Patrimônio arquitetônico: Romênia e Brasil. BRASIL-EUROPA 134/30. Bispo, A.A. (ed.). Academia Brasil-Europa e ISMPS




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BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Fotos A.A.Bispo
©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 134/30 (2011:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2839




Sobre a orientação teórico-cultural na consideração da arquitetura em reflexões patrimoniais
Romênia e Brasil


Ciclo de estudos da A.B.E. na Romênia. Muzeul Satului, Bucareste 2011

 

Museus culturais ao ar-livre no Brasil e em vários países da Europa têm sido considerados nos trabalhos da A.B.E. nas últimas décadas. Em visitas e em encontros realizados nesses museus discutem-se questões referentes a concepções e métodos empregados, tecendo-se comparações. Em edição anterior desta revista, foram apresentados vários museus ao ar-livre da Islândia, modelares sob vários aspectos. Nesta edição, considera-se um museu que pode ser considerado como, sob o aspecto mais específico da arquitetura tradicional popular, como dos mais importantes da Europa: o museu de aldeias de Bucareste, Romênia (Muzeul Satului).

Situado em zona relativamente central, em meio ao grande parque Herăstrău, representa um dos principais focos de atração cultural de Bucareste. Em grande área de 100.000 metros quadrados, à beira de um lago, possui 272 construções de diferentes regiões do país.


Arquitetura, conceitos de patrimônio e de cultura material e imaterial

No centro das atenções dos trabalhos desenvolvidos no Museu das Aldeias de Bucareste esteve a questão das relações da arquitetura com conceitos de patrimônio material e imaterial. Essas distinções, que constantemente podem ser constatadas em debates relativos a questões patrimoniais, remonta àquela entre "cultura material" e "cultura imaterial" de determinadas áreas dos estudos culturais, em particular da etnografia e do folclore.

É uma distinção amplamente difundida, e que, no Brasil, vem sendo transmitidas em compêndios introdutórios de Folclore há décadas. Aqui, incluem-se na cultura material ítens tais como habitação, acessórios da habitação, utensílios caseiros, indumentária, armas de proteção individual, alimentos e bebidas, criação de animais, aves, pássaros, caça, pesca, agricultura, indústria extrativa, artesanato, arte popular, religião e crendices, transporte, brinquedos; na cultura não-material, imaterial ou espiritual incluem-se tópicos tais como folclore do dia-a-dia, usos e costumes, festas, música, dança, folguedos populares, jogos, grupos religiosos, linguagem, literatura, superstições e crendices e medicina popular (Rossini Tavares de Lima, ABECÊ do Folclore, 4a. ed. São Paulo: Ricordi, 1968,  80-84).

Já a disparidade dos ítens incluidos nas respectivas categorias levanta a questão dos critérios utilizados para a classificação e mesmo para a distinção entre cultura material e imaterial. A lógica na distribuição dos assuntos e da categorização de cultura material e imaterial baseia-se aqui sobretudo na diferença entre o palpável e o não-palpável. Esse critério permanece vivo no debate patrimonial, onde frequentemene se constata a diferença entre o patrimônio tangível e o intangível.

Essas designações surgem sob diferentes aspectos como inadequadas e mesmo inaceitáveis. Sob patrimônio intangível compreende-se o patrimônio não-palpável, pois um patrimônio não-alcançável não faria sentido; correspondentemente, o patrimônio tangível diz respeito ao palpável.

Dá-se, assim, na discussão patrimonial, de forma pouco refletida, continuidade à distinção entre cultura material e imaterial. Deve-se notar, aqui, que não se fala  do material e do imaterial na cultura, mas sim de cultura material e cultura imaterial. A distinção entre essas duas categorias de cultura levanta necessariamente questões de coerência e coloca problemas de difícil solução - por exemplo o das relações entre a cultura imaterial com a material num todo cultural.

Deficiências teóricas e necessidade de reflexões

As deficiências dessa sistematização são de natureza fundamental, pois dizem respeito à concepção de matéria. Esta não pode ser reduzida ao que é palpável, ou seja, delimitá-la à percepção de um dos órgãos dos sentidos, o do tacto. Considerar a percepção dos demais sentidos, porém, dirigindo a atenção à realidade perceptível sensorialmente, implicaria na superação do sistema de classificação: cantos, sendo percebidos pelos ouvidos, não poderiam ser incluidos numa outra categorização de cultura do que, por exemplo, a arquitetura.

A deficiência teórica das concepções manifesta-se, também, no igualar da cultura imaterial ou não-material com a cultura espiritual, o que leva a consequências inaceitáveis: a arquitetura religiosa, por exemplo, não pertenceria à cultura espiritual? Todo e qualquer tipo de música ou de expressões culturais do quotidiano seriam parte da cultura espiritual?

A atualidade da discussão decorre da preocupação pragmática de pesquisadores culturais a respeito de uma possível delimitação da política patrimonial a monumentos construidos, a igrejas, palácios ou obras de artes plásticas, deixando-se de conservar adequadamente o patrimônio cultural constituido por outras expressões culturais, em particular o de danças, folguedos, cantos, narrativas e encenações tradicionais.

Por mais justificáveis que sejam essas preocupações, soluções para o problema pressupõem reflexões teóricas de base quanto a concepções. Seria injustificável e mesmo contraprodutivo se se criasse uma oposição artificial entre pesquisadores culturais e posições patrimoniais marcadas prioritariamente pela arquitetura. O que surge como necessário é justamente o de se dirigir a atenção à inserção do construído e da configuração do espaço no complexo cultural no seu todo. Somente uma arquitetologia e urbanologia de orientação teórico-cultural poderá abrir caminhos para a consideração conjunta de relações do edificado com a música, com as artes visuais ou de movimento, ou seja, para a consideração mais sensível de processos culturais, também sob a perspectiva de questões patrimoniais.

Muzeul Satului de Bucareste

O "museu das aldeias" de Bucareste oferece condições favoráveis para o tratamento dessas questões. Já pela suas origens, foi resultado de intenções que não se limitaram exclusivamente à conservação de monumentos, mas sim à arquitetura como parte de desenvolvimentos culturais.

Museu Satului, Bukarest
De iniciativa do pesquisador rumeno Dimitrei Gusti (1880-1955), secundado por Victor Ion Popa e Henri H. Stahl, correspondeu à formação multidisciplinar do seu principal promotor como sociólogo, etnólogo, histórico e filósofo-cultural, professor universitário e Ministro da Educação.

Nascido em Iaşi, principal centro cultural da Romênia, inseriu-se, através dos seus estudos na Faculdade de Letras da universidade local em correntes culturais que desempenharam papel fundamental no desenvolvimento do país e na formação de sua identidade. Tendo dado continuidade a seus estudos na Universidade Humboldt em Berlim, onde dedicou-se à Sociologia, à Política Econômica e à Filosofia, tornou-se professor de História Antiga, Ética e Sociologia na Universidade de Iasi, contribuindo à institucionalização da Sociologia na Romênia. Transferindo-se para Bucareste, em 1920, passou a atuar como Professor de Sociologia, Ética, Polítca e Estética na Faculdade de Letras e Psicologia.


Patrimônio "material" e a questão do valor: ocas de barro e palha

Que o conceito de patrimônio "material" não pode guiar-se exclusivamente segundo critérios de valor do material, de qualidade técnico-construtiva, histórico-artísticos ou de significado memorial ou simbóilico de fatos históricos, isso é lembrado pela atenção dada à importância cultural de ocas de barro e palha no Museu de Budapeste.


Essas cabanas, com paredes de barro e madeira, estrutura de telhado de madeira e cobertura de palha ou feno, permaneceram por mais tempo em uso na Romênia do que em outras regiões da Europa. Esse tipo de construção é representado no Museu por duas cabanas provenientes da região de Olt (povoado Bordeiul Draghiceni) e de Dolj (próximo a Castranova). 

Esses exemplares demonstram que um tipo de moradia, remontante ao neolítico, e difundido por todo o continente até fins da Idade Média, manteve-se através dos séculos seguintes em regiões mais afastadas, alcançando o século XX. Assim, o exemplar proveniente de Olt, trazido para o museu em 1949, foi construído ao redor de 1800 e utilizado como moradia até 1948.

As cabanas não representam monumentos, mas sim documentos não apenas de uso de materiais e técnicas construtivas próprios do meio e a êle adequados, mas de ordenação e percepção de espaços, formas e qualidade de vida, com suas consequências para a vida familiar e comunitária. 

A atenção é dirigida, assim, ao "imaterial" na arquitetura. A experiência do espaço pode ser aqui considerada nas suas relações com outras formas de expressão, por exemplo na análise dos motivos geométricos e vegetais da decoração dos batentes das aberturas. Vice-versa, estudos de expressões artísticas em artefatos, cerâmica e vestuário podem abrir caminhos para o aprofundamento dos estudos relativos ao espaço.

A consideração dessas construções, sem maior "valor material" ou monumental, não tem apenas sentido museal de documentação histórica e etnográfica. Uma das razões da permanência desse tipo de habitação residiu na sua apropriação à natureza, em particular às condições climáticas, salientando-se aqui qualidades térmicas dos espaços internos em regiões marcadas por inverno rigoroso e intempéries.


A cabana de Olt, em particular, testemunha a prática de construção semi-enterrada no solo e de teto baixo, com espaços comunicantes, tendo como centro a cozinha, para a qual também se abria o compartimento que servia de dormitório. Esse tipo construtivo e de ordenação interna não representa apenas testemunho de passado encerrado, mas pode oferecer impulsos para a atualidade.

Já a aparência externa dessas cabanas, integrando-se na paisagem, vem de encontro a determinadas tendências da "arquitetura verde" da atualidade. Do ponto de vista de intuitos de melhor adaptação de técnicas construtivas a exigências do meio-ambiente, de desenvolvimento de formas de habitação que menos contribuam á degradação da paisagem, essas construções oferecem impulsos e, sobretudo, possibilidades de aprofundamento histórico e teórico-cultural de reflexões e projetos.

No âmbito dos estudos de processos culturais em contextos internacionais, em particular, no caso, euro-brasileiros, o pesquisador tem a sua atenção despertada para o fato de que os europeus, ao depararem com habitações indígenas à época das Descobertas, não se confrontaram com tipos de moradia totalmente diversos ou desconhecidos nos seus países, como se procedessem de meios urbanos apenas marcados por construções sólidas ou mesmo monumentais.

Marujos e colonos que provinham de regiões rurais trouxeram consigo técnicas construtivas, modos de habitar, de sentir e usar espaços que marcaram a cultura construtiva das regiões alcançadas. As reflexões relativas ao patrimônio, neste contexto, podem contribuir ao aguçamento da sensibilidade perceptiva para os valores representados nas construções indígenas, nas formas de habitação tradicional trazidas pelos europeus de regiões camponesas e na potencialidade que oferecem para impulsionar novos desenvolvimentos.

Sustentabilidade nas reflexões relativas a patrimônio "material": casa de troncos da Bucovina

As casas de barro e palha de tradição européia do Museu de Bucareste chamam a atenção aos valores de uma cultura construtiva sem a utilização de materiais nobres ou dispendiosos, pobre mas adequada ao ambiente e não sem qualidades "imateriais" na configuração, percepção e uso do espaço, o que impõe a consideração de critérios referentes às relações entre Cultura e Natureza na discussão patrimonial.

Sob esse aspecto, passa-se a considerar a economia e, sobretudo, a sustentabilidade como uma categoria de valor na compreensão de patrimônio. Reflexões nesse sentido são incentivadas sobretudo por construções em madeira conservadas em vários exemplos no museu romeno.


O uso de troncos de árvores na construção de casas, não apenas para a estrutura, mas também, sobrepostos, para a constituição de paredes, pode ser constatado pela pesquisa empírica da arquitetura sobretudo em regiões de florestas. Um exemplo de casa proveniente da Bucovina, construida no século XVIII, apenas pode ser estudado levando-se em consideração ter sido essa região, na época, ainda coberta de florestas, o que permitia o uso de troncos inteiros - não apenas de tábuas - para a elevação de paredes.

O tipo desenvolvido em época de uso - e dilapidação - dessas florestas não deixa de apresentar qualidades de moradia e condicionar modos de vida que se tornaram característicos e que marcaram os sentimentos de identidade dos habitantes da região. Assim, por possuirem, no seu interior, duas salas de estar com fogões que a aqueciam, precedidas por uma sala de entrada sem aquecimento, a prática de construção de uma "sala fria" de entrada passou a ser mantida em outros tipos de construção, mesmo contrariando exigências funcionais.

Em algumas regiões desenvolveu-se a prática de revestimento das paredes construídas com superposição de troncos. A argamassa permitia o preenchimento de frestas, impedindo a entrada de insetos e ar, servindo assim a finalidades higiênicas e térmicas; possuia também qualidades estéticas, permitindo paredes lisas, necessitando, porém, ser constantemente renovadas e pintadas, tarefas que ficavam a cargo das mulheres. Essa prática perdurou até meados do século XX como o demonstra um exemplar conservado no museu e que para ali foi transferido em 1960.

Casas de madeira como as exemplificadas no museu sugerem práticas adequadas ao meio e vêem de encontro a anelos da atualidade resultantes de uma maior consciência por questões ecológicas.

O uso da madeira tem sido promovido com o argumento de tratar-se de um material que não gasta recursos insubstituíveis, podendo ser plantado. Essa argumentação, porém, exige, como pressuposto, a plantação de florestas em dimensões correspondentes a seu uso, o que não foi o caso da Bucovina.

Não a potencialidade de uma sustentabilidade pode ser critério nas reflexões, mas sim o da sua realidade quanto à conservação e recuperação do patrimônio natural. O debate sobre o patrimônio cultural exige, assim, ser conduzido em estreito relacionamento com a do patrimônio natural. A dilapidação ou destruição do patrimônio natural passam a ser vistas como fatores que degradam o significado do patrimônio cultural.

A questão das dimensões: casa minúscula do lago de Bicaz

Nas discussões relativas a reconsiderações de conceitos de patrimônio, seja quanto às questionáveis distinções entre o material e imaterial, seja quanto ao valor pecuniário de materiais e à atenção que se deveria dar até mesmo de forma privilegiada ao patrimônio natural, critica-se uma tendência a relacionar valores patrimoniais com a monumentalidade.

No sentido mais amplo,  questiona-se uma tendência à valorização de grandes dimensões, fato particularmente observado na arquitetura e no urbanismo. Esse problema apresenta-se de forma particularmente evidente em países de passado autoritário, como a Romênia, onde, sob o regime comunista edifícios supradimensionados e planos urbanisticos monumentais a serviço da representação levaram à demolição de substância histórica construida. Essas construções, hoje por muitos consideradas como monstruosas, levantam questões patrimoniais sob diversos aspectos. Em particular quanto à economia de meios, à sustentabilidade e às relações do construído com o patrimônio natural, a tendência unilateral ao grande e grandioso na consideração do patrimônio passa ao centro das preocupações.

O necessário aguçamento da sensibilidade para o pequeno e os pequenos espaços em estudos culturais da arquitetura, também sob o aspecto do patrimônio, é exemplificado, no Museu de Bucareste, por uma minúscula habitação proveniente do lago de Bicaz.

Essa moradia foi transferida para o museu quando da construção da represa de Bicaz, e que levou ao desaparecimento de uma aldeia. Apesar de suas reduzidas dimensões, a casa apresenta uma varanda aberta de três lados e, a seu lado, uma também minúscula cabana cônica de palha. Este último tipo de abrigo era utilizado por pastores, lenhadores ou agricultores quando distantes de suas moradias, ou mesmo como cozinhas em tempo de verão, nesse caso próximas das casas.

Quintais e terreiros nas considerações patrimoniais

Outro aspecto das reflexões relativas a patrimônio a ser salientado diz respeito a uma maior consideração das áreas externas de contorno de construções de moradias, de jardins, quintais, terreiros e construções suplementares tais como depósitos e estalagens e que, sobretudo nas regiões rurais, faziam parte de forma fundamental de patrimônio familiares.

Em considerações voltadas à arquitetura sob perspectivas culturais, essas áreas externas, que se relacionam com os espaços internos das moradias de diversos modos e que fazem parte do espaço doméstico no seu todo, adquirem particular significado.

Como demonstrado em vários exemplos no Museu de Bucareste, os quintais e terreiros possibilitam estudos relativos ao trabalho, à alimentação, à economia, à vida festiva e social, ou seja, à "cultura imaterial" e que evidencia a inadequação da consideração de questões arquitetônicas sob a perspectiva da "cultura material".

Um dos exemplos mais significativos conservados é o de uma casa proveniente do povoado de Maldaresti, em assentamento de Valcea, construída no início do século XIX. Uma observação mais pormenorizada da construção indica a integração de espaços destinados a atividades externas de trabalho de terreiro na própria casa. Esta, sôbre pavimento de pedra, com porão, elevada com relação ao rés-do-chão, mostra um tipo construtivo destinado a proteger a entrada do celeiro, criando-se assim espaço para um vasto terraço por cima deste.

O compartimento de entrada, usado como cozinha, com fogão aberto encimado por chaminé, indica elos entre o viver, o celeiro no subterrâneo e o mundo sobrenatural, sendo a chaminé um canal de comunicação que deveria ser guardado por ícones, impedindo a entrada de maus espíritos. O fogo constituia aqui o centro focal dos espaços, abrindo-se para a cozinha a porta do quarto, onde a família vivia e dormia. No exterior, o celeiro ao rés-do-chão da casa conectava-se com outros depósitos e com os locais destinados aos animais.

Patrimônio arquitetônico e história da política de terras

Uma das principais preocupações nas reflexões relativas a questões patrimoniais diz respeito à coerência entre concepções dirigidas ao patrimônio, antes estáticas, e aquelas voltadas a processos culturais, antes dinâmicas, e que caracterizam os estudos culturais da atualidade. De fato, devido aos elos com correntes mais antigas do pensamento da Etnografia e do Folclore, a consideração da arquitetura e de outras expressões em museus de cultura popular ou tradicional obedece antes a critérios sistemáticos. Considerações históricas servem, de caso em caso, a elucidar origens, fornecer dados conhecidos a respeito de uso e funções, ou fundamentar interpretações.

O direcionamento da atenção a processos culturais - e não a categorizações do objeto de estudos, por exemplo segundo esferas do erudito, folclórico e popular -, exige reconsiderações de concepções relativas a patrimônio tratadas sob a perspectiva da pesquisa empírica.

Um exemplo da possibilidade de mudanças de perspectivas ou deslocamentos de pesos no tratamento de questões patrimoniais oferece o Museu de Bucareste no tipo construído de uma casa de alvenaria do século XIX. Salienta-se que a construção corresponde a um tipo de moradias quase que normatizado, fomentado pela política de reforma de direitos de terra do Príncipe Alexandru Ioan Cuza (1820-1870), primeiro soberano da Romênia, surgida da união entre o Moldau e a Valáquia.

Essa política construtiva teve como objetivo a melhoria das condições de vida de camponeses, levando à substituição de cabanas de palha das regiões planas cortadas pelo Danúbio por casas de alvenaria, mais espaçosas. Essa política construtiva modificou a fisionomia do país. Correspondendo à orientação etnográfico-folclórica, o Museu salienta que, apesar dessa modernização e mesmo normatização segundo planos pré-concebidos, elementos tradicionais se conservaram. Esse fato se evidencia na cozinha de construção proveniente da aldeia Goicea Mica, da região Gorj.

Patrimônio arquitetônico e pesquisa familiar e geracional

Um tipo de construção representado no museu, em exemplar proveniente da região de Arges (aldeia Gospodaria Suici), e considerado como característico da arquitetura folk da Lovistea de fins do século XIX e início do XX consiste na união de duas casas em ângulo reto sob o mesmo telhado e destinada a duas gerações.

Essa casa, construída após o casamento do filho mais jovem de um casal, mostra que as duas salas do edifício dirigido perpendicularmente ao pátio da rua, cujas portas abrem-se a uma varanda lateral, elevada de alguns degraus, eram destinadas ao casal mais jovem e para a recepção de hóspedes; as outras duas, no edifício de fundo, também dando abrindo a uma varanda dando para a construção velha, eram usadas como cozinha e quarto para os pais.

Lateralmente, fechando o espaço central, construção destinada para depósito e estábulo. à frente, do lado residencial, uma cruz, do lado do trabalho, depósito de cereais.

Patrimônio arquitetônico e vida comunitária

Um tipo de casa difundido em Hateg e em outras regiões da Transilvânia é aquele de moradia de dois andares, com a cozinha e o celeiro no térreo e, acima, a sala de trabalho e de hóspedes.
Esse tipo de construção, de pedra e madeira, coberta de placas de madeira, exemplificado em casa proveniente de Hunedoara (Gospodaria Clopotiva) substituiu um mais antigo de madeira com um só andar e uma ou duas salas, coberto de palha. No interior, mobília simples, nas paredes, decorações com cerâmicas.

Nas noites de inverno, as moças da aldeia organizavam sessões na sala de trabalho, enquanto teciam, alternando conversas com cantos e terminando com danças.





Círculo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo




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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "Sobre a orientação teórico-cultural na consideração da arquitetura em reflexões patrimoniais Romênia e Brasil". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 134/30 (2011:6). http://www.revista.brasil-europa.eu/134/Bucareste-Museu-Aldeias.html




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