POLINÉSIA. Revista BRASIL-EUROPA 125. ACADEMIA BRASIL-EUROPA. Bispo, A.A. (Ed.) e Conselho Especializado. Organização de estudos culturais em relações internacionais

 
 
Este número da Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira publica relatos de estudos, observações e reflexões referentes à Polinésia Francesa sob a perspectiva de seu significado para os Estudos Euro-Brasileiros.

Em seqüência a curso dedicado à cultura da Austrália e da Oceânia, levado a efeito na Universidade de Colonia, em 2009, a Academia Brasil-Europa realizou contatos e observações na Austrália e da Nova Zelândia (veja número anterior desta revista), assim como na Polinésia Francesa e no Hawaii.

Por mais distantes que possam parecer as regiões aqui consideradas com relação à temática de relevância para os estudos brasileiros, e por menos estudadas que sejam as culturas da Polinésia sob a perspectiva desses estudos, os textos aqui apresentados chamam a atenção a aspectos que testemunham elos histórico-culturais e processos inter-e transculturais da atualidade e que dizem respeito a ambas as regiões do Hemisfério Sul nas suas relações com a Europa.

Esses estudos inserem-se no programa de pesquisas da A.B.E. destinado à atualização dos estudos culturais atlânticos e interamericanos a partir da consideração da esfera do Pacífico. Pela própria situação geográfica e formação colonial do Brasil, os estudos culturais brasileiros têm sido desenvolvidos sobretudo sob a perspectiva de sua orientação atlântica. Os caminhos do Atlântico, porém, levaram também a regiões do mundo banhadas por outros mares e oceanos, e as grandes viagens de navegação e descobrimentos vincularam essas distantes regiões entre si.

Com a crescente aproximação do Brasil de seus vizinhos sul-americanos, torna-se uma exigência para os estudos brasileiros considerar com mais atenção a orientação ao Pacífico de muitos dos países do subcontinente. Em números anteriores deste órgão foram relatados trabalhos desenvolvidos e em andamento referentes a países latino-americanos voltados ao Pacífico nas suas relações com o Brasil e também à esfera do Índico, nos seus múltiplos elos com a África, com a Índia, com o Extremo Oriente. A atenção, agora, foi dirigida ao Pacífico Sul, mais específicamente à Polinésia Francesa.


Também com respeito às relações culturais históricas e atuais com os Estados Unidos impõe-se a consideração da esfera polinésica nos estudos voltados ao Brasil. Não se pode esquecer que um dos estados norte-americanos pertence a essa região: o Hawai. A América estende-se, assim, ao Pacífico, mas também o Pacífico estende-se à América, sob muitos aspectos.

A imigração portuguêsa para o Hawai, e a sua contribuição substancial para as expressões culturais do arquipélago desempenhou e desempenha significativo papel nesse interrelacionamento entre a área do Pacífico, contextos do Atlântico e interamericanos. A neo-cultura hawaiana marcada pelos portugueses insulares através de um de seus instrumentos musicais emblemáticos, estendeu-se não apenas ao EUA continental, alcançando daí internacionalidade, mas caracterizou também uma cultura polinésia no seu todo, sendo assimilada por outras regiões do Pacífico. Instrumentos do tipo guitarra, em particular do machete madeirense foram difundidos em ampla área sobretudo através desse caminho. O complexo cultural caracterizado por esse instrumento, de antiga simbólica, apesar de todas as diferentes configurações, funções e transformações de sentido por que passou, garante a existência de elos por assim dizer de parentesco entre o mundo do Pacífico e um Brasil marcado pelo universo do cavaquinho e do violão.

Há um desenvolvimento recente que justifica uma especial atenção à Polinésia nos Estudos Euro-Brasileiros: a crescente presença de brasileiros nessa região, que percorrem as suas diferentes ilhas sobretudo a passeio ou atuando profissionalmente na indústria turística como tripulantes de navios. Esse desenvolvimento contribui a que uma região do mundo pouco conhecida e presente no Brasil torne-se crescentemente familiar, despertando interesse mais amplo pela sua cultura e pela história de sua inserção em processos globais que também incluem o Brasil.

Os brasileiros que percorrem as ilhas do Mar do Sul deparam-se em muitos casos com uma natureza que lembra em muito a de certas ilhas e do litoral do Brasil, com modos de vida e atitudes marcadas por uma alegria de viver que lhe parecem similares, com expressões e tendências internacionais na vida cultural também sentidas no Brasil. Noções de situações paradisíacas, de liberdade, descontração e alegria, de imagens de exotismo tropical de praias emolduradas por coqueiros, de surfistas e corpos tatuados, de espetáculos marcadamente sensuais que lhes parecem próprios do Brasil apresentam-se agora como característicos de uma Romântica do Mar do Sul.

Tais experiências podem contribuir a uma maior conscientização da inserção do Brasil no Hemisfério Sul do globo, a um redirecionamento geográfico-cultural mental, a uma relativação de noções e imagens julgadas como exclusivas de um desenvolvimento particular e, assim, à sua inserção em processos inter-e transculturais em dimensões mundiais.

Esses processos globais, porém, incluem necessariamente a Europa, da qual partiram as viagens de navegação, de descobrimento e exploração, e da qual foram desencadeados processos de colonização que determinaram a história dessas regiões nos últimos séculos.

A Polinésia pertence a última grande região do globo alcançada na história dos grandes Descobrimentos, e a história de inserção em contextos ocidentais inicia-se ca. de três séculos após a do Brasil.

Muito do que o Brasil vivenciou no processo de transformação cultural dos indígenas foi experimentado pela Polinésia em época mais tardia, em outra fase da história e sob outras condições, sobretudo aquelas determinadas pela liderança de nações européias não-ibéricas e pela missão protestante. Essa transformação deu-se, porém, sob muitos aspectos, de forma mais intensiva e rápida do que a do Brasil, facilitada que foi pela insularidade, pelas dimensões reduzidas das terras de suas inúmeras ilhas.

O pesquisador tem, assim, a possibilidade de estudar a ação e a vigência de processos culturais sob diferentes condições, comparar mecanismos transformatórios e anelos de recuperação, construção e projeção de identidades desencadeados em diferentes épocas históricas.

O pesquisador brasileiro pode observar na Polinésia consequências de uma ação missionária evangelical que, ali iniciada muito anteriormente, também é hoje sentida de forma crescente no Brasil.

Os Estudos da Polinésia devem constituir também objeto de estudos de uma área que focaliza relações entre a Europa e o Brasil pelo fato da Europa ali estar presente politicamente, o que o testemunha sobretudo a Polynésie française, a antiga Oceânia Francêsa, na sua qualidade de "Pays d'outre-mer". Sob essa perspectiva, a Polinésia "pertence" por assim dizer à Europa, o que testemunha, mais uma vez, a questionabilidade de perspectivas determinadas por limites geográfico-continentais.

As observações e reflexões relatadas nesta edição possuem uma orientação dirigida sobretudo ao presente, privilegiando temas atuais de interesse aos estudos culturais em contextos internacionais.

Essa escolha de assuntos não significa, porém, que as observações não tenham sido precedidas por estudos de cunho histórico e etnológico. Nessa área, a tradição a que se prende a Academia Brasil-Europa foi marcada por esforços e trabalhos de décadas.

O tratamento de questões culturais da Polinésia sob a perspectiva brasileira foi iniciado como unidade do curso de Etnomusicologia da Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo, em 1973, dirigida pelo editor desta revista. Trabalho, porém, de especial significado e delineador de rumos para estudos que relacionam a História da Arte e os estudos etnológicos foi desenvolvido por Marco Antonio Guerra e apresentado como tese de mestrado à Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (O universo tahitiano na obra de Paul Gauguin, São Paulo 1978).

Para além do estudo da bibliografia disponível, o contato com especialistas da região marcou o desenvolvimento dos trabalhos na Europa, no contexto dos esforços de desenvolvimento internacional da organização fundada no Brasil, em 1968.

Nos trabalhos relacionados com a Polinésia, desempenhou importante papel o Rautenstrauch-Josef-Museum de Etnologia e os Institutos de Etnologia e Musicologia da Universidade de Colonia, a partir de seus elos com pesquisadores do Hawai. Nos trabalhos da seção de Etnomusicologia do Instituto de Estudos Hinológicos e Etnomusicológicos, dirigido desde 1977 por um brasileiro, o editor deste órgão, temas relacionados com a Polinésia foram intensamente considerados, também nas suas relações interdisciplinares com a Hinologia, complexo que se impõe de modo especial no caso de uma região tão marcada pela ação missionária protestante.

Foi justamente o estudo da problemática polinésia que mais contribuiu para o despertar da consciência pela necessidade de uma orientação culturológica e interconfessional à Hinologia, em estreita relação com uma Etnomusicologia compreendida como Antropologia Músico-Cultural. Essa orientação teve a sua expressão nos congressos e simpósios realizados por instituições que se inserem na corrente representada pela A.B.E..

Os estudos que relacionam a Polinésia e o Brasil dirigem a atenção a universos indígenas anteriores ao contato com o europeu e às transformações por que passaram. São impreterivelmente acompanhados por vozes que, no decorrer dos séculos, lamentaram a perda de situações paradisíacas, de modos de vida marcados por relações harmoniosas entre o homem e a natureza.

O contraste entre situações decantadas pela felicidade dos homens vivendo em liberdade e aquelas determinadas pela faina gananciosa dos europeus marca grande parte da literatura. Mesmo que tais visões do passado remoto representem apenas projeções européias, não correspondendo plenamente à realidade histórica, indicam que os europeus encontraram nessas regiões situações que correspondiam a antigas imagens relativas à natureza humana e à maior possível felicidade a ser alcançada na terra. Os estudos Polinésia-Brasil levam, assim, a questões da linguagem de imagens do Ocidente e, com ela relacionada, de concepções relativas ao homem e à natureza. É aqui que se manifestam sobretudo a atualidade e o significado desses estudos.



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Indicação bibliográfica para citações e referências:

Bispo, A.A. (Ed.). "Estudos Culturais da Polinésia e Estudos Euro-Brasileiros". Revista Brasil-Europa 125/1 (2010:3). www.revista.brasil-europa.eu/125/Polinesia-Brasil.html



  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização Brasil-Europa, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens relativos à Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência (culturologia e sociologia da ciência), a seus institutos integrados de pesquisa e aos Centros de Estudos Culturais Brasil-Europa:
    http://www.brasil-europa.eu


  2. Brasil-Europa é organização exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. Não tem, expressamente, finalidades jornalísticas ou literárias e não considera nos seus textos dados divulgados por agências de notícias e emissoras. É, na sua orientação culturológica, a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. A A.B.E. insere-se em antiga tradição que remonta ao século XIX.


  3. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações, academias de letras ou outras páginas da Internet que passaram a empregar designações similares.









 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 125/1 (2010:3)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
órgão da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg.1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

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ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2588


©


Estudos Culturais da Polinésia e Estudos Euro-Brasileiros


Relações Brasil-Taiti

Do programa da Academia Brasil-Europa Atlântico-Pacífico de atualização dos estudos culturais transatlânticos e interamericanos
Ciclo de estudos na Polinésia Francêsa e no Hawai, 2010
sob a direção de A.A.Bispo

 






  1. Fotos H. Hülskath© .
    Título e coluna: Centro Cultural Polinésio do Hawai. No Texto: bandeira francesa, brasão e edifício do govêrno em Papeete, Taiti.

 

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