História das Ciências e Estudos Culturais: Congresso em Portugal, 1934. Revista BRASIL-EUROPA 130/10, Bispo, A.A. (Ed.). Academia Brasil-Europa. Organização de estudos culturais em relações internacionais





Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

A A.B.E. tem como escopo o de relacionar, nos seus trabalhos, estudos culturais em contextos internacionais com estudos da própria ciência (science of science, studies of science). Esse objetivo não significa apenas emprestar particular atenção a questões histórico-culturais ou da história das idéias. Trata-se antes da consideração, sob aspectos interdisciplinares, de estudos das pré-condições de produção,  de processos de difusão de pensamento e de análise  de rêdes sociais do trabalho científico.


Os Studies of science não podem ser compreendidos como apenas uma outra designação para a História das Ciências. Entretanto a consideração histórica é importante também para a condução de exames do vir-a-ser de rêdes do trabalho científico e para a percepção de suas possíveis linhas de continuidade e mesmo de suas vigências no presente. Constatar e analisar tais elos e contextos surgem como pressuposto para procedimentos refletidos nos estudos culturais.


Significado da História das Ciências e suas inserções históricas


Não é de hoje a convicção da importância do estudo das Ciências - também das Naturais - nas suas inserções no desenvolvimento histórico-cultural da Humanidade. Poder-se-ia até mesmo dizer que no reconhecimento do significado da História das Ciências residiu já há muito um princípio que confere aos estudos culturais um papel condutor nas relações entre as várias disciplinas, áreas de conhecimento e campos de pesquisas.


Essa consciência, porém, não liberou aqueles que se dedicavam aos elos entre o desenvolvimento das ciências com a história cultural de suas próprias inserções em determinados contextos, em movimentos, correntes e rêdes político-sociais.


Essa problemática pode ser verificada de modo particularmente expressiva na década de trinta, quando houve não apenas uma intensificação de interesses pela História das Ciências, mas, ao mesmo tempo, um pêso especial dado à questão do modo de ver o mundo ("Weltanschauung") e a concepções políticas.


Para o mundo de língua portuguesa, a consideração dessas inserções da história da História das Ciências em ideários, correntes e rêdes de intelectuais e políticos da época é de particular importância, uma vez que Brasil e Portugal neles estiveram diretamente envolvidos .


Tendo sido essa época de particular significado na institucionalização da área de estudos dedicada ao mundo de língua portuguesa, torna-se uma exigência para todos os trabalhos nessa esfera de conhecimentos de constantemente refletir sobre os condicionamentos de linhas de pesquisa, de modos de pensar e de questionamentos que possivelmente continuem em vigência.


Significativamente, em setembro de 1934, no ano dos 500 anos da passagem do Cabo Bojador, considerado como início da era colonial, e ano marcado pela "Primeira Exposição Colonial" em Portugal (Veja artigos nesta edição), realizou-se, em Portugal, um Congresso Internacional de História das Ciências que se revela como um evento de muito maior projeção e significado do que em geral considerado.


A recepção desse congresso na Alemanha, na imprensa e, em particular em círculos de estudos ibero-americanos, luso-brasileiros e coloniais indicam elos político-ideológicos em situações totalitárias e possibilitam o reconhecimento de rêdes e correntes de pensamento.


Um exame mais atento das vozes da imprensa portuguesa da época, tais como conservados em acervos alemães e nos arquivos da A.B.E., permite uma reconstrução pormenorizada do vir-a-ser, do desenrolar e dos principais resultados do Congresso.


Percebe-se, nesse exame, que seria inadequado considerá-lo apenas a partir da perspectiva historiográfica portuguesa. Por demais estreitos eram os elos internacionais, em particular entre Portugal e a Alemanha, sendo que a consideração desses vínculos representa pré-condição para a análise apropriada do evento.


Academia Internacional de História das Ciências


A instituição que se apresentava como responsável pelos congressos internacionals de História das Ciências, já então na sua terceira edição, era a Academia Internacional de História das Ciências.


Em texto que anunciava a próxima realização dos eventos, os leitores portugueses eram informados a respeito dessa organização e da programação do congresso pelo jornal o Diário de Lisboa, em particular na sua edição de 28 de setembro de 1934.


As finalidades da academia foram elucidados pelo Dr. Arlindo Monteiro, um dos secretários do congresso. A. Monteiro havia sido o representante de Portugal na última reunião do conselho da Academia Internacional de História das Ciências, estando assim perfeitamente informado a respeito de seus objetivos e das razões que levaram à realização do evento no país.


Os objetivos da coletividade científica designada como Academia Internacional de História das Ciências consistiam em organizar e promover em todos os paises os estudos sobre a história das ciências sobre bases científicas rigorosas. A Academia organizava de três em três anos um congresso internacional com a finalidade de reunir historiadores de todos os países, incentivando a permuta de idéias, novas aquisições e trabalhos.


A comissão executiva do congresso encontrara bom acolhimento por parte do Presidente de Portugal, General António O. de Fragoso Carmona (1926-1951), que patrocinava o Congresso. Encontrara também portas abertas junto ao Presidente dos Ministros e dos ministros dos Estrangeiros e da Instrução Pública. Importante foi a colaboação do antigo titular da pasta da Instrução Pública, Alexandre Alberto de Sousa Pinto (1880-1982).


Museu da Natureza, Gotha. Foto A.A.Bispo©


Vozes contrárias à realização do Congresso em Portugal


A abertura solene do III Congresso foi programada para ser levada a efeito num domingo, na Faculdade de Medicina do Porto. Demonstrava-se, assim, a atenção a ser particularmente concedida à história da Medicina no congresso. Representando o ministro da Instrução, a sessão foi presidida pelo Dr. Pereira Salgado, reitor da Universidade. No seu discurso, ofereceu um panorama histórico do progresso das ciências em Portugal, em particular das ciências químicas. A preleção de abertura ficou a cargo de Fernando de Vasconcelos.


George Sarton (1884-1956), da Universidade de Cambridge, ofereceu uma breve análise da vida da Academia Internaciponal de História das Ciências. Aludiu, ainda que de forma velada, a atitude tomada por um membro espanhol da Academia que havia desenvolvido uma grande ação no sentido de evitar que o Congresso se realizasse em Portugal. Essa personalidade havia tido a indiscreção de tornar pública uma carta de foro particular, criando, em país estrangeiro, uma corrente de antipatia para a realização do evento no Porto e em Coimbra. Essa menção, considerada por vários jornais portugueses, chama a atenção para a necessidade de estudos mais diferenciados relativamente às inserções políticas do evento.




Congresso como evento itinerante e papel da Medicina


Para o pesquisador de hoje, o pêso dado à Medicina chama a atenção para o papel relevante desempenhado por médicos nesses anos de estreitamento de elos político-culturais entre a Alemanha e Portugal. (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/124/Johannes_Zschucke.html).


A Câmara Municipal do Porto prontificou-se a oferecer à noite do dia inaugural um banquete aos congressistas. A êle se seguiu um grande festival no recinto da Exposição Colonial. Dessa forma, o III Congresso de História das Ciências apresentava estreitos elos com as preocupações coloniais dessa época e que diziam respeito sobretudo a Portugal e à Alemanha (Veja artigos nesta edição).


No dia seguinte, uma segunda-feira, organizou-se, antes da partida para Coimbra, visitas às caves do vinho do Porto, em Gaia. A Câmara Municipal local ofereceu um lanche em colaboração com o Instituto do Vinho do Porto. Foram recebidos pelo Presidente da Câmara de Gaia, José Fonseca Menéres, e os vereadores Pe. Moreira de Sousa, Rodrigo de Carvalho, assim como pelo administrador do conselho, Joaquim Dias dos Santos. O Dr. Mendes Correia, em nome do Núcleo Portuense da Academia Internacional de História das Ciências, recordou o passado de Gaia, evocando passagens significativas da História portuguesa. Em nome dos estrangeiros, Henri Berre salientou a beleza natural de Portugal e que representava uma verdadeira revelação. No Mosteiro de Gaia, os participantes foram recebidos por Ramiro Mourão, Presidente dos Amigos do Mosteiro. Os visitantes foram acompanhados pelo Capitão Fernando Brandão, representante do chefe do distrito, Jorge Viterbo Ferreira, do Instituto do Vinho do Porto, Antonio Calem, da Associação Comercial e Alvares Ribeiro, do Grêmio dos Exportadores de Vinhos do Porto. Em nome dos congressistas, tomou a palavra Enrique Frederico, pesquisador italiano.


As sessões de trabalho, matutinas e vespertinas, realizaram-se nos dias 2, 3 e 4 de outubro, na Universidade de Coimbra. As noites foram dedicadas às recepções oficiais na Universidade e na Câmara Municipal.


Após os trabalhos das diversas seções, em sessões plenárias, consideraram-ser dois estudos de particular relevância: "A ciência náutica dos portugueses na época das descobertas", pelo Comandante Abel Fontoura da Costa (1869-1940), e "A medicina e os médicos na expansão mundial dos portugueses", pelo Dr. Ricardo Jorge (1858-1939).


Com esses dois temas principais, o Congresso salientava os elos da História das Ciências com a dos Descobrimentos e da Colonização. São justamente esses vínculos que demonstram a exigência de uma reconsideração da história da História das Ciências em Portugal sob o aspecto dos science studies,. Era essa relação que possibilitava a inserção da História das Ciências numa historiografia cultural profundamente marcada por perspectivas de cunho político-cultural de orientação nacionalista. Vinha de encontro, também, às tendências oficiais da Alemanha, na qual a Weltanschauung e o revisionismo colonial procuravam determinar as novas diretrizes de visões historiográficas e do papel da nação no desenvolvimento da Humanidade.


Após o término do Congresso, os visitantes retornaram a Lisboa, no dia 5, procedendo a visitas, pelo caminho, dos mosteiros da Batalha e de Alcobaça. O almoço teve lugar em Caldas da Rainha.


O encerramento do congresso, iniciado no Porto e realizado em Coimbra, foi encerrado em Lisboa, no dia 6. A sessão final foi precedida por uma excursão a Sintra e ao Estoril, onde  o Conselho Nacional de Turismo ofereceu um almoço aos visitantes. Para o encerramento do congresso houve recepção à noite, oferecida pela Câmara Municipal.


Grande número de personalidades foram esperadas para o evento. Os nomes portugueses permitem considerações sobre a diversidade das disciplinas representadas, entre êles Egas Moniz, Ricardo Jorge, Henrique de Vilhena, Pedro Martins, Almeida Garrett, Pires de Lima, Fidelino de Figueiredo, Joaquim de Carvalho, Arlindo Monteiro, Mendes Correia e Pacheco de Amorim, Vice-Almirante Ramos da Costa e Comandante Fontoura da Costa.


Entre os congressistas estrangeiros convidados, as publicações da época salientaram, entre os italianos, Roberto Almagiá e família, Gimno Loria e Aldo Miele, entre os inglêses, H. D. Pledge, R. J. Schaefer, Max Maxerhoff, entre os franceses, Henry Renaud, Abel Rey e Henri Berr, além de Trico-Royer, entre os suíços, Arnold Reymond e Me. de Ceréuvile; entre os espanhós, Joseph Millás Valicrosa, Joaquin Cusi Furtunel, Josefina Cusi, Federico Enriques, Jacques Peyri e Cordoner Planas. A Polonia esteve representada por Guido Vetter. 


A programação do Congresso, com os temas tratados, foi publicada pelo jornal A Voz (30 de setembro de 1934)


Trabalhos nas sessões iniciais


A três de outubro de 1934, o jornal Diário da Manhã anunciou o início dos trabalhos do III Congresso Internacional de História das Ciências. Às 15 horas, na sala "Gomes Teixeira", reuniram-se os membros da Academia Internacional, tendo presidido à sessão o representante dos Estados Unidos, George Sarton. Foi secretariada por Aldo Miele, secretário perpétuo da Academia, e pelo Prof. Fernando Vasconcelos, delegado de Portugal.


O presidente, no início dos trabalhos, referiu-se à denominação da Sala onde se realizava o congresso, lembrando de Gomes Teixeira como matemático e mesmo sábio. A seguir, procedeu à leitura de uma carta do cientista polonês Dickstein, justificando-se não poder estar presente ao congresso.


Após terem tomado a palavra vários congressistas, a assembléia resolveu que o IV° Congresso se realizaria em 1937, em Praga, e o V° em 1940, em Lausanne. Essas decisões foram aceitas por aclamação.


A seguir, realizaram-se as eleições para os cargos de presidente e vice-presidente da Academia. Foram eleitos o Guido Velter, tcheco, Reymond, reitor da Universidade de Lausanne, H. Ligerist, professor de História da Medicina de Baltimore e Dickstein, professor de História das Matemáticas. Como presidente da comissão das prioridades, elegeu-se o delegado português, Prof. Fernando de Vasconcelos. Também traçou-se a história do grupo português aderente ao congresso. O primeiro desses eventos havia sido presidido pelo matemático Gomes Teixeira. O Dr. Alberto Pessoa empenhara-se de modo particular para que o congresso se realizasse em Portugal.


O representante da Catalunha, Policrosa, mencionou que a Espanha iria organizar o grupo espanhol, constituído por Rey Pastor, Palacios e Marañon. A seguir, tomaram a palavra os representantes da Bélgica, da Tcheco-Eslováquia, da Romênia e da França.


Após o término da sessão, às 16.00 horas, os participantes dirigiram-se à Biblioteca Geral da Universidade. Ali abriu-se uma exposição de livros de medicina dos séculos XV e XVI.


Às 22 horas, realizou-se uma sessão solene na Sala dos Capelos. No Paço do Palácio das Escolas da Universidade, foi oferecido um chá pelo Reitor da Universidade, Dr. João Duarte de Oliveira. Seguiu-se um baile.


No dia seguinte, mais congressistas chegaram pela manhã. O programa, que iniciou-se às 10 horas, contou com uma apresentação de trabalhos das seções de História da Medicina. A seguir, houve uma reunião da Comissão para o Corpus medicorum arabicorum. Às 14.00 horas, os trabalhos foram reabertos com uma conferência do Dr. Ricardo Jorge sobre a Medicina e os médicos na expansão mundial dos portugueses. Segundo o divulgado em jornais, Ricardo Jorge apresentou as seguintes conclusões de seus estudos:


"Nas expedições oceânicas tomavam parte médicos que tinham conhecimentos cosmológicos e astronômicos.

Em seguida aos descobrimentos, povos, até então isolados e independentes, entraram em contacto uns com os outros, o que provocou a permuta de doenças entre a velha Europa e os novos mundos, instaurando outro regime geográfico para as patodemias. O relatório diz respeito particularmente à função desempenhada pelos médicos portugueses nas paragnes longínquas e qual a sua atitude científica e profissional em face de: 1° Os pontos medicamentosos encontrados nos países explorados; 2° As doenças novas, desconhecidas naquela época e características da patologia tropical. Numa palavra, o lugar que Portugal tomou na história da medicina exótica.

O descobrimento do caminho para a Índia teve como fim imediato os lucros - colher do tráfico das drogas orientais, na sua maior parte sem valor intrinseco real, mas tornadas preciosas, graças ao uso desenfreado das especiarias e condimentos e à crença ilusória nas virtudes curativas de tantas coisas simples. Os portugueses inundaram a Europa desses produtos vendidos a bom preço.

A êles se deve a divulgação das substâncias úteis para o consumo alimentar, como o açúcar e a introdução de diversos frutos exóticos. Diversos medicamentos eficazes, provindos da Ásia e da America enriqueceram a matéria medicinal.

A Amotus Lusitanus e a Garcia da Horta cabem a honra da descrição e do estudo das drogas orientais, criando uma novaa farmacognosis.

Clínicos e epidermologistas registaram entidades novas, encontradas nas Índias orientais e ocidentais, enquadrando-as na patologia tropical."


Às 22 horas, houve recepção na Câmara Municipal.


Sessões de 3 de outubro. Quetões de Higiene e legislação sanitária


A 4 de outubro de de 1934, o Diário de Notícias comentou as sessões apresentadas no dia anterior.


As sessões de História da Medicina tiveram lugar na Sala "Marneco e Sousa". Foram presididas por Guido Zetter, secretariada por Pacheco de Amorim e Joaquim de Carvalho. Primeiramente, tomou a palavra o Dr. Alberto Pessoa, que dissertou sobre o tema "Emblemas e figurações da medicina na Universidade de Coimbra". Com fotografias de sêlos e emblemas, considerou-as sob diversos aspectos. Entre essas. comentou a fotografia de um emblema que se supunha ser do escultor francês Claud de La Prade. A seguir, a pesquisadora alemã Metzger apresentou o seu trabalho sobre o Segundo Centenário da morte de George Hernat Spahl, pensador, médico e químico. Frederico Henriques pediu à conferencista que elucidasse a posição desse intelectual perante o Aristotelismo ou do neo-platonismo. Indagou se não haveria um fundo de romantismo nas suas concepções, comum na ciência alemã.


A seguir, o Dr. Rocha Brito, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, apresentou a sua comunicação sobre epidemias do século XVI e as Câmaras de Coimbra. As vereações municipais de Coimbra haviam inteligentemente tomado providências que impediram a entrada das epidemias na cidade. Analisou as epidemias ocorridas de 1503 a 1899, apresentando vários gráficos para demonstrar o modo como as vereações de Coimbra procuravam opor uma barreira à entrada da pesta. Citou Braz Mascarenhas, o Dr. Sebstião da Costa, a quem se devem os primeiros cuidados no sentido de se fazerem cumprir as deliberações camerarias. Afirmou que já no século XVI existia em Coimbra uma casa de saúde junto à capela de São Sebastião e outras duas para convalescentes defronte à capela do Loreto.


O Dr. Fernando Correia chamou a atenção dos presentes para a comunicação que acabavam de ouvir e para a riqueza do Arquivo Camarario, onde o Dr. Rocha Brito colhera a maior parte dos elementos do seu trabalho. Leu, a seguir, a sua comunicação intitulada Portugal na História da Higiene. Afirmou que em Portugal os problemas da Higiene foram sempre estudados com os outros capítulos da medicina desde o princípio da nacionalidade no século XII. Salientou a existência de livros que documentam a cultura higiênica dos médicos portugueses. Fêz uma resenha dos principais disposições da legislação sanitária, começando pelos primitivos forais, falando dos diplomas medievais de defesa contra epidemias, até terminar nas leis e regulamentos da autoria de Ricardo Jorge, a quem considerou o mais notável higienista de todos os tempos. Para terminar a sessão da manhã, o Dr. Luiz Pina apresentou uma comunicação sobre a Flora médica de Timor no século XVIII.


Após a conferência do Dr. Ricardo Jorge, pelas 15.30 horas deu-se continuidade à reunião da seção de História da Medicina sob a presidencia do Prof. George Sartou, secretariada pelo Dr. Rocha Brito e Arlindo Monteiro. Foram apresentadas, entre outras, as comunicações: Da influência portuguesa no Japão, algumas passagens do professor de Guilherme Duval, da Faculdade de Medicina de Paris 1612-1646, pelo Dr. Arlindo Monteiro; História das doutrinas humorais e constitucionalistas em Portugal, pelo Dr. Luis de Pina; História da farmacologia entre os muçulmanos espanhois, por Max Meyerhoss, do Cairo; A introdução das drogas vegetais americanas na matéria médica dos árabes, por H. Renault, de Raba; Os colóquios de Garcia de Orta com Platau em Antuerpia, por Tricot-Royer e Sobre algumas tendências dos matemáticos contemporâneos, por F. Sergescu.


O Instituto Português de Arqueologia, História e Etnografia, de Lisboa, foi representado pelo Dr. João Martins da Silva Marques, conservador da Torre do Tompo e prof. do Curso Superior de Bibliotecário-Arquivista. Silva Marques apresentou uma tese sobre a história da paleografia em Portugal.


Sessões de 4 de outubro - participação do Brasil - homenagem a Rondon


O jornal O Século, de 5 de outubro, publicou um comentário sobre o último dia do congresso. As sessões começaram, em duas salas diferentes, ao redor das 10 horas da manhã. A primeira foi presidida por Guido Velter, contendo comunicações do Almirante Ramos da Costa sobre Alguns dados para a História da Oceanografia em Portugal"; Giovanni Constanzo discursou sôbre a cronologia da máquina magneto-elétrica; Millas Vallicrosa sôbre Um almanaque português do começo do século XVI, e o Dr. Fidelino de Figueiredo apresentou o estudo Para a história da crítica literária em Portugal".


Nesse trabalho. Fidelino de Figueiredo chegou à seguintes conclusões: a vasta rêde de colaboração estrangeira do congresso contribuia para regular o ensino da história; seria desejável que essa mesma vasta rêde contribuisse para restaurar uma verdade que só pode existir num ambiente de liberdade de crítica.


O Dr. J. Martins Marques, delegado do Instituto Português de História e Arqueologia, ocupou-se da história da palegrafia em Portugal, mostrando o significado do assunto com base em trabalhos paleográficos dos séculos XIII a XV. Salientou a importância diplomático-paleográfica e histórica dos trabalhos da Leitura Nova, quer na Torre do Tombo, quer nos conventos. O Almirante Fontoura da Costa apresentou trabalho sobre o almanaque de Abraham Zacuta.


Do Brasil, o Tenente-Coronel do Exército Francisco Jaguaribe de Mattos, geógrafo e cartógrafo, apresentou uma comunicação sobre as idéias sôbre a fisiografia do continente sul-americano no tempo das descobertas no século XVIII e nos nossos dias. Esse trabalho, divulgado com o título, em francês, Les idées sur la physiographie sud-americaine, guardava há anos para poder apresentá-lo em Portugal. 


Jaguaribe de Mattos traçou um panorama de como ficou conhecido na cartografia o continente sul-americano e mostrou como se foram anulando, pelos estudos de cientistas portugueses e brasileiros, as diversas suposições errôneas a respeito da configuração do território. Considerando várias cartas antigas e portulanos com vagas indicações, mostrou que o continente não seria mais do que uma reunião de ilhas fluviais, sobretudo no Brasil, e que todas as grandes bacias hidrográficas da América do Sul se comunicavam à superfície da terra. Deu conhecimento da existência de um meridiano líquido natural, traçado desde a bôca de Essequilo, no mar das Antilhas, até a bôca do rio da Prata, e propôs que esse meridiano fosse denominado de meridiano Rondon, em homenagem ao general brasileiro que descobriu as principais ligações entre a bacia do Prata e do Paraguai.


No fim da comunicação, o Prof. Dr. Rocha Brito, em nome de Coimbra, agradeceu a atenção de ter sido guardada para Portugal a comunicação das primícias daqueles importantes descobrimentos da ciência.


Antes de encerrar a sessão, Guido Velter, prsidente da Academia, apresentou a sua comunicação sôbre as relações matemáticas entre a Bohemia e a Península Ibéria, a América Latina e o Extremo Oriente.


A questão da unidade da ciência e do ensino da História das Ciências


Em outra sessão, presidida peor Georges Sartou, o Sr. Perna, delegado da Itália, apresentou a questão da unidade da ciência e o problema da história das ciências. Fizeram uso da palavra, com pareceres, Frederico Henriques, Georges Sartou, Joaquim de Carvalho, Arnold Reymond, Helena Metzger e Henry Berr. A seguir, levantou a questão da organização do ensino das ciências na Itália. Sobre o assunto falaram A. Raymond, de Lausanne, Georges Sartou e Henry Berr. Entretanto, os diferentes pareceres não levaram a um acordo. Por fim, Arnold Reymond apresentou a sua comunicação e algumas reflexões sobre o ensino da História das Ciências.


Às 15 horas, na sala dos Capelos, realizou-se a sessão plenária, presidida pelo Dr. Pereira Salgado, reitor da Universidade do Porto, Abrindo a sessão, referiu-se ao Almirante Fonteira da Costa, de quem traçou o perfil intelectual. Este, iniciou a sua conferência de título A ciência náutica dos portugueses, na época das descobertas descrevendo a evolução dos conhecimentos marítimos desde a época dos descobrimentos até o século XX. Terminou reivindicando para os portugueses a glória de terem utilizado, na navegação, formas teóricas e práticas que os estrangeiros apenas mais tarde desenvolveram.  Após o congresso, os congressistas seguiram para o Buçaco, onde foi-lhes oferecido um chá de honra.


Em intervalo dos trabalhos, os congressistas visitaram o Museu Machado de Castro, onde deu-se a a cerimônia da inauguração da nova sala manuelina. Foram esperados pelo diretor, Dr. Vergilio Correia, que os acompanhou na visita, onde se encontram alguns preciosos trabalhos de escultura, entre os quais um padrão comemorativo da construção da ponte de Coimbra, por D. Manuel, um crucifixo de cinzeiro do século XVI, uma janela de canto e outros objetos. O diretor da sala prelecionou sobre o assunto, justificando a intenção que presidiu à ordenação dos trabalhos.    


Da contribuição alemã ao Congresso, destacou-se a comunicação de Karl Südhoff, Leipzig, dedicada ao tema "O grande erudito Pedro o Português de Lisboa - 1577 Papa João XXI".






Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:

Bispo, A.A.."Da História das Ciências como objeto de estudos culturais e dos Science Studies. Revendo o III Congresso da Academia Internacional de História das Ciências em Portugal (1934) e a participação do Brasil: Francisco Jaguaribe Gomes de Mattos". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 130/10 (2011:2). http://www.revista.brasil-europa.eu/130/Congresso_Historia_das_Ciencias.html


  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização Brasil-Europa, visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens relativos à Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência (culturologia e sociologia da ciência), a seus institutos integrados de pesquisa e aos Centros de Estudos Culturais Brasil-Europa: http://www.brasil-europa.eu


  2. Brasil-Europa é organização exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. Não tem, expressamente, finalidades jornalísticas ou literárias e não considera nos seus textos dados divulgados por agências de notícias e emissoras. É, na sua orientação culturológica, a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro e originada de iniciativa brasileira. Foi registrada em 1968, sendo continuamente atualizada. A A.B.E. insere-se em antiga tradição que remonta ao século XIX.


  3. Não deve ser confundida com outras instituições, publicações, iniciativas de fundações, academias de letras ou outras páginas da Internet que passaram a empregar designações similares.





 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 130/10 (2011:2)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização Brasil-Europa de estudos teóricos de processos inter- e transculturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
de Ciência da Cultura e da Ciência

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2010 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2724




Da História das Ciências como objeto de estudos culturais e dos Science Studies

Revendo o III Congresso da Academia Internacional de História das Ciências em Portugal (1934)
e a participação do Brasil: Francisco Jaguaribe Gomes de Mattos


Ciclo África-Portugal-Alemanha-Brasil. 10 anos da sessão de História das Ciências sob a perspectiva da science of science do simpósio internacional Dimensões Européias de Portugal. A.B.E./Universidade de Colonia. Museu da Natureza, Gotha 2010

 

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