Organização visual de tradições: Brasil e Moldau. BRASIL-EUROPA 134/10. Bispo, A.A. (ed.). Academia Brasil-Europa e ISMPS





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BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Voronet, Moldau, Romenia. Foto A.A.Bispo

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Voronet, Moldau, Romenia. Foto A.A.Bispo

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Fotos A.A.Bispo
©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 134/10 (2011:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2819


A.B.E.


Os "cordões" nas tradições brasileiras
e a organização visual do Juízo Final nas igrejas conventuais do Moldau

- a igreja de São Jorge de Voroneț: a "Capela Sixtina" do Leste -

Ciclo de estudos da A.B.E. na Bucovina. Sucevita , 2011. Pelos 20 anos da sessão acadêmica dedicada a Portugal e ao Brasil na Universidade Urbaniana, Roma

 

A estruturação de expressões lúdico-festivas de danças, cortejos  e encenações do patrimônio cultural brasileiro de fundamentação cristã vem sendo intensamente estudada desde a década de 70 no âmbito dos trabalhos desenvolvidos na tradição em que se insere a A.B.E..

Partindo-se da constatação empírica de que muitas dessas expressões são configuradas segundo duas linhas, colunas, cordões ou filas, caracterizadas em geral pelas cores vermelha e azul, dispostas ao redor de um eixo central, ainda que por vezes apenas sugerido ou simbolizado por um atributo ou instrumento, onde as cores se interrelacionam, tem-se procurado, em pesquisas de fontes, os fundamentos teóricos que expliquem e justifiquem tais características constatadas pela observação da tradição viva.

Vários foram os caminhos trilhados e discutidos, dando-se aqui particular atenção à literatura teológica medieval e a escritos da mística cristã e judaica. (e.o. Bispo, A.A., Grundlagen christlicher Musikkultur in der außereuropäischen Welt der Neuzeit: der Raum des früheren portugiesischen Patronatsrechts, Musices Aptatio 1987/88, Roma: 1989)

A razão dessa ordenação de expressões culturais tradicionais cristãs, que surge como inigmática mesmo para teólogos, esteve no centro das atenções de simpósios e seminários internacionais realizados em instituições pontifícias em Roma nos anos 80. A questão foi tematizada na sessão acadêmica solene realizada em 1991 na Universidade Urbaniana sob a presidência do então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, atual Pontífice, a primeira dedicada exclusivamente a processos culturais desencadeados pelos portugueses à época dos Descobrimentos e aos fundamentos das expressões culturais brasileiras.

Nesses estudos da linguagem visual de fundamentação bíblica, várias vezes a atenção foi dirigida à Apocalipse e às suas representações  no decorrer dos séculos. Aqui, o Juízo Final na Capela Sixtina foi alvo de repetidas considerações em visitas primeiramente motivadas por seminário promovido pelo Instituto de História da Arte da Universidade de Colonia, em 1975.

Dando prosseguimento a esses estudos, cuja fundamental relevância para os estudos culturais em contextos internacionais tem-se continuamente salientado, cumpre retomar com mais atenção e de forma contextualizada o estudo de expressões visuais na tradição bizantina. A consideração de representações pintadas na cultura da ortodoxia corrobora a convicção de que essa ordenação que se manifesta visualmente nas expressões tradicionais do Brasil - e também de outros países - não pode ser apenas vista como arbitrária ou simples permanência sem maior significado de modêlos medievais de danças e cortejos da Europa Ocidental. Ocorrendo tanto no Ocidente como no Oriente, revela-se como necessariamente fundamentada em princípios de ordenação muito mais antigos, intrínsecos a um edifício de concepções e imagens relativos ao mundo e ao homem justificado pelas Escrituras.

A ordenação visual segundo duas zonas murais ao redor de um eixo central - aparentemente binárias, em observação mais atenta ternárias - pode ser constatada e estudada de forma exemplar em representações murais de igrejas conventuais do Moldau. Essas pinturas a fresco, criadas no século XVI, refletem tradições seculares transmitidas pela tradição, além de demonstrarem grande proximidade à cultura popular, o que aumenta o seu interesse sob a perspectiva dos estudos culturais. Os princípios de ordenação visual do complexo de concepções evidenciam-se sobretudo nos grandes painéis dedicados ao Juízo Final que marcam de forma impressionante a arte pictórica das paredes externas dessas igrejas.

Igreja conventual de Voroneț

Entre os mosteiros da Bucovina que mais merecem a atenção em estudos culturais de linguagem visual salienta-se o de Voroneț devido à sua igreja de São Jorge (Sfântul Gheorghe). Situado na aldeia de mesmo nome, não longe da cidade de Gura Humorului, é reconhecida como integrante do Patrimônio Cultural do Mundo pela UNESCO. De todas as igrejas conventuais da região, exerce particular fascinação pela sua côr azul predominante e que passou a ser conhecido como "azul de Voroneț".

Voronet, Moldau, Romenia. Foto A.A.Bispo

A igreja foi construída sobre os fundamentos de uma igreja mais antiga no curto espaço de tempo de 26 de maio a 14 de setembro de 1488.

O plano, o de uma basilica em forma de cruz, é bizantino; tem-se observado, porém, uma certa tendência à verticalidade na altura da cúpula e que sugere influências externas, possivelmente húngaras, explicáveis a partir da Transilvânia.

Em 1547, durante o reino de Petru Rareș (ca. 1487-1546), filho de Ștefan cel Mare/Estêvão Magno (ca. 1433-1504), a decoração externa foi concluida. Foram realizadas sob a orientação do abade Grigore Roscas, o metropolita do Moldau, A igreja abriga os seus restos mortais, tornando-se assim a sua igreja sepulcral.

No interior da igreja, encontram-se representados todos os 365 dias do calendário, com santos. As imagens aparecem com trajes da época, em roupas de bojares do Moldau ou com carros puxados a cavalo da região. Na nave, salientam-se cenas da vida de Cristo, na tradição bizantina, cujos princípios foram transmitidos por monges do monte Athos. O programa iconográfico externo inclui, no norte, a representação dos santos das ordens monacais no norte, cenas da  Genesis, mostrando Adão e Eva no trabalho após a expulsão do Paraíso, o hino Akathistos e a árvore de Jesse, que inclui filósofos da Antiguidade. Na face ocidental, o programa inclui cenas da vida de S. Nicolau, de S. Jorge e João o Novo, um mártir da Bucovina. Nas pinturas estão inseridos também os dois vultos de importância na história da igreja: o monge Danlil, seu iniciador, e o metropolita Grigore Rosca, responsável pela sua pintura.

Possivelmente para a realização do grande plano de representação pictórica, ampliou-se a fachada da igreja, criando-se na parede ocidental, protegida por um terraço, uma superfície ampla para as pinturas, sobretudo para a do Juízo Final.


Significado de São Jorge (Άγιος Γεώργιος) no Moldau

Segundo a tradição, a igreja conventual foi construida por Ștefan cel Mare em memória à vitória obtida na batalha de Vaslui. Essa batalha, ocorrida em 1475 no Moldau, foi uma das maiores derrotas sofridas pelo Império Otomano, até então considerado como invencível. Representou, assim, um marco na história da Cristandade assolada pela potência muçulmana, assumindo papel simbólico na formação da identidade moldava.

Foi construido em agradecimento pelo apoio espiritual recebido por Ștefan cel Mare de um monge de nome Danlil que vivia nessa região cortada pelo riacho Voroneț. Em fase de desconsolo durante as guerras contra os turcos que ameaçavam tomar posse do seu reino, o príncipe tomou forças e recuperou fé para o prosseguimento das lutas a partir da cultura ascético-monacal já ali existente.


A dedicação da igreja a São Jorge deve ser considerada em estreita relação com essa vitória. Sugere que o apoio recebido do monge relacionou-se estreitamente com o paradigma representado por esse santo. Com a sua proteção ter-se-ia alcançado a vitória; a igreja, construída em ação de graças, o tem como padroeiro. Significativamente, na parede ocidental interna da nave da igreja, em imagem de 1488, vê-se como Estêvão "O Grande" oferece a Cristo o modêlo da igreja através da mediação de São Jorge.

A igreja de Voroneț documenta o extraordianário significado do culto a São Jorge na cultura cristã oriental, onde é venerado como grande mártir ou arquimártir, e, em particular, na região do Moldau, confrontada mais de perto com a ameaça turca. A imagem do dragão adquire aqui particular significado; popularizada à época das Cruzadas, compreende-se o seu significado em período marcado pela opressão e ameaça osmana, quando a idéia de uma nova cruzada ganhava em atualidade.


A imagem do guerreiro no cavalo branco e a do dragão são conhecidas do texto apocalíptico. Na abertura dos selos pelo Cordeiro, um dos quatro animais mostrou a visão de um cavalo branco, sobre o qual estava assentado um cavaleiro com um arco que recebeu uma coroa e que saiu vitorioso, para vencer (Apoc. 6,1-2). No decorrer da narrativa, salienta-se a imagem da mulher e o dragão como um grande sinal no céu. Vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés, e uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça, estava grávida, com dores de parto, gritando com ânsias de dar à luz. Outro sinal no céu era o dragão vermelho, com sete cabeças e 10 chifres, sôbre suas cabeças com sete diademas, que com a sua cauda após si levou a terça parte das estrelas do céu e lançou-as à terra, e que se postou diante da mulher para que, dando ela à luz, tragasse o seu filho. Na batalha, Miguel e os seus anjos lutaram contra o dragão e os seus anjos. Estes, a antiga serpente, o Diabo e Satanáz, foi precipitado na terra, onde perseguiu a mulher que dera à luz o varão. (Apoc 12)




A representação do Juízo Final

A monumental representação do Juízo Final cobre toda a fachada ocidental da igreja, sendo comparada com a da Capela Sixtina, cuja representação é da mesma época.

Em Voronet, ao alto, os anjos recolhem as pregas da cortina do tempo perante Deus. A fila imediatamente inferior, mostra Cristo no trono, Maria e Joao Batista, anjos e apóstolos. Embaixo, os justos são levados por Paulo ao Trono do Juízo.


Cenas da luta dos anjos e dos demônios dominam a representação. Rolos grandes com registros de pecados sao colocados na balança e os condenados são enviados à torrente de fogo. Aqueles cujos corpos são retirados da terra, água ou de animais, correm à porta celeste.

As imagens apocalípticas referem-se ao Juízo Final no fim da soberania de mil anos do Messias, que começa com a sua primeira vinda, a primeira Parusia. Essa compreende o juízo dos mártires, que numa primeira ressurreição assumem a suserania. Nesse império milenar, o diabo encontra-se preso. Com a segunda vinda, dá-se a libertação do demônio e a sua condenação definitiva, com a vitória final sobre êle e seus exércitos, numa última luta. Com a segunda vida, como juiz de todos os mortos, dá-se a superação e a destruição da morte. Ao julgamento final segue-se o novo céu e a nova terra, a nova Jerusalém.

Em posição elevada, central, vê-se Cristo no trono, como Pantokrator, e Salvator Mundi, em esfera irradiante de luz, cercado por anjos. De seus pés corre a corrente de fogo que, avolumando-se domina toda a parte esquerda (direita para o observador).

Abaixo, vê-se o trono, com um livro aberto sobre o qual paira a pomba do Espírito Santo, flanqueado por Maria e S. João Batista, ajoelhados, que intercedem pelos homens. Abaixo do trono surge a mão que segura a balança do julgamento. Anjos tocam as trombetas do juizo (Mt 24,31) que chamam os mortos dos túmulos. Os beatos são representados à esquerda (visto do observador) que sobem ao céu, à direita os condenados.

Alguns pormenores da representação testemunham a aplicação das imagens apocalípticas à época e ao contexto cultural, ou melhor, a interpretação das circunstâncias atuais segundo as visões bíblicas. Assim, no grupo dos infiéis, o observador depara com turcos e tataros.O rei David toca não a harpa, mas o instrumento de cordas dedilhadas da região, o cobsa; os anjos tocam nos cornos dos Cárpatos, os buciumi.

Hetoimasia na representação de Voroneț

O centro do painel, na terceira faixa pictórica a partir de baixo, encontra-se a representação da Hetoimasia/Etimasia ou do Trono de Deus. Esse ícone indica a concepção trinitária do todo e somente pode ser entendida a partir dela. O Trono diz respeito ao Pai, a Cruz sôbre êle o Filho, a pomba sôbre o livro aberto o Espírito Santo.  Somente assim é que se pode compreender que, abaixo do Trono, saia a mão, que é a de Deus, e que segura a balança de julgamento que marca o pavimento inferior do painel. Essa representação da Hetoimasia na pintura mural externa da Bucovina testemunha a permanência de um complexo imagológico da Santíssima Trindade que não pode ser lido segundo os seus elementos separados, mas sim na unidade do todo das concepções trinitárias e que, da arte cristã dos primeiros séculos do Cristianismo, se manteve particularmente viva no universo bizantino do Oriente.

A representação do Trono, Cruz (ou Cordeiro) e Pomba/Livro indica a preparação do Trono de Cristo para a sua nova vinda como juiz para o Juízo Final segundo a revelação de S. João (Apoc. 22,1-4).

Dos dois lados do trono se encontram dois suplicantes, ajoelhados. Do lado direito do Trono, o intercessor tem por detrás de si, grupos de reis, sacerdotes e outros grupos cristãos, do lado esquerdo do trono, surgem grupos representantes de judeus e de povos orientais.


Pantocrator ( παντοκράτωρ) e Deisis (δέησις) na representação de Voroneț

Acima da faixa centralizada na Hetoimasia, encontra-se, no seu centro, e, portanto, acima do trono, a representação de Cristo Pantocrator na sua majestade entronizada de igualdade a Deus, em atitude de benção. Surge no centro de esferas de luz, rodeado por anjos. Do lado direito e esquerdo aparecem as figuras dos intercessores, agora de pé, constituindo a Deisis, ou seja, Maria e São João Batista. Percebe-se, aqui, uma troca de posições com relação à faixa inferior da representação, surgindo Maria agora do lado direito. De ambos os lados, encontram-se sentados justos, constituindo quase que assistência do que se desenrola no Juízo e do que acontece nos planos inferiores.


Plano supremo: Deus Pai e o desenrolar da cortina do tempo

No plano superior do painel, em meio a uma abertura que sugere ser uma janela com portas que são abertas por anjos, surge Deus Pai na compleição do tempo.


À direita e à esquerda surgem figuras, seis de cada lado, em fundo de estrêlas de um painel que é desenrolado por anjos. Há, assim, dois momentos de abertura, um do desenrolar do painel, outro da janela de Deus. Em observação mais cuidadosa, percebe-se que alguns dos signos podem ser identificados como sendo aqueles conhecidos do zodíaco, reconhecendo-se, por exemplo, sem maiores dificuldades, os signos de câncer, gêmeos, sagitário e escorpião. Os demais signos, por pertencerem possivelmente a uma outra tradição de representação visual, necessitariam ser mais bem analisados. Constata-se a frequência de imagens de animais com a parte inferior do corpo aquática, assim como dorsos de figuras humanas com a parte inferior em forma de concha.

Balança do julgamento

O segundo plano do painel, inferior ao Trono, é marcado pela complexa representação central da balança onde se pesam as obras dos homens. Ela é representada como que segurada pela mão de Deus, dela pendendo o julgado. Do seu lado direito encontram-se anjos, do lado esquerdo uma série de demônios conduzindo os pecadores para a corrente ígnea que leva aos infernos. Nesse conjunto, do lado esquerdo, surge o anjo São Miguel, mantendo preso, sob os seus pés, o diabo. Esse lado esquerdo é marcado pela correnteza de fogo que, saindo dos pés de Cristo como Juiz, acima do trono, torna-se aqui caudalosa. Para além dessa correnteza, no extremo esquerdo da faixa, encontram-se representados os mortos que, ao som de anjos que tocas trombetas, levantam-se de seus túmulos em meios a animais da terra. Do lado direito, vêem-se santos em incontável número.


Hortus conclusus

Abaixo,a divisão entre os dois lados do painel é claramente determinada. Uma parede, que coincide com o eixo da composição, encerra em si uma cidade, com inumeráveis santos no seu espaço interno e um jardim fechado, identificado com árvores e plantas, com Maria secundada por anjos, Cristo carregando a Cruz e santos. Trata-se claramente de uma representação do hortus conclusus, de particular relevância na linguagem simbólica mariana da mística do Ocidente e do Oriente. Essa representação do jardim fechado, rodeado de muralhas ocupa toda a parte direita do painel (vista do Trono).


A parte esquerda, fora dos muros, é caracterizada primeiramente pela representação da Humanidade Velha, com o Rei David no seu centro, ainda que com auréola, um anjo à beira de um doente (S. Rafael) e outro combatendo demônios à beira da corrente (São Gabriel) que, aqui, ampla, ocupa um terço do espaço.

No centro dessa corrente de fogo encontra-se la figura animalesca do demônio, sem faces, quase negro.

Queda da Babilonia - visão da grande prostituta

Toda a parte mais extrema do lado esquerdo das representações do Juízo Final nas igrejas da Bucovina é marcada por um mundo aquático, com a representação de uma figura feminina segurando um navio, sentada sobre um animal aquático. Essa mulher das águas das profundidades, abaixo da terra com os seus animais representados na faixa superior, cria um paralelo contrastante com o hortus conclusus do lado direito.

Há, assim,relações contrastantes entre os dois lados, o que também pode ser constatado nos outros planos. Essa imagem corresponde ao texto apocalíptico referente à queda da Babilonia, designada como grande prostituta assentada sobre uma besta, sobre muitas águas. Assim, o apóstolo, arrebatado em espirito, viu uma mulher assentada sobre uma besta de cor de escarlata, vestida de púrpura e de escarlata, adornada com ouro e pedras preciosas e pérolas, tendo na mão um cálice de ouro cheio das abominações e da imundície, sendo designada como a mãe das prostituições e abominações da terra. As sete cabeças da besta são sete montes, sobre os quais a mulher está assentada. As águas são povos, e multidões, e nações e linguas. A mulher é a grande cidade que reina sobre os reis da terra (Apoc. 17). A imagem traz à consciência a queda da Babilonia e as lamentacões sobre a terra descritas no texto apocalíptico. Também aqui surge a referência a todo o que navega em naus, e todo o marinheiro, e todos os que negociam no mar que, vendo o incendio, lamentavam o fim da grande cidade na qual todos os que tinham naus no mar se enriqueceram em razão da sua opulência e que se encontrava agora assolada. (Apoc. 18)

Considerações gerais

O lado esquerdo é marcado por representações de cunho antes negativo: humanidade antiga, inferno, mundo subaquatico, região de mortos, e condenados no Juíz. representantes de infiéis. O lado direito é antes marcado pela cidade cristã e pelo jardim fechado, pelos salvos e pelos beatos e santos.

O lado esquerdo predominam imagens de fogo, terra e água, determinadas claramente pela torrente ígnea, pela natureza terrena e rochosa das representações e pelo grande lago com seres do mar. O lado direito é marcado pela cidade com os seus muros e pelo jardim, predominando o dourado das auréolas. A parte direita é relacionada com Maria, que surge no jardim fechado e à direita do Cristo Pantocrator, a parte esquerda com a mulher das águas ou sereia, que leva aos naufrágios dos navios. À esquerda do Cristo surge São João Baptista, o maior homem da antiga humanidade.

A estruturação do painel, determinada pelo eixo central, permite o reconhecimento do edifício de concepções marcado pela oposição ou tensão entre o Novo do lado direito e o Velho do lado esquerdo, do espiritual do direito e do carnal do esquerdo, do dourado e branco predominante do direito e do azul escuro e do negro predominante do esquerdo.

Com base nessa constatação, percebe-se que, no Trono, o Evangelho encontra-se sobre um tecido azul, este acima de uma almofada vermelha. Ao alto, no painel supremo, vê-se os dois anjos laterais de guarda em pé respectivamente acima de uma almofada vermelha e azul. No centro, o Cristo senta-se sobre um arco-iris, reunindo todas as cores.

Antonio Alexandre Bispo



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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A."Os "cordões" nas tradições brasileiras e a organização visual do Juízo Final nas igrejas conventuais do Moldau". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 134/10 (2011:6). http://www.revista.brasil-europa.eu/134/Voronet-Juizo-Final.html



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