais protagonistas do empreendimento de James Cook. Quando da morte de Foster, Alexander von Humboldt escreveu: "Também essa vida nobre, rica de sentimentos, sempre cheia de esperanças não pôde ser feliz" (cit. Wilhelm Bölsche, ""Einführung zu Georg Forster, Das Idyll von Tahiti", op.cit., 8)

"O modo de descrever de Georg Forster e a sua concepção do homem, que para os seus contemporâneos em geral valeu como culminação da arte de narrativa geográfica e etnográfica, foi  posteriormente julgada às vezes de forma muito diferente. O sentimento natural intensificado e aprofundado por Rousseau dela desponta de forma muito perceptível. Alexander von Humboldt, que não desconhecia a Estética e que conhecia como poucos a paisagem tropical de todos os lados, também dos reais, ganhos da experiência, colocava Georg Forster em muito alta posição, ainda à idade da maturidade esclarecida do seu 'Cosmos'. 'Através dele', diz êle ali, 'iniciou-se uma nova era das viagens científicas, cujo objetivo é o conhecimento comparativo de povos e de regiões. Portador de um refinado sentimento etético, guardando em si as imagens mais vívidas, que haviam repleto a sua fantasia no Taiti e em outras, então felizes terras do Mar do Sul (assim como mais recentemente de novo em Charles Darwin), Georg Forster descreveu primeiramente com graça os diferentes graus alternantes de vegetação, as condições climáticas, os meios de alimentação em relação aos costumes dos homens segundo a diversidade de suas moradias originais e sua ascendência. Tudo, o que a visão de uma natureza exótica pode oferecer em verdade, individualidade e expressão encontra-se nas suas obras." (op.dit. 9)

Para Bölsche, a comparação aqui feita por Humboldt com o relato de viagens de Darwin era muito significativa, uma vez que ninguém diria ser a sua obra marcada por exageros e literatice. Ao contrário, cita o geógrafo e escritor Oskar Peschel (1826-1875), que criticou com duras palavras a tradição que relacionava o sentimento estético com a observação científica, fundamentada em Forster e com o idílio do Taiti:

"Contemplações que agem de forma tentadora em almas sensíveis, mas que deveriam apenas enfeitar a literatura poética, acostumaram-nos a um Pathos que nos perturba e até mesmo prejudica, e que nos afasta do conhecimento puro do mundo físico." (op. cit. 9)

Bölsche, procurando relativar essa crítica severa, lembra que há uma diferença entre aqueles que tratam de uma região, sua natureza e cultura sem tê-la vivenciado e aqueles que dela receberam impressões e desenvolveram sentimentos estéticos:

"O encanto, que hoje ainda nos fala esses antigos textos, é, em certo sentido, sempre também um encanto recebido da realidade. Ambos já não existem hoje dessa forma: nem o antigo polinésio, nem o homem cultivado, entusiástico do século XVIII. Enquanto, porém, esses velhos, belos relatos de viagem forem lidos pela mente e pelo coração, esse idílio do Taiti irradiará as suas cores através dos tempos" (op.cit.10)

Também na literatura de viagens em geral tem-se reconhecido o papel de Forster na formação de Alexander von Humboldt e, assim, no desenvolvimento do pensamento alemão do século XIX.


"O seu filho publicou os resultados científicos e anotações do seu pai em livros, com os quais se tornou o criador da descrição artística de viagens na língua alemã; era, porém, (...) um adepto entusiasta da Revolução Francesa (...); foi expulso do império alemão e morreu só e na miséria. Como professor de Alexander von Humboldt deu êle (Forster) uma contribuição indispensável ao desenvolvimento da vida intelectual alemã e foi por isso mais tarde renacionalizado da forma mais rápida por aqueles que enfeiam os feitos do espírito com a cola de etiquetas nacionais" (Joachim G. Leithäuser, Ufer hinter dem Horizont: Die grossen Entdecker der Erde von Kolumbus bis zur Weltraumfahrt, Berlin: Safari 1962, pág. 154-155)



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Bispo, A.A. (Ed.)."Moorea e Rio de Janeiro na história das observações científicas e o sentimento estético. Papel do Taiti no desenvolvimento dos estudos americanos. Georg Forster (1754-1794) e Alexander von Humboldt (1769-1859)". Revista Brasil-Europa 125/15 (2010:3). www.revista.brasil-europa.eu/125/Forster-Humboldt.html


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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 125/15 (2010:3)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
órgão da
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ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2602


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Moorea e Rio de Janeiro na história das observações científicas
e o sentimento estético
Papel do Taiti no desenvolvimento dos estudos americanos
Georg Forster (1754-1794) e Alexander von Humboldt (1769-1859)




Do programa Cultura-Natureza da A.B.E. no âmbito dos trabalhos Atlântico/Pacífico de renovação teórica dos estudos transatlânticos e interamericanos
sob a direção de A.A.Bispo

 






















  1. Fotos A.A.Bispo©

 

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