Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 117/6 (2009:1)
Editor: Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Direção administrativa: Dr. H. Hülskath

Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Academia Brasil-Europa
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2009 by ISMPS e.V. Edição reconfigurada © 2014 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2413


 


Da „utilidade“ da Filosofia no debate interdisciplinar e intercultural
e a questão da Filosofia Intercultural nos estudos euro-brasileiros


Reflexões em Klausen





Klausen. Foto A.A.Bispo 2008. Copyright
Este texto apresenta uma súmula de reflexões encetadas no ciclo de estudos interdisciplinares pelos 40 anos da Sociedade Nova Difusão - hoje Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais - e 10 anos de abertura do centro de estudos da Academia Brasil-Europa em Colonia, sob o patrocínio da Embaixada do Brasil na Alemanha.


Os estudos desenvolveram-se em excursões e retiros preparados pelos seminários "A aproximação científico-cultural na Musicologia: História, Métodos, Tendências, Projetos"(2005), "Filosofia Intercultural" (2005) e "Música na Teoria da Arte" (2005) da Universidade de Colonia 2005 e A.B.E., sob a direção de A.A.Bispo.


Os trabalhos retomaram questões tratadas em seminários dedicados às relações entre Estética, Ética e Estudos Culturais realizados na Universidade de Bonn (2002-2004). Essas preocupações remontam, na tradição dos estudos euro-brasileiros, à cooperação interdisciplinar das disciplinas Estética e Etnomusicologia introduzidas na Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo, em 1972.







Klausen. Foto A.A.Bispo 2008. Copyright
Nas discussões referentes ao diálogo e à cooperação interdisciplinar - não apenas aquelas no âmbito dos estudos eurobrasileiros conduzidos pela A.B.E. - levanta-se a questão do papel a ser exercido pela Filosofia. Em prosseguimento a seminário dedicado à Filosofia Intercultural e à Interculturalidade na Filosofia na Universidade de Colonia em cooperação com a A.B.E. e o I.S.M.P.S., realizou-se um retiro de estudos em Klausen, centro religioso e de peregrinações da região do Mosela, no distrito de Bernkastel-Wittlich.


Até há poucas décadas, a Filosofia era a disciplina-guia, condutora das Ciências Humanas no sistema universitário de vários países. Estranhamente, a Filosofia encontra-se hoje praticamente ausente de eventos e empreendimentos bi-laterais ou de cooperação internacional.


Como se poderia tratar adequadamente a relação entre esferas da Unidade do Conhecimento e do pensamento com a Diversidade das culturas?


Quais seriam as possibilidades de desenvolvimento de uma Filosofia Intercultural, como concebida por alguns pensadores europeus e discutida em seminários da A.B.E. realizados em cooperação com a Universidade de Colonia?


Uma Filosofia Intercultural, subordinando-se à Ciência da Cultura, não daria a esta o papel condutor na cooperação interdisciplinar?


Não haveria lugar então para a Filosofia na tradição do pensamento e do sistema universitário no trabalho interdisciplinar em contextos internacionais?


Representaria expressão de eurocentrismo considerar a história da Filosofia, as suas correntes e tendências no âmbito de estudos regionais e supra-regionais?


Não haveria „utilidade“ no estudo da Filosofia para estudantes vindos de países não-europeus nas Universidades da Europa?


Não haveria lugar para filósofos em eventos e publicações bi-laterais ou internacionais?


A questão da „utilidade“ das Ciências Humanas, por mais superficial que possa parecer, vem desempenhando um certo papel em círculos administrativos e políticos relacionados com a cultura e as ciências, como o demonstra a assim-chamada Teoria da Compensação (veja texto nessa edição). 


Para o trabalho interdisciplinar, a Filosofia surge como de fundamental relevância, também para os representantes da Teoria da Compensação. Por essa razão, os filósofos possuem um papel significativo em cooperações interdisciplinares.


Eles trazem da sua tradição uma compreensão de séculos pela não consensualidade de posições fundamentais, de convivência com aporias abertas e dissenções. Assim, o problema secular da falta de consenso na Filosofia seria um fator positivo para o presente. O filósofo não é o especialista, e isso contribui para que surja como catalisador.


Klausen. Foto A.A.Bispo 2008. Copyright
Posição especial da Filosofia em texto de Universitas


Um dos textos críticos concernentes a essa teoria partiu do problema da „utilidade das Ciências Humanas" (Minu Hematti e Kai Buchholz, "Vom Nutzen der Geisteswissenschaften", Universitas 53/629, Novembro 1998, 1074-1086).


Os autores, criticando sobretudo o pragmatismo que se encontra à base da teoria da compensação, salientaram as posições singulares ocupadas pela Psicologia e pela Filosofia no edifício universitário, demonstrando a imprecisão da argumentação.


A primeira, a Psicologia, seria tanto Ciência do Espírito quanto Ciência Natural, e a segunda, a Filosofia, nem seria uma Ciência, na verdade, sendo inadequado considerá-la no seio das Ciências Humanas em debates relativos à interdisciplinaridade.


A posição especial que ocupa a Filosofia no contexto das disciplinas da universidade atual não é sempre bem compreendida. Para os autores, a sua verdadeira tarefa não seria de expor afirmativamente conhecimentos científicos, mas sim de examinar proposições de outras disciplinas segundo os seus pressupostos semânticos, argumentativos e práticos.


A Filosofia não possuiria, assim, campos de aplicação tais como aqueles de outras disciplinas. Seria inapropriado dela esperar-se finalidades práticas e usos concretos, tais como aqueles que se esperam da Medicina ou da Tecnologia. Não seria por isso, entretanto, que ela não teria relevância. Ela atuaria também sem ter uma área especial de objetivos.


Filosofia como Teoria da Ciência

Compreendida como Teoria da Ciência,segundo os autores do estudo, a Filosofia poderia fazer das outras ciências o seu tema. Sob esse aspecto, possui três campos de tarefas: 1) o exame crítico de métodos das várias disciplinas e os seus resultados segundo fundamentação, adequabilidade e consistência terminológica; 2) a relativação e a sistematização de teorias científicas em desenvolvimentos mais amplos com a ajuda de estudos históricos, e 3) a tematização da relação entre Ciência e Mundo de Vida.


Sob o primeiro ponto, a Filosofia pode oferecer auxílios para a construção de linguagens científicas adequadas e facilitar o trabalho heurístico dos cientistas.


Sob o segundo ponto, a Filosofia abriria a possibilidade de se considerar resultados científicos esquecidos na solução de problemas atuais e de se evitar que êrros cometidos no passado sejam repetidos no presente. A pesquisa histórico-científica pode também mostrar a dependência de objetivos de pesquisa de condições histórico-contingentes.


Sob o terceiro ponto, a Filosofia apoiaria tanto a Ciência quanto a Sociedade. Ela mostraria como as Ciências se desenvolvem a partir da praxis social e nela atuam. Ela pode surgir como intermediária entre as duas, ou seja, como como mediadora.


A Filosofia poderia também questionar normas independentemente de objetos especiais. A Filosofia tem aqui três campos de ação: 1) a ética; 2) o exame da questão do sentido da vida; 3) a filosofia política, que questionaria a organização racional de instituições sociais. A Filosofia assumiria em alguns campos um papel similar ao do juíz que deve julgar entre pontos de vista de especialistas.


Filosofia e História, Filosofia da História


A Filosofia desempenha ainda sob um outro aspecto um papel de importância na crítica à Teoria da Compensação. Um dos principais argumentos dos defensores dessa teoria diz respeito à questão da diversidade das Histórias, da pluralidade que seria própria às Ciências da Cultura em contraposição à globalidade, à unidade quase que a-histórica que seria própria das Ciências Naturais.


Os críticos dessa teoria, no exemplo do artigo citado, vêem aqui, e com razão, um dos pontos vulneráveis da argumentação. Segundo eles, seria pouco defensável pensar-se que as Ciências Humanas existem sobretudo para as Histórias.


Sob esse aspecto, o debate retornou a um dos principais complexos de questões da assim-chamada Filosofia Intercultural: o da Unidade na Diversidade e o da Diversidade na Unidade.



Anotações sumárias do tratado. Grupo Redatorial



  1. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não inclui aparato científico. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição e o índice geral da revista (acesso acima). Pede-se ao leitor, sobretudo, que se oriente segundo os objetivos e a estrutura da Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais - Academia Brasil-Europa (A.B.E.) - e do Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (Institut für Studien der Musikkultur des portugiesischen Sprachraumes, I.S.M.P.S. e.V.), visitando a página principal, de onde obterá uma visão geral e de onde poderá alcançar os demais ítens: http://www.brasil-europa.eu


  2. A A.B.E. é entidade exclusivamente de natureza científica, dedicada a estudos teóricos de processos interculturais e a estudos culturais nas relações internacionais. Não tem, expressamente, finalidades jornalísticas ou literárias. É, na sua orientação teórico-cultural, a primeira do gênero, pioneira no seu escopo, independente, não-governamental, sem elos políticos ou religiosos, não vinculada a nenhuma fundação de partido político europeu ou brasileiro e originada de iniciativa brasileira. A Organização de Estudos de Processos Culturais remonta a entidade fundada e registrada em 1968 (Nova Difusão). A A.B.E. insere-se em tradição derivada de academia fundada em Salzburg pelos seus mentores, em 1919, sobre a qual procura sempre refletir.