Vacláv Solc. Bispo, A.A..Rev. BRASIL-EUROPA 133/21 (2011:5). Academia Brasil-Europa e ISMPS




Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Fotos A.A.Bispo
©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 133/21 (2011:5)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2011 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2806




A visão do indígena nas transformações político-culturais da Europa Central
- a época socialista da Tchecoslováquia: Vacláv Solc (1919-1995) -
e a recepção de Lewis Henry Morgen (1818-1881) no Marxismo



Ciclo de estudos Boêmia-Brasil da A.B.E..Sobotka, 2011

 

É digno de nota constatar, nos estudos culturais, um surpreendente interesse pelo indígena americano na Europa Central. Esse interesse manifesta-se não apenas sob a perspectiva histórica ao considerar-se população de língua alemã em regiões do antigo império austro-húngaro. Pode ser constatado também ao estudar-se o desenvolvimento histórico sob o enfoque nacional tcheco e o interesse por publicações relacionadas com o indígena em décadas mais recentes da República Tcheca. O estudo dos dois contextos denota relações e, ao mesmo tempo, exige que se dirija a atenção às diferenças de perspectivas.


Um testemunho significativo do interesse pelo indígena na cultura alemã da Europa Central é o O selvagem, de Johann Gottfried Seume (1763-1810), considerado nesta edição. A imagem do indígena divulgada por esse texto originou-se da estadia do autor na América do Norte e é impregnada por concepções relativas ao "bom selvagem" e do retorno à Natureza em crítica à artificialidade da cultura européia. Outros textos que transmitem imagem similar puderam ser encontrados em obras didáticas e de ampla divulgação de meados do século XIX de uso em meios de idioma alemão na Silésia e na Boêmia. Nesses textos, constata-se a frequência de um cotejo entre o colonizador e o indígena ou colonizado, devendo o europeu aprender a reconhecer os valores do indígena.


Sob a perspectiva nacional tcheca, o nome que mais se salienta é naturalmente o do compositor Antonin Dvórak (1841-1904). Durante a sua estadia nos Estados Unidos teve contato com culturas indígenas e considerou elementos dessas culturas na sua obra. Tem-se aqui um singular relacionamento entre o movimento nacional no âmbito do império multinacional dos Habsburgs com o americano. Impulsos nascidos no contexto centro-europeu são aplicados à situação dos Estados Unidos.


Levanta-se a questão da razão pela qual tornou-se possível tal aplicação, uma vez que o movimento centro-europeu relacionava-se com questões políticas e de diferenciação nacional no contexto histórico-cultural do estado plurinacional da Áustria-Hungria. A resposta a essa questão parece residir no paralelo entre uma situação marcada pelo confronto entre grupos culturais oprimidos ou marginalizados e a cultura dominante. Assim como empregou elementos eslavos na sua obra, Dvórak também utilizou-se similarmente de elementos indígenas e africano-americanos. Teria tido a possibilidade de sentir empaticamente a questão, uma vez que êle próprio provinha de meio que nutria anelos de reconhecimento, ainda que a focalizando de um ponto de vista conservador, identificado com a ordem estabelecida. (veja artigo a respeito nesta edição)


O interesse por questões relacionadas com as culturas indígenas em época mais recente da República Tcheca pode ser constatado na vida e obra do etnólogo e americanista Vacláv Solc, cujas obras experimentaram ampla divulgação. Se no passado sobretudo o indígena da América do Norte foi considerado, agora a atenção se dirige às culturas indígenas da América do Sul e Central.



Local de reflexões: Sobotka - cidade natal de Vacláv Solc


O nome desse pesquisador é lembrado em placa comemorativa na sua cidade natal, Sobotka.

Essa pequena cidade, próxima de Jičín (Tschechien) e do "Paraíso Boêmio" (Český Ráj) é conhecida sobretudo pelo castelo de caça Humprecht, de significado histórico e arquitetônico, e pela intensidade que ali se dedica ao estudo e ao cultivo de tradições culturais. A cidade possui casas de madeira em estilo tradicional, consideradas como patrimônio nacional. Ali se realiza o Festival Nacional da Língua e da Literatura Tcheca Šrámkova Sobotka.


A cidade possui origens remotas, tendo-se conhecimento de uma citação documental de 1287. Desenvolveu-se sobretudo no século XVI, e o seu principal monumento é a igreja de Santa Maria Magdalena, construída entre 1590 e 1596. Testemunho da vida cultural da cidade em fins do século XVIII e XIX é um teatro de 1808. Na cidade nasceu o poeta Fráňa Šrámek (1877-1952).


Václav Solc e o interesse pelo indígena das Américas do Sul e Central


Václav Solc foi lembrado em exposição realizada em 2005-2006 no museu nacional tcheco Náprstek, de Praga, dedicado a culturas asiáticas, africanas e americanas. Nessa exposição, foi apresentada a sua coleção de objetos e documentos provenientes do México, Perú, Bolívia e Chile.


Tendo estudado Antropologia na Universidade Laterana, em Roma, Solc esenvolveu o seu trabalho em estreito relacionamento com o Museu Náprstek. Antes de dedicar-se às Américas, obteve experiência de pesquisas na Ásia nos anos cinquenta e sessenta, quando colaborou na instalação de museus na China, na Coréia, no Vietnam e na Mongólia. Realizou a sua primeira viagem ao continente americano em 1963, dirigindo-se à Bolívia, onde dedicou-se ao estudo da cultura Aymara. Encontrando problemas nos meios universitários, passou a dedicar-se aos índios do Titicaca, em particular estudando técnicas de construção de barcos. Nesses seus estudos baseou-se posteriormente Thor Heyerdahl, que realizou tentativas de reconstrução de naves do passado e de navegação, mantendo por toda a vida relações de amizade com Vacláv Solc. Aprendeu a língua indígena, criando um vocabulário da língua Aymara. De 1966 a 1967 viajou ao Chile. Ali estudou a cultura dos indíos Aymarsky e, no sul, dos Mapuches. Retornou várias vezes ao país, sendo testemunho da tomada de posse militar do General Augusto Pinochet (1915-2006). Fugindo do Chile, esteve na Colombia e no Mexico. Visitou mais uma vez o México em 1977.  Ao lado de indígenas sul-americanos dedicou-se também aos índios da América do Norte e aos Esquimós.


Coletou considerável número de documentos, destinados à posterior elaboração de estudos e publicações. Entre os objetos, destacaram-se aqueles de indígenas do lago Titicaca, de bolsas koka, de cerâmica, estatuetas e tecidos hoje pertencentes às coleções do museu Náprstek. Coletou lendas astecas sobre a criação do mundo, além de narrativas dos maias, quechuas e mapuches.


Recepção de concepções de Lewis Henry Morgen (1818-1881) no marxismo


A respeito da situação difícil da vida indígena da realidade dedicou o autor vários textos sensíveis a questões sociais. Ao lado de livros científicos, escreveu romances inspirados em contextos culturais da América Latina. É significativo notar que foi co-tradutor do livro de Lewis Henry Morgan (1818-1881) A Prehistoric Society/Forschung auf den Verlauf des menschlichen Fortschritts aus der Wildheit durch die Barbarei zur Zivilisation, publicada pela Academia de Ciências da Tchecoslováquia (1954). Morgan, com as suas concepções evolucionistas nascidas da constatação do tratamento injusto concedido aos indígenas, exerceu com a sua obra significativa influência no pensamento marxista.


As obras de Solc foram mais divulgadas nos países do Leste, em particular na República Democrática Alemã. Em 1965, publicou "Observaciones preliminares sobre investigaciones arqueolögicas en regiön de las islas, en el lago Titicaca", ( Abhandlungen und Berichte des Staatlichen Museums für Völkerkunde, Dresden 25, Berlin: Akademie-Verlag, 1965). Em 1975, publicou "Informe preliminar sobre los Indios Alacalufes (Isla Wellington, Chile Austral, localidad Puerto Edén" (Abhandlungen und Berichte des Staatlichen Museums für Völkerkunde Dresden, 1975, vol. 34, pp. 395-399). Uma de suas obras mais difundidas foi "Os mais antigos Americanos. O livro sobre Esquimós e Índios", ilustrado, onde trata dos esquimós, além de grupos apache, navaho, asteca, maia e inca (Die ältesten Amerikaner, Das Buch von den Eskimos und Indianern, Praga: Albatros 1988).


Antonio Alexandre Bispo




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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "A visão do indígena nas transformações político-culturais da Europa Central - a época socialista da Tchecoslováquia: Vacláv Solc (1919-1995) - e a recepção de Lewis Henry Morgen (1818-1881) no Marxismo". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 133/21 (2011:5). http://www.revista.brasil-europa.eu/133/Vaclav-Solc.html




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