Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Pesquisa genealogica Misfeldt

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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 139/20 (2012:5)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização de estudos de processos culturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência -

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2012 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N°2938


A.B.E.


Hans Brøchner Misfeldt (1919-1995)
Pesquisas genealógico-culturais de Anna Margarita Brochner Misfeldt

 


Anna Margarita Brochner Misfeldt
Anna Margarita Brochner Misfeld (São Vicente, SP), dedica-se a pesquisas genealógicas referentes à sua família e, em especial ao estudo da vida de seu pai, Hans Brøchner Misfeldt (1919-1995), engenheiro naval dinamarquês que desde 1958 radicou-se no Brasil.


É apoiada nesse intento em especial pelo seu filho mais novo, John Albert Gonzalez Brochner Misfeldt (*1995).


Tendo corrido o mundo e visitado países dos cinco continentes, o seu pai, para além de sua formação profissional, possuía uma vasta cultura geral, dominando sete idiomas. Viveu no Canadá e no México, radicando-se no Brasil. A alegria e jovialidade que surgem como características de sua cultura dinamarquesa fizeram com que fosse querido por seus colegas profissionais, familiares e amigos.


Anna Margarita Brochner Misfeldt procura, com esses estudos, manter viva a sua memória, salientando a sua personalidade, a sua capacidade intelectual e suas qualidades humanas.


Aprendeu a admirá-las mais intensamente sobretudo no último ano de sua vida, quando dele cuidou, o que motivou-a também a dedicar-se desde então profissionalmente ao acompanhamento de pessoas de terceira idade.


Compreende o seu empenho como uma homenagem a seu pai, como uma contribuição à família e aos estudos da imigração.


Hans Brøchner Misfeldt e viagens marítimas nos anos 50


Arosa Line

Pesquisa genealogica Misfeldt
Nascido em Kolding, Dinamarca, Hans Brøchner Misfeldt, trabalhou quando jovem nas Linhas Aéreas Escandinavas (SAS) e, a seguir, na Marinha.


Fotografias conservadas na família apresentam-no em uniforme de oficial como engenheiro naval e incluem uma imagem do Arosa Sun, famosa nave da Arosa Line.


Uma dessas fotografias apresenta Hans e a sua esposa Marie Margarita ainda jovens, no convés do Arosa Sun.




A Arosa Line (Companhia Internacional Transportadora), de propriedade de um homem de finanças suíço-italiano, foi uma companhia de cruzeiros que experimentou uma extraordinária expansão em meados da década de cinquenta. Um fator dessa expansão foi o fato de também transportar imigrantes, em particular do Norte da Europa ao Canadá e aos Estados Unidos.


Diminuindo a procura de imigrantes, a companhia procurou desenvolver atividades no Caribe, com cruzeiros que partiam de New York e Miami, entre 1957 e 1958, com resultados negativos. Com a diminuição da imigração e o desenvolvimento dos transportes aéreos, que se tornaram então mais acessíveis, a companhia entrou em crise, não podendo saldar as suas obrigações financeiras, abrindo falência.


No inícío de sua expansão, para além do Arosa Sky, um dos maiores navios da companhia, e o Arosa Star e o Arosa Kulm, adquiridos mais tarde, a companhia comprou a antiga nave Felix Roussel da Compagnie des Messageries Maritimes, que foi rebatizada de Arosa Sun e destinada ao serviço do Atlântico.


O navio, de construção francesa, havia feito a sua viagem inaugural em fins de 1929 e contava com uma movimentada história do período da Guerra e na década a que ela seguiu. A sua reforma levou a melhoramentos técnicos, e modernizações através do envidraçamento do convés da promenade e do aumento da capacidade de passageiros, que passou a 60 da primeira classe e a 890 da classe turística.


A primeira viagem do Arosa Sun deu-se a 14 de julho de 1955, partindo de Trieste e passando por Palermo, Nápoles, Lisboa, indo a New York e Quebec, de lá retornando ao Le Havre, Southampton e Bremen. A partir dessa viagem, deu-se início as rotas definitivas entre Bremen-Southampton-Le Havre -Quebec, um trajeto que fazia em dez dias. Nessas rotas, Quebec podia ser substituída por Montreal dependendo da direção da viagem, e o desembarque em Hamburg podia ser feito em Cuxhaven ou em Bremerhaven.


A história do Arosa Sun ficou marcada pela imigração de húngaros ao Canadá após a revolução na Hungria de 1956. Quando o Arosa Sun chegou a Quebec, a 10 de dezembro de 1956, transportando 257 húngaros, foi acolhido por grande multidão.


Se esse foi o momento de maior brilho na sua história, o mais crucial foi o da explosão de máquinas ocorrida no litoral colombiano no dia 15 de março de 1958 e que levou à morte de duas pessoas.


Após esse acidente, o navio foi conduzido a Cristobal e depois a Baltimore para reparos, retornando de New York a Bremen a 12 de maio de 1958. A sua última viagem iniciou-se no dia 13 de setembro de 1958, saindo de Bremen em direção a Quebec e Montreal, retornando então por Quebec, Plymouth, Le Havre e Bremen. Em setembro de 1958, a companhia foi obrigada a vender o Arosa Sky e, em dezembro, o Arosa Star foi retido nas Bermudas. Também em dezembro o Arosa Sun foi retido em Bremen devido à situação financeira da Arosa Line.




Significado da pesquisa de Anna Margarita Brochner Misfeldt


As pesquisas de Anna Margarita Brochner Misfeld assumem sob diferentes aspectos importância para os Estudos Culturais. Elas contribuem de forma significativa para os estudos da imigração dinamarquesa ao Brasil, tão pouco considerada, e, em contexto mais amplo, à consideração diferenciada das relações entre a Dinamarca e o Brasil, assim como aos estudos nórdicos em geral a partir de uma perspectiva brasileira.


Os materiais que levanta, provenientes de documentos guardados por membros da família e de fontes várias, entre elas de registros em livros e documentos, realiza-se com a colaboração de parentes que vivem em diferentes regiões do Brasil, em outros países da América do Sul e do Norte, assim como da Europa, criando uma rêde ampla de relações através de fronteiras que, por si, surge como relevante para estudos culturais em contextos internacionais.


O desenvolvimento das pesquisas referentes à família Brøchner Misfeldt surge como um exemplo do papel desempenhado pelos estudos genealógicos na conscientização histórica e no estreitamento de laços em rêdes familiares. A intensificação dos interesses genealógicos por parte de descendentes de imigrantes no presente, facilitada pelas possibilidades abertas pela Internet, constitui já em si um fenômeno a ser estudado sob a perspectiva dos processos de transformação cultural.


A realização desses estudos através de fronteiras nacionais, culturais e de línguas exige do pesquisador especiais pressupostos de formação. Estes são proporcionados pelo próprio contexto familiar, que já o inserem em determinadas configurações e correntes históricas, condicionando a sua perspectiva geo-cultural do mundo, o seu olhar de dos desenvolvimentos, e mesmo as suas aptidões quanto a idiomas.


Com a frequente tendência de imigrados de procurar, na sociedade que o abriga, estabelecer contatos com aqueles que falam a mesma língua e compartilham de similares modos de vida, religião e concepções, também os seus descendentes são enviados a escolas que proporcionam a manutenção desses elos com o contexto cultural de origem e frequentam correspondentes associações e círculos sociais.


Participam, assim, de processos culturais vivenciados por descendentes de imigrantes provenientes de diferentes regiões européias mas de contextos supra-regionais afins, sendo o caminho de integração na sociedade do país onde nasceram complexo, nem sempre apto a ser considerado sob enfoques de bi-lateralidade nacional de acordo com fronteiras por vezes posteriormente estabelecidas.


Anna Margarita Brochner Misfeldt estudou no Colégio Higienópolis, no Jardim Petrópolis/São Paulo, instituição marcada pela orientação antroposófica na tradição da Pedagogia Waldorf remontante a Rudolf Steiner (1861-1925), movimento inserido, nas suas origens, em correntes do pensamento do antigo Império Austro-Húngaro e, no seu desenvolvimento, do Sul da Alemanha e da Suíça, onde possui o seu principal centro em Dornach.


Por ser escola alemã em São Paulo, foi sempre procurada também por estrangeiros e descendentes de imigrantes de língua alemã que, mesmo sem vínculos com as concepções de Steiner, levaram a que seus filhos crescessem em ambiente cultural por elas marcado. Compreende-se, assim, que a pesquisadora apresente uma particular proximidade à cultura alemã, dominando o idioma, e que esse fato favoreça determinadas perspectivações do complexo dinamarquês-alemão em que se inserem os seus antepassados.


Redes familiares através de fronteiras


Que estudos culturais da imigração não devem ser conduzidos simplesmente segundo simples critérios bi-nacionais isso é indicado pelas complexas relações culturais determinadas pela história de vida de seu pai Hans Brøchner Misfeldt, casado que foi três vezes.


Em primeiro matrimônio, ainda na Dinamarca, casou-se com Anne Marie Buhrmann. A pesquisadora possui, assim, um meio-irmão na Suécia, Anders Buhrmann (*1944). Emigrou em 1946 à Suécia e adquiriu a nacionalidade sueca.  É engenheiro civil, tendo atuado na construção  de estradas, pontes, aeroportos em diferentes países do mundo, em particular africanos e balcânicos.


A segunda união, com Marie Margarita Meyer, celebrada na Alemanha, em Hamburgo, em 1956, é aquela da qual nasceu. Tem dois irmãos, Heide/Heidi (Haydee) Agostina (*1957), nascida na Cidade do México, México, que vive hoje em Toronto, Canadá, e Hans Christian (*1960), que reside em São Paulo, casado com Silvia, nascida Ferreira. Os filhos deste último casal, Hans Daniel (*1988) e Fábio Henrique (*1989) vivem também no Brasil.


Em terceiras núpcias, contraídas após o seu divórcio, Hans Brøchner Misfeldt desposou Thereza Marcellino, brasileira, que trouxe à família uma filha, Christine Ceder/Christine Marcellino Misfeldt (*1965).


A pesquisadora possui a partir das uniões de seu pai elos com a Escandinávia, que passam a ser intensificados com o seu interesse pela pesquisa familiar. Documentos e fotografias de residentes no Brasil são enviadas para os parentes da Suécia, resultando reatamento e estreitamento de vínculos. Do casamento com a sua mãe e de sua fromação escolar explica-se em particular a sua inserção na cultura alemã e que possui remotas raízes. Vínculos resultantes da emigração à América do Norte de parte da família são aqui intensificados pelo fato da sua irmã residir em Toronto.


O terceiro casamento explica, por fim, elos familiares mais propriamente com contextos brasileiros com outros pressupostos culturais e históricos, sendo que álbuns da família e outros documentos foram conservados pela última esposa de seu pai.


Os elos internacionais das rêdes em que se insere a pesquisadora ampliam-se com os seus vínculos com países íbero-americanos, em particular com o Chile, onde viveu vários anos e o que explica o fato de dominar o castelhano. No Chile vivem os seus dois filhos mais velhos, filhos da união com Hugo Eligio Becerra Rojas: Samuel Christian Becerra Brochner Misfeldt, nascido em São Paulo (*1979) e Marco Antonio Becerra Brochner Misfeldt (*1982), nascido no Chile, onde vive. O seu terceiro filho, John Albert Gonzalez Brochner Misfeldt (*1995), nasceu em Santos, SP.


Aspectos teoricos: Inserção do pesquisador em processos culturais


A consideração dos contextos em que se insere Anna Margarita Brochner Misfeld em concomitância àquela dos estudos genealógicos que desenvolve é uma exigência dos próprios Estudos Culturais.


Pesquisas genealógicas desenvolvidas em âmbitos familiares não devem ser consideradas apenas sob a perspectiva da Historiografia e do levantamento de fontes documentais, mas sim também de estudos que relacionam procedimentos históricos e empíricos e consideram a inserção do próprio observador em processos culturais.


O estudioso da própria família não é apenas historiador, mas pesquisador do próprio contexto cultural em que se insere ou com o qual se identifica. Já no início da década de 70, o então Museu de Artes e Técnicas Populares da Associação Brasileira de Folclore incentivava aqueles que passavam a dedicar-se à pesquisa a voltar-se primeiramente à própria família, nos seus pressupostos históricos e nas suas expressões culturais, tradições e práticas em situações informais ou espontâneas.


Essa orientação teve consequências para a consideração de imigrações no âmbito do ramo disciplinar respectivo, até então por demais marcado por concepções nacionalistas de Folclore.


Por outro lado, a consciência da necessidade de superação da categorizações de esferas culturais como objeto de estudos para a atualização de disciplinas culturais levou a um maior direcionamento da atenção a processos, inclusive àqueles no qual se insere o próprio observador. Essa reorientação  tem consequências para as convencionais separações disciplinares entre uma pesquisa dirigida ao próprio contexto cultural do observador e àquele que lhe é estranho, o da Etnologia.


A consideração do trabalho de Anna Margarita Brochner Misfeldt e da sua própria posição em contextos familiares traz à consciência que essa divisão disciplinar não pode ser mantida sem maiores reflexões. Ela não atua apenas como historiadora e pesquisadora do próprio contexto com que se identifica, mas é obrigada também a considerar outros ângulos de observação, agindo por assim dizer como etnóloga, tanto relativamente à Europa como ao Brasil nas suas relações com outros países do continente.


A sua situação e o seu trabalho revelam, sobretudo, um complexo de questões que se levantam no desenvolvimento de Estudos Culturais Europeus a partir de enfoques brasileiros e cuja necessidade vem sentida de forma crescente nas últimas décadas.


A visão da memória e o procedimento retrospectivo


Uma das questões teóricas que se levantam é o da orientação do presente ao passado  - antes própria de pesquisas da memória -, nas suas relações com aquelamais propriamente histórica, que procedem do passado ao presente.


Partindo de recordações de família, de documentos e de fotografias, o caminho percorrido é inicialmente o retrospectivo, ainda que se procure, paradoxalmente, reconstruir desenvolvimentos históricos no seu desenrolar no tempo. Esse procedimento retroativo é naturalmente caracterizado por pouca distância do pesquisador com relação a seu objeto de estudos, pois encontra-se a êle vinculado afetivamente.


Nessa aproximação, para além das lembranças pessoais de infância e juventude, o interesse é voltado a fontes documentais e imagens de passado relativamente recente e àquelas imediatamente anteriores ao próprio nascimento do pesquisador.


No caso de Anna Margarita Brochner Misfeldt, as recordações, avivadas pelas fotografias, dizem respeito primeiramente aos anos de 60. Essas fotos, de 1965, documentam momentos de infância passado com os seus irmãos na Dinamarca em companhia de sua mãe Marie Margarita, do convívio com as suas tias Asta e Karen.



O idílio do ambiente familiar que marca as recordações e faz surgir o passado à luz de sentimentos de felicidade revela-se em retrato de sua irmã Heidi com um cãozinho de estimação e, sobretudo, com o dos três irmãos à frente da casa de seus avós dinamarqueses, em jardim de moldes tradicionais, marcado pela naturalidade de disposição de plantas, pela espontaneidade assim sugerida e pela profusão de flores.




As fotografias de infância na Dinamarca dirigem a atenção a seus tios e a seus avós e, a partir daí, a época já mais remotas do passado de seu próprio pai.


Hans Brøchner Misfeldt era o mais velho de cinco irmãos - três mulheres e dois homens. Uma fotografia dessa época retrata a família antes do nascimento do seu pai, quando os seus tios eram ainda crianças: Asta (mais tarde Andersen1915-?), Gudrun (mais tarde Eeg, *1904-), Kjeld (1905-1961) e Karen (mais tarde Jensen, 1909-1997). Essa fotografia oferece um sugestivo documento do ambiente familiar nas primeiras décadas do século XX.




O seu avô, Hans Hansen Misfeldt (1876-1961), nascido em Lunding e falecido em Aalestrup, casou-se em 1903, em Aarhus, com Anna Brøchner (1903-1958), nascida em Aarhus e falecida em Augustenborg.  Essa avó passa assim a desempenhar um papel importante na reconstrução familiar, pois dela provém um dos sobrenomes do pai e da própria pesquisadora.


Uma fotografia do início do século XX apresenta o casal em trajes de passeio e com as correspondentes bengalas em logradouro público.


Pesquisa histórica de fontes


Já a partir dessa fase do trabalho reconstrutivo a partir do presente, a pesquisa mais propriamente histórica de fontes documentais passa a desempenhar papel condutor.


A atenção dirige-se a seus bisavós, Hans Henrik Misfeldt (1852-1928), nascido em Dalby e falecido em Lunding/Haderslev e à sua mulher, Cathrine Maria (Hoejer, 1849-1937), com a qual se casou em 1875. A partir de de fontes documentais procura-se  reconstruir
situações dessa geração, considerando-se os irmãos de Hans Henrik, Christine (Jörgensen, 1845-?) e Hansen (1848-1915).


Emergindo mais ainda no passado, na verdade, porém, reconstruindo-o a partir de fontes, a pesquisadora tem a felicidade de possuir dados a respeito dos seus tataravós e de gerações anteriores.


Os seus tataravós foram Max Hinrich Misfeldt (1815-1890), nascido em Holtenau e falecido em Sdr. Stenderup, casado com Anna Marie Ibsdatter Hansen (1811-1895), da qual teve os três filhos mencionados. O seu tataravô era filho de Claus Hinrich Misfeld e Christina Magdalena (Gotsch) e tinha quatro irmãos: Dorothea Elisabeth, Esther Magdalena, Margretha e Christian. Por sua vez, Claus Hinrich Misfeld era filho de
Henning Hinrich Misfeld (1732-1804) e Margreth Christine (1742-1804), que dirigem  atenção à localidade de Dänischenhagen, onde vieram a falecer.


Atinge-se, assim, o ponto de partida de fontes documentais de pesquisas da família Misfeldt que vem sendo desenvolvidas por Horst Missfeldt de Ratekau, Schleswig-Holstein e que foram comunicadas à pesquisadora no Brasil. (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/139/Horst-Missfeldt)



Contextualização de de pesquisas retrospectivas e cronológicas - Kolding


Os estudos genealógicos, conduzidos ou pelo caminho do presente ao passado ou do passado ao presente, com as suas complexas relações e interferências, necessitam ser acompanhados por esforços de contextualização dos dados para que possam adquirir maior significado e mesmo superarem a esfera de interesses restrita a rêdes familiares.


No caso da pesquisa de Hans Brøchner Misfeldt, oferece-se a cidade de seu nascimento, Kolding, como um ponto de partida significativo no esforço de reconhecimento de contextos, de pressupostos culturais e suas consequências.


Ao mesmo tempo, a atenção dirigida a Kolding evidencia o significado do estudo da história de vida de Hans Brøchner Misfeldt sob perspectivas globais, uma vez que estabelece um vínculo entre o Brasil e um dos centros mais importantes da história do comércio marítimo, das vias de comunicação e das instituições do ensino médio e universitário da Dinamarca.


Kolding surge como cidade marcada secularmente por relações entre portos e nações, entre o Norte e o Sul, o Oeste e o Leste da Europa.


Essa cidade portuária, situada no Fjord do mesmo nome no Syddanmark, tem o seu significado em grande parte determinado pela sua situação geográfica. Essa localização e o seu seguro porto garantiu-lhe posição de importância marítima e comercial na esfera báltica e norte-européia desde a Idade Média, quando, no século XII, desenvolveu-se a partir de uma praça de comércio. É sob o pano de fundo dessa antiga tradição marítima que a vida na Marinha de Hans Brøchner Misfeldt ganha profundidade histórica e significado cultural.


Um outro aspecto que deve ser considerado com particular atenção é a situação de Kolding de limite em campos de tensões político-culturais da Dinamarca e da Alemanha. Tornou-se cidade de fronteira já no século XIII, quando o Ducado de Schleswig separou-se do reino da Dinamarca. Essa posição determinou medidas construtivas de defesa, entre outros o da edificação do burgo Kondinghus, remontante talveu a época anterior àquela do reinado de Erik Klipping (+1286).


Como praça de comércio e entreposto, Kolding floresceu a partir de fins do século XV pelo papel que exerceu como posto alfandegário para o comércio de reses com os ducados de Schleswig e Holstein. A consideração do papel exercido pelo caminho de gado na região pode abrir perspectivas para estudos mais aguçados sobre a vida de emigrados de parte da família Missfeldt, como expressa nas "Recordações da Floresta do Brasil" de Willi Missfeldt. (Veja )


Para além do seu significado portário, comercial, de entreposto e de estação de vias de tráfego em ponto limítrofe, não se pode esquecer que Kolding desempenhou também papel de cidade-residência à época de itinerâncias da Côrte antes da sua fixação em Kopenhagen no século XVI. Esses períodos passados de florescimento cultural explicam o significado da cidade á época da Reformação protestante, da qual tornou-se importante centro, e a sua consciência histórica de cidade de cultura e do ensino.


A partir do século XVII, com o desenvolvimento de outras cidades da região e com a fundação de Fredericia, com a sua ocupação durante a Guerra dos Trinta Anos e devido a uma epidemia de peste em 1654/65, a cidade foi abalada no seu desenvolvimento.


Foi no século XIX que Kolding recuperou o seu significado, experimentando um período de intenso desenvolvimento e que surge como pressuposto para a compreensão do ambiente social e cultural que marcou a história de parte da família em estudo.


Após ter sido atacada em 1849 por tropas prussianas na Guerra de Schleswig-Holstein, com a separação do Ducado de Schleswig da Dinamarca e consequente delimitação de fronteiras, a cidade adquiriu renovado significado.


O seu desenvolvimento econômico e urbano deveu-se sobretudo à implantação de Esbjerg como Porto do Mar do Norte e de estradas de ferro. Esse desenvolvimento levou a uma transformação da fisionomia da cidade, que recebeu novas construções técnico-industriais, entre elas um reservatório, em 1886, e uma usina de eletricidade, em 1898.


Os Brøchner em época do desenvolvimento de Aarhus no esculo XIX


Esse desenvolvimento das cidades dinamarquesas na segunda metade do século XIX, em parte em consequência da perda dos territórios do sul de Schleswig, Holstein e Lauenburg com a separação de Schleswig, manifestou-se também em Aarhus, o mais importante porto da Dinamarca, situada na costa oriental da península Jütland.


Essa cidade tornou-se o centro da rêde ferroviária, marcada pela presença de maquinistas, foguistas, carregadores, artesãos, empregados e funcionários da estrada de ferro.


É nesse contexto que pode ser considerado o passado da família Brøchner, dirigindo a atenção a Anna Brøchner (1881-1956), a avó dapesquisadora.


Anna Brøchner era filha de Johannes Hastrup Brøchner (1857-1929).


Um documento significativo levantado pela pesquisadora é um texto que considera as muitas gerações da família que atuaram na DSB (Danske Statsbaner), partindo de Johnnes Hastrup Brøchner na oficina central de Aarhus e do qual celebrou-se o centenário em 1982.


Nascido na freguesia de Vejlby, Hasle, circunscrição de Aarhus, dele existe uma fotografia, que o retrata com a idade de ca. de cinquenta anos. Em 1927, retirou-se para uma vila de repouso na periferia d Aarhus. Foi seguido na DSB por Niels Hastrup Brøchner (1905-1988).


As atividades de Johannes Hastrup Brøchner (1857-1929) cairam em período do desenvolvimento dos transportes ferroviários com a nova situação política da Dinamarca e que foi marcado pela compra sucessiva das linhas ferroviárias existentes, levando à fundação da DSB emn 1867. Esse processo chegou praticamente ao fim em 1882, quando já todas as principais linhas se encontravam sob o controle do Estado.


Kolding na história do ensino e como centro de estudos secundários e superiores - Hans Hansen Misfeldt (1876-1961)


Um documento de particular significado para o estudo de contextos levantado pela pesquisadora é uma publicação do ano da morte do seu avô, no qual se considera, em texto de Karen M. Carstens, a atuação do professor Hans Hansen Misfeldt.


Essa publicação traz à consciência do pesquisador o significado de Kolding para a história do ensino na Dinamarca e a corrente histórica na qual se insere Hans Brøchner Misfeldt.


Como acima mencionado, a  história cultural e o desenvolvimento de Kolding como centro educativo foram marcados pela Reformação.  Esta foi acompanhada pela fundação de ginásios à época de Christian III° (1503-1559), rei da Dinamarca e Noruega, principal promotor da introdução da Reforma luterana na
Dinamarca, Noruega e Islândia. Já antes de 1542 as fontes indicam ter ali existido uma escola em Kolding, Em 1558, o rei Christian III°, que havia traduzido a Bíblia em 1550, criou ali uma escola de Latim.


A rainha Dorothea (von Sachsen-Lauenburg-Ratzeburg, 1511-1571), após a morte do rei passou a residir em Kolgindhus. Dando o seu apoio à escola, possibilitou que fosse instalada em 1566 em edifício sólido defronte à igreja. Criou também uma tradição de disciplina e ordem que passou a caracterizar a vida escolar do Ginásio. O seu empenho fêz com que o seu nome entrasse na história como a fundadora do Ginásio de Kolding. Somente em 1729 foi esse prédio substituído por um novo, onde a memória de Dorothea foi perenizada em placa memorial. O cargo de reitor do Ginásio era de importância, sendo exercido ou por párocos por por pregadores reais da Côrte.


De suas origens e do empenha da rainha Dorothea, o Ginásio sempre vinculou-se estreitamente com a igreja. Os alunos tomavam parte nos serviços religiosos, onde o canto desempenhava importante papel. A formação ali recebida abria as portas para os estudos universitários ou para a carreira religiosa. O vínculo religioso do ensino era tão acentuado que os alunos eram designados como Pebling, um termo que significa "pequenos sacerdotes".


Com o desenvolvimento econômico e urbano do século XIX, o Ginásio também passou por transformações na sua orientação, acentuando-se a importância das matérias matemáticas e científico-naturais. É nessa fase de renovação dos estudos que se insere Hans Hansen Misfeldt, que salientou-se sobretudo como professor de matemática.



Significado dos elos da família com o Ginásio de Kolding para o Brasil


O Ginásio de Kolding é hoje conhecido supraregionalmente e mesmo em círculos internacionais sobretudo por constituir uma IB World School. oferecendo, para além dos cursos secundários convencionais, cursos do programa HF e do Diploma IB. Esse programa do Diploma IB em Kolding, autorizado desde dezembro de 2003, é desenvolvido em inglês, em correspondência ao sentido internacional desse projeto.


O IB - International Baccalaureate Diploma Programme IBDP - dura dois anos e pode ser frequentado por alunos entre 16 e 19 anos, proporcionando pré-requisitos para a entrada nos estudos superiores. O programa foi desenvolvido a partir de meados dos anos sessenta em Genebra, sendo administrado pelo IB, o International Baccalaureate. Para nele participarem, os estudantes precisam cursar uma escola IB. O programa procura introduzir o pensamento interdisciplinar nos estudos superiores.


Kolding assume hoje significado no panorama universitário europeu por abrigar desde 1999 um campus da universidade da Dinamarca do Sul, renomado pela sua orientação avançada, sobretudo no estudo das Ciências Econômicas e no Design.




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Indicação bibliográfica para citações e referências:
"Hans Brøchner Misfeldt (1919-1995).
Pesquisas genealógico-culturais de Anna Margarita Brochner Misfeldt". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 139/20 (2012:5). http://www.revista.brasil-europa.eu/139/Anna-Margarita-Misfeldt.html