Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 122/17 (2009:6)
Editor: Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Direção administrativa: Dr. H. Hülskath

Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Academia Brasil-Europa
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2009 by ISMPS e.V. Edição reconfigurada © 2014 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2514


 


Viagens, desenvolvimento naval e emigração no período guilhermino
Albert Ballin (1857-1918)

Reflexões em Potsdam, 2009, a partir de releituras das recordações de vida da filha de Guilherme II, Duquesa Viktoria Luise (1892-1980)

 



Hamburg. Foto A.A.Bispo 2009. Copyright

Este texto apresenta uma súmula de estudos motivados pelos 150 anos de Guilherme II (1859-1941). Sem objetivos políticos ou de engrandecimento da personalidade do último imperador da Alemanha, os trabalhos justificaram-se pela importância da época guilhermina para o Brasil, sobretudo sob o aspecto das regiões coloniais. Nesse sentido, inscreveram-se no programa da Academia Brasil-Europa dedicado a estudos do mundo de língua alemã e mundo de língua portuguesa.


A orientação teórico-cultural insere-se na tradição da sociedade dedicada à renovação dos estudos culturais (Nova Difusão 1968), a atual Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais - Academia Brasil-Europa.








Detalhes do Rathaus de Hamburgo
Trabalhos da Academia Brasil-Europa
Fotos A.A. Bispo 2008

 
Nos estudos históricos-culturais em contextos internacionais que focalizam o período guilhermino, uma particular atenção merece ser dirigida à crescente mobilidade que se manifestou, na época, em frequentes viagens de personalidades da política, da cultura e das artes, assim como no desenvolvimento dos meios de transporte, com as suas múltiplas consequências e implicações.

Para os estudos euro-brasileiros, especial interesse adquirem aspectos relativos às mudanças ocorridas na emigração européia.

Viagens, representação e relações exteriores

Guilherme II, pela freqüência de suas viagens no interior da Alemanha e ao Exterior, chegou a ser designado - não sem uma certa ironia - de "imperador de viagens".

As recordações de sua filha, Viktoria Luise, testemunham esse fato, salientando as constantes viagens ás várias regiões e cidades da Alemanha, entre elas para presenciar manobras e paradas militares, as viagens de recreio destinadas à recuperação de forças, principalmente pelos países nórdicos e a Corfu, assim como as viagens oficiais a vários países europeus. (Herzogin Viktoria Luise, Ein Leben als Tochter des Kaisers, 12. ed., Göttingen-Hannover: Göttinger Verlagsanstalt, 1973)

Lembra, para explicar esse contínuo viajar, que o deslocamento pessoal de membros de famílias reinantes representava uma necessidade na época. O que na atualidade cumpre sobretudo a ministros de relações exteriores, numa época em que grande parte dos países ainda possuía forma de govêrno monárquica a êles em grande parte cabia: o desempenho de tarefas diplomáticas, de realizações de contatos e de aproximação pessoal. Devido às características da rêde social então dominante, caracterizada pelo entrelaçamento familiar, o cumprimento dessas tarefas vinculava-se estreitamente ao cultivo de elos determinados pelo parentesco.

O Brasil também conheceu essa necessidade, manifestada nas muitas viagens de Pedro II, também aqui muitas vezes mal compreendidas.

Ainda hoje reconhece-se o significado do contato pessoal, da troca direta de idéias. Numa época marcada por interesses internacionais, sobretudo também coloniais, já não bastava o estudo de documentos e informações escritas, ou seja, o trabalho de gabinete. Os críticos das muitas viagens do imperador alemão não teriam considerado adequadamente essa necessidade da época.

Muitas das viagens no país, longe de serem de divertimento, eram em geral fatigantes, com manobras militares e paradas. Guilherme II as assistia talvez com mais frequência e intensidade do que chefes de Estado de outras nações. Dava, assim, continuidade a uma tradição prussiana, entendendo a realização desses deslocamentos como exigência do dever. Procurava honrar com a sua presença oficiais e divisões.

Essa participação intensa do imperador nas manobras militares eram sentidas como incentivadoras, assim como as suas palavras de encorajamento a uma concorrência em camaradagem. Com a participação nessas manobras, a família imperial encontrava-se em constantes viagens, visitando diferentes regiões do país.

Desenvolvimento naval

A intensificação da construção naval na Alemanha, com o desenvolvimento da marinha, foi uma das principais características do período guilhermino. O interesse de Guilherme II pela navegação, e em particular o seu intento de criar uma frota poderosa, parece ter tido as suas origens nos seus elos com a Grã-Bretanha e na sua admiração pelo país da rainha Vitória. Residiria na poderosa concorrência assim criada um dos principais motivos de tensões e conflitos com o império britânico.

O desenvolvimento da marinha alemã na época tem sido considerado sobretudo sob a perspectiva de seu poderio militar, considerando-se o papel por ela desempenhado na Primeira Guerra. Ns estudos culturais, cumpre emprestar atenção também e sobretudo ao desenvolvimento da marinha civil.

Significado de Albert Ballin

A personalidade mais destacada da história do desenvolvimento naval alemão foi Albert Ballin, Diretor Geral da Linha Hamburgo-América. Pertenceu àqueles que se encontravam mais próximos de Guilherme II, tendo a êle acesso direto. Era admirado pelo imperador pela sua contribuição ao aumento do renome da Alemanha no Exterior, levando a bandeira do país a todo o mundo. Tornou-se um conselheiro em questões não apenas relativas a assuntos náuticos, mas também àquelas referentes à economia em geral, ao empresariado e às relações exteriores. A sua influência na política externa da época não pode ser menosprezada, fato que se manifesta no papel que a êle foi confiado nos últimos anos da Guerra.

Arquivo ABE
Antes da Primeira Guerra, Ballin tentou impedir a corrida armamentária e procurou mediar entre a Alemanha e a Inglaterra através de Guilherme II e do banqueiro Ernest Cassel (1852-1921). Durante a Guerra, tentou impedir que os Estados Unidos entrassem na Guerra e que Guilherme II se decidisse pela guerra de submarinos sem limites. No final da Guerra, círculos de liderança do exército alemão a êle se voltaram pedindo que dirigisse conversações de paz com a Inglaterra. Estava tão intimamente vinculado com o império alemão que, com o seu fim, e com a destruição de sua obra de vida, cometeu suicídio, transformando-se em figura trágica na história das primeiras décadas do século XX.

Segundo as recordações da Duquesa Viktoria Luise, os estreitos elos de Guilherme II com Albert Ballin não eram bem vistos por alguns, devido ao fato de ser judeu, denominado depreciativamente de "Armador do Imperador" ou de  "Judeu da Côrte Oceânica do Imperador". A sua residência, a Villa Ballin, construída em 1908, abriga desde 1982 um instituto da UNESCO dedicado á continua aprendizagem.

Desenvolvimento do transporte de emigrantes e viagens de turismo

Em meados da década de oitenta, duas linhas faziam concorrência no transporte de emigrantes, a Union-Linie e a Hamburg-Amerika-Linie HAPAG. Quando esta companhia assumiu a Carr-Linie, Albert Ballin tornou-se chefe do departamento de passagens. No ano seguinte, instituiu o serviço rápido entre Hamburgo e Nova Iorque. Em 1888, passou a ser membro da diretoria da HAPAG. A partir de 1891, para melhor utilizar os navios na estação de inverno, passou a organizar cruzeiros marítimos, inicialmente no Mediterrâneo. Em 1899, tornou-se Diretor Geral da HAPAG. Nessa qualidade, esteve à testa da construção dos maiores e mais rápidos navios do mundo, entre êles as naves Deutschland (1900), Kaiserin Auguste Viktoria (1906) e Imperator (1912).

A. Ballin em apreciação da época

O grau da admiração que gozou Ballin na Alemanha no período de apogeu de suas atividades pode ser avaliado por matéria publicada em 1906, em anuário largamente difundido:

"Men, who have risen - chamam os americanos pessoas que subiram na vida. Uma dessas fenomenais energias e inteligências é o homem que hoje se encontra no cimo da Hamburg-Amerika-Linie. É uma velha experiência que o destino sempre encontra o homem certo para o lugar certo no momento certo. Em Albert Ballin, a Amerika-Linie conseguiu um talento de organização de primeiríssimo nível, e justamente no momento no qual ela própria se encontrava em um estádio do desenvolvimento que exigia de seu diretor a máxima atenção e força de vontade.

Foi no ano de 1883, quando se uniram a antiga armadora de Hamburg Sloman e a refundada Armadora de vapores de Edw. Care para formarem a linha de vapores Union, fazendo sensível concorrência à Hamburg-Amerika-Linie no serviço dos emigrantes e de carga.  Especialmente o agente de passagens da Linha Union, Albert Ballin, mostrou-se, apesar da sua juventude, como sendo um contraente perigoso. Chegou-se à paz entre ambas as partes, que se unificaram numa comunidade empresarial para o negócio de passageiros sob a direção da Amerika-Linie. Ballin entrou para o serviço dessa Linha, para a qual desde então iniciou-se uma era de ascensão. A partir desse momento até 1905, o capital de ações subiu de 15 a 100 milhões; o curso das ações subiu de 74 %. a 170, as obrigações de 6 a 38, as reservas de 3 a 24 milhões, o lucro de dois a 28 milhões, a frota de 65000 a 796269 toneladas de registro à 2,83 cbm.

Albert Ballin é mais do que um grande negociante; nele há algo com que de regente. Ele possui uma amplidão de visão, uma força de conjectura, uma capacidade de prever desenvolvimentos e necessidades, de deixar por assim dizer que épocas se manifestem na sua fantasia, que o colocam na série dos gênios de Estado, pois também a sua atividade maior reside em nada mais do que de presentir profeticamente constelações vindouras e de preparar o caminho às coisas e o seu vir-a-ser com a força do titão e de as obrigar nesses trilhos. Uma outra capacidade de regente desse espírito é de encontrar inteligências a êle homogêneas e prendê-las a si. Ballin criou na Direção e no Conselho de Cotrôle um ministério em condições de seguir os seus planos de desenvolvimento e de compreendê-lo. Forças tais como o famoso filho de armador Karl Laeisz, que pertence ao Conselho da sociedade, trabalham com Ballin de mão em mão.

No ano de 1887, seguindo o exemplo inglês, Ballin introduziu o serviço de vapores rápidos, superou porém os modêlos britânicos pelo tamanho e magnificência dos novos navios. Os primeiros vapores rápidos postos em serviço, em 1889, foram o Columbia e Auguste Victoria. Em 1891, introduziu-se o serviço semanal de vapores rápidos. O Fürst Bismarck, terminado em 1891, conquistou a "fita azul do Oceano" o renome do mais rápido navio do mundo com uma viagem Hamburg-New York em 6 dias, 11 horas e 44 minutos. Essa vitória da sociedade de Hamburgo foi ao mesmo tempo um grande triunfo da indústria naval alemã. Até então, todos os vapores rápidos tinham sido construídos na Inglaterra. O príncipe Wilhelm, o atual imperador, entregou um parecer a Bismarck, segundo o qual com base em detalhados estudos a construção de navios não deveria ser mais entregue a armações inglesas, mas sim alemãs. Bismarck dirigiu-se com essa idéia à Amerika-Linie, que apesar de grandes reservas, construiu em Stettin a Auguste Viktoria e o Fürst Bismarck. Essas encomendas foram grandes provas para a construção naval alemã e agiram de tal forma educativa que hoje ela se encontra em todo o mundo em posição inalcançada.


Visita da personalidades a bordo da nava "Princesa Viktoria Luise", 1906.
General-diretor da Linha Hamburgo-America designado com o número 3
 
Para melhor proteger o enorme capital que se encontra nos vapores rápidos, Ballin criou para a época de inverno, mais tranquila, uma linha turística ao Oriente, empreendimento visto como ousado por alguns armadores, mas que deu razão a seu criador. Iniciaram-se, então, as viagens pelos países nórdicos até o Cabo do Norte no verão, e no inverno viagens ao Caribe. Em 1892/93, inaugurou-se uma linha de invernos entre New York e Gênova. Não é possível, em espaço curto, seguir o desenvolvimento orgânico dessa empresa gigantesca. Queremos apenas bater na tecla daa enorme capacidade de visão de Ballin, e que é de importância para a grande comunidade do povo alemão.

Alguns dos vapores rápidos foram vendidos à Espanha, e, em substituição ao vapor rápido Deutschland, foi construído na companhia Vulkan de Stettin um navio com 16500 toneladas, 37800 cavalos a vapor, com espaço para 800 leitos, 300 passageiros de entrepontes e 552 marinheiros. O navio ganhou a Fita Azul por um recorde de 5 dias e 7 horas e 38 minutos no trajeto Hamburgo-New York. Agora, chegou-se a um novo tipo, a classe Celtic. Os dois novos navios terão 1100 leitos e 2300 passageiros de entrepontes, além de 15000 ou 16000 toneladas de carga. A Kaiserin Auguste Vittoria tem 700 pés de comprimento, 77 de largura e 54 de profundidade; a Amerika tem 690 pés de comprimento, 74 de largura e 53 de profundidade. A velocidade desses navios é de 18 milhas marítimas por hora; para isso precisam de 15800 e 17200 cavalos a vapor, substancialmente menos do que o tipo mais antigo do Deutschland. Assim, a manutenção é mais barata.

A bordo, pode-se comer à la carte, lá se encontra a cozinha de Hamburgo, a de restaurantes inglêses e a de Paris, três cobertas de passeio, uma sobre a outra, elevadores, lojas de flores e de livros, um balcão de informações, bibliotecas, escritórios com estenografistas e máquinas de escrever, salas de ginástica, balneários e banhos de sol. Estamos acostumos a lamentar as dimensões da frota alemã em comparação com as de outras potências, esquecemos porém de considerar que a frota comercial alemã serve muito bem para serviços auxiliares e de transporte na guerra.

A Amerika-Linie deu um passo a mais e mandou construir o vapor Deutschland, o seu mais rápido navio, de acordo com necessidades do serviço da marinha imperial em forma de cruzador auxiliar, pronto a todo o momento para ser armamentado. Isso foi feito sem retribuições por parte do Império. O vapor costeiro Hansa da Amerika-Linie pode transformar-se dentro de uma hora em navio lazareto. Em 1905, instalou-se em Kiel o vapor Borussia, especial para o transporte de tropas. Os transportes à China, em 1900, representaram uma obra mestra da Linha. Pontualmente foram expedidos milhares de soldados alemães e tudo o necessário para uma divisão de exército.

A famosa viagem Roschdjestwenskis a Madagaskar e Tschisima não teria sido possível sem uma armada de navios de carvão da Amerika-Linie. Um empreendimento brilhante da Amerika-Linie foi a expedição de ajuda do Phönizia enviada em janeiro de 1904 à cidade portuária de Aalesund. Segundo o desejo do imperador alemão, o vapor foi colocado à disposição em poucas noite e horas de domingo. 12 horas após a chegada da ordem, o navio já largava ao mar, equipado para semanas, pronto para oferecer teto e alimentação aos desabrigados. Nenhum dos navios da Linha tem uma vida média maior do que 7 1/2 anos. Para o funcionamento da Linha há instalações portuárias, alugadas da cidade de Hamburgo por 1 1/3 milhões anuais. A Linha ocupa ca. de 20000 pessoas, dispõe de 10000 marinheiros preparados, que representam um excelente material na guerra. O imperador Wilhelm manifestou o seu interesse por esse empreendimento gigantesco, fazendo nomear o seu adjudante, Capitão de Mar v. Grumme, a diretor-técnico da Amerika-Linie. A sua alma porém, e o seu motor, o Diretor-Geral Ballin, foi honrado pelo imperador com a ordem da Coroa de segunda classe e através de sua amizade. O Diretor-Geral, que apesar desse brilho é simples, amigável e simpático, foi designado pelo imperador Guilherme a bordo da Prinzessin Viktorial Luise como um 'Hanseata ousado e empreendedor, que faz para nós conquistas pacíficas, cujos frutos no futuro serão colhidos pelos nossos netos.'  (...)" (Hans Land, Generaldirektor Albert Ballin, in: Weltrundschau zu Reclams Universum 11.-17 Março de 1906)


Semana de Kiel. Guilherme II a bordo do yacht Meteor, 1906
 

Criação de rêde internacional. Relações com o Caribe

Como esse texto da época salienta, a Hamburg-Amerika-Linie contribuiu de forma relevante para o desenvolvimento comercial alemão com os países extra-europeus. Conquistou uma posição saliente na concorrência internacional. Ballin instituiu novos referenciais de segurança, de rapidez e de regularidade dos serviços. De Hamburgo estabeleceram-se ligações diretas com portos de todo o mundo, chegando a companhia a manter 55 linhas.  O serviço norteamericano possuiu 11 linhas. Toda a semana saia um vapor rápido e um navio mixto de carga e de passageiros a New York. Essas viagens também tinham significado para a a Inglaterra e a França, pois os navios faziam escalas em portos dos dois países. A sociedade mantinha linhas de carga de Stettin a Nova Iorque, a partir de Hamburgo ao Canadá e a cidades dos Estados Unidos. Havia também uma ligação de Gênua a Nova Iorque.

O serviço Índias Ocidentais-México e Atlas era feito por 20 linhas. Particular atenção merece o desenvolvimento dos serviços no Caribe. Em 1903, das linhas para as Índias Ocidentais se separaram 3 linhas mexicanas, a elas se acrescentando outra, em 1904. Para isso, o serviço de vapores de passageiros luxuriosos da "classe principesca" foi ampliado com navios ainda maiores. O Fürst Bismarck foi colocado nessa linha do México. O porto central das linhas das Índias Ocidentais era St. Thomas. A partir de 1905, criou-se uma linha inter-colonial para a ligação com portos menores. A partir de 1905, os navios da Companhia das Índias Orientais Dinamarquesa, que servia as colonias desse país no Caribe, passaram a agir em comunhão com a Hamburg-Amerika-Linie. Procurava-se desenvolver também o tráfego entre o Caribe e Nova Iorque.

"Zwischendecks" e emigração

Albert Ballin salientou-se pelo desenvolvimento dos navios transatlânticos, que transformaram-se já na época em verdadeiros palácios flutuantes, promovendo cruzeiros e outras viagens de turismo. Uma das inovações de Albert Ballin foi o da criação de andares intermediários em navios de passageiros com a finalidade de transportar emigrantes de forma ao mesmo tempo econômica e mais confortável. A contribuição de Ballin para o aumento do bem-estar dos emigrantes e das condições gerais de higiene e de alimentação foi relevante, contribuindo assim para modificar a imagem da emigração e dos próprios emigrantes.

Esse melhoramento das condições de viagem dos emigrantes, que representava uma integração do princípio do transporte de massas às viagens transatlânticas, teve repercussão financeira no empreendimento naval no seu todo. Esse fato foi salientado pelo próprio Ballin, que chegou a afirmar que, sem os passageiros dos andares intermediários, ou seja, sem os emigrantes, a sua empresa estaria falida em poucas semanas.

Para melhorar a acomodação de emigrantes a serem transportados pela HAPAG, Albert Ballin construiu edifícios de emigração (Auswandererhallen) em grande área fora de Hamburgo. Essas instalações, constituindo uma pequena cidade (desde 2007 Museu BallinStadt), compreendiam 30 construções com pavilhões dormitórios, salas de presença, refeitórios, banheiros, salas de médicos e até mesmo uma igreja, uma sinagoga e um coreto para concertos. Com a melhoria das condições de saúde dos emigrantes, passou-se a evitar situações desagradáveis nas alfândegas dos países de imigração, com o consequente retorno dos rejeitados. A estadia e a alimentação estavam incluídas no preço da passagem.


Vista da armação dos irmãos Becker, Porto Alegre.
H. Schüler, Brasilien: Ein Land der Zukunft, 3a. ed., Stuttgart e Leipzig:
Deutsche Verlags-Anstalt 1912, 469

 
Linhas para o Brasil

Em 1900, a Linha Hamburgo-América inaugurou a linha ao rio Amazonas. Comprou, nesse ano, as linhas para o Brasil e o Prata. Organizou, conjuntamente com a Sociedade Hamburgo-Sulamericana de Vapores (Hamburg-Südamerikanische Dampfschiffahrtsgesellschaft) novo tráfego nas principais linhas ao Norte do Brasil, do Brasil-Leste e do Sul do Brasil, assim como ao Prata. Comprou uma linha inglesa que partia de Antuérpia ao Prata e integrou no serviço alemão as expedições de Antuérpia. As duas sociedade criaram uma linha costeira na Patagônia, sob bandeira argentina.

Em 1904, instalou-se uma firma de navegação costeira no Brasil. Essa, a Sociedade de Navegação Costeira Cruzeiro do Sul, tinha a sua sede em Santos. As suas rotas iam do Rio de Janeiro ao Norte e ao Sul, aqui até Buenos Aires. As duas sociedades encontravam-se em primeiro lugar nos transportes de café do Brasil à Europa. Os transportes do Norte do Brasil entraram numa fase de crescimento, intensificando-se não apenas em direção a Hamburgo, mas também nos seus vínculos com o porto belga.

Transportes do Brasil para o Exterior

O tráfego transatlântico do Brasil encontrava-se, na época, em grande parte em mãos de companhias estrangeiras. Uma exceção constituiam as viagens do Lloyd Brasileiro a Nova Iorque. Trafegavam vapores da Inglaterra, da França, dos Países Baixos, da Áustria, da Italia, da Espanha da Bélgica e da Argentina. Grande parte dos transportes, porém, estava entregue aos alemães. Em 1909, nos 54 portos brasileiros, trafegavam 4638 vapores estrangeiros e 10662 nacionais. O aumento do tráfego pode ser deduzido dos dados de 1904, quando registravam-se 3546 navios estrangeiros e 6746 nacionais. Ao mesmo tempo, os navios a vela diminuiram em número nessa época. Em 1904, trafegavam no Brasil 436 estrangeiros e 6706 nacionais, em 1909 378 estrangeiros e 4682 nacionais. Em 1910, a Alemanha participava do tráfego de vápores com 910 navios. A Inglaterra vinha em segundo lugar, porém com muito menor número de naves. (Heinrich Schüler. Brasilien: Ein Land der Zukunft, 3a. ed. Stuttgart e Leipzig: Deutsche Verlags-Anstalt, 468-472)

A Sociedade Hamburgo-Sulamericana de Navegação a Vapor e a Hamburg-Amerika-Linie mantinham conjuntamente o tráfego com o Brasil. Possuíam vapores para carga e passageiros, grandes vapores de passageiros e vapores rápidos, entre eles Cap Arcona, Cap Ortegal, Cap Vilano, Cap Blanco, König Wilhelm II e König Friedrich August. Os navios de passageiros alemães eram renomados pelo seu conforto e luxo, assim como pela amabilidade e cortesia de seus capitães e oficiais, sendo muito procurados. As passagens já se esgotavam meses antes das viagens. (loc.cit.)

Em 1911, construiu-se o maior, mais rápido e mais luxurioso navio que até então trafegara entre Hamburgo e o Rio de Janeiro: o Cap Finisterre, da Hamburg-Südamerikanische Dampfsschiffahrtsgesellschaft. O Norddeutsche Lloyd enviava ao Brasil apenas vapores menores; os maiores e mais luxuriosos serviam a rota de Buenos Aires. Entretanto, também esses vapores menores eram bem requisitados, sobretudo por famílias com crianças.

Recomendava-se, na Alemanha, que os emigrantes viajassem somente com navios alemães. Ali sentir-se-iam em casa e teriam a certeza de encontrar uma boa alimentação e boas acomodações. Tanto quanto possível, possibilitavam-se cabinas a famílias, mulheres e crianças. Faziam a viagem separados de passageiros de outras nacionalidades. O autor de uma publicação em alemão sobre o Brasil da época salientava que tinha constatado frequentemente que passageiros de entrepontes, que subiam a bordo com faces abatidas e pálidas, ganhavam pêso durante a viagem e chegavam ao Brasil com rosto sadio e recuperado. (op.cit. pág. 470)

O aumento do tráfego de vapores, sobretudo alemães, teve influência também na remodelação e ampliação de portos no Brasil,sobretudo daqueles de Santos e do Rio de Janeiro, com a construção de docas, depósitos, equipamentos hidráulicos e outros melhoramentos técnicos. Ao mesmo tempo, procurou-se melhorar as condições sanitárias, de modo que os portos brasileiros já eram, em 1910, os melhores das regiões subtropicais. Em fase de conclusão se encontravam os portos da Bahia, de Pernambuco, do Pará e de Manaus. Os trabalhos na Barra do Rio Grande do Sul estavam em andamento e desenvolviam-se novos projetos, tais como os dos portos em Torres e Itajaí. (loc.cit.)


Parte do novo pôrto do Rio de Janeiro durante a sua construção,
H. Schüler, Brasilien: Ein Land der Zukunft, 3a. ed., Stuttgart e Leipzig: Deutsche Verlags-Anstalt 1912, 471

 

                                                                                   

Síntese de trabalhos apresentados por estudantes em seminários. As discussões terão prosseguimento




  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais - Academia Brasil-Europa (A.B.E.) - e do Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (Institut für Studien der Musikkultur des portugiesischen Sprachraumes, I.S.M.P.S. e.V.), visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens: http://www.brasil-europa.eu


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