Doc. N° 2313
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
112 - 2008/2
Áustria-Brasil-Argentina
Navigare necesse est Vínculos nacionais e justiça histórica na literatura dos Descobrimentos Relendo interpretações de Stefan Zweig
1938-2008. 70 anos do lançamento do livro Magellan; Der Mann und seine Tat (Viena: H.Reichner)
A.A.Bispo
Monumento a Fernando Magalhães, Punta Arenas. Trabalhos da A.B.E. 2008. Fotos A.A.Bispo Poucos são os autores de idioma alemão de maior significado para o Brasil do que Stefan Zweig (Viena 1881 - Petrópolis 1942). Essa relevância do escritor para o Brasil é compreensível, uma vez ter emigrado para o pais, ali deixando a sua vida, e ser autor de uma das obras mais entusiásticas e otimistas jamais escritas por europeu a respeito da sua nova terra. (Brasilien: Ein Land der Zukunft. Bermann-Fischer, 1941; nova ed. Frankfurt a.M.: Insel, 1981; Suhrkamp 1984; trad. port. Brasil, País do Futuro, Obras Completas de Stefan Zweig VI, Rio de Janeiro: Delta, 1960).
"É o mais favorecido dos retratos do Brasil. Nunca a propaganda interesseira, nacional ou estrangeira, disse tanto bem do nosso país, e o autor, por êle, não deseja nem um apêrto de mão, nem um agradecimento. Amor sem retribuição. (...) O amor faz dêsses milagres. Se êle fosse político, ou diplomata, ou economista, ficar-se-ia perplexo; a explicação é só esta, Stefan Zweig é poeta: é hoje o maior poeta do mundo, poeta com ou sem versos, mas com poesia, sentida, vivida, escrita pelo mais suave prosador do mundo..." (Afranio Peixoto, Prefácio, Brasil, País do Futuro, Obras Completas, op.cit. 1-2)
Pouco considerado tem sido porém o significado de Stefan Zweig para os estudos relativos ao Brasil nos seus elos com os países vizinhos do Sul e, portanto, de relevância hoje para intuitos motivados pelo Mercosul.
Esquece-se que Stefan Zweig esteve pela primeira vez no Brasil no decorrer de uma viagem que o levara à Argentina, onde, em 1936, realizou-se um congresso do Pen club.
Sobretudo tem-se pouco presente que Stefan Zweig dedicou-se também à história dos Descobrimentos relacionada com ambos os países. Foi autor de uma das mais destacadas monografias a respeito de Fernão de Magalhães, o descobridor da passagem que une o Oceano Atlântico ao Pacífico. Essa obra, de título Magalhães, o Homem e seu feito, foi significativamente anterior ao Brasilien (nova edição Frankfurt a.M.: S. Fischer 1961). Foi publicada em português em tradução de Elias Davidovich (Fernão de Magalhães, Obras Completas de Stefan Zweig II, Rio de Janeiro: Delta, 1960, 437 ss.)
Motivo condutor: "Vergonha" perante o passado
Na introducão de sua obra, Stefan Zweig elucida os motivos que o levaram a escrever o romance histórico sobre Magalhães. Para isso, parte de reflexões acerca das múltiplas razões que levam um escritor a produzir.
"Livros podem ter a sua origem em sentimentos das mais diversas espécies. Escreve-se livros movido pelo entusiasmo ou pelo sentimento de uma gratidão; também amargura, cólera ou aborrecimento podem porém acender a paixão espiritual. Às vezes a curiosidade se torna o motor, o prazer psicológico de explicar a si próprio, no escrever, pessoas e ocorrências; também motivos de natureza questionável tais como vaidade, vontade de dinheiro, contentamento de espelhar-se levam freqüentemente à produção. Na verdade, um autor deveria dar-se conta, em cada livro, quais foram os sentimentos que o levaram a escolher o seu assunto. No caso deste livro estou perfeitamente ciente da sua origem interna. Ele nasceu de um sentimento um tanto inusual, mas muito intenso: da vergonha." (op.cit. 7, trad. A.A.B.)
O sentimento de vergonha, motivo explícito da origem dessa obra, teria sido resultado de estados psicológicos que Stefan Zweig vivenciara na sua longa viagem à Argentina. Quase que indicativo da melancolia depressiva que se sabe ter enublado a vida interior do escritor, esse sentimento de mal-estar moral derivara-se da atmosfera agradável e confortável da viagem, assim como das condições favoráveis do tempo. Sensações de felicidade e prazer ter-se-iam transformado em tédio, e isso representara um pêso de consciência a um homem que bem sabia das dificuldades por que passaram os navegantes do passado.
"Assim se passou: No ano passo tive pela primeira vez a ocasião muito esperada de viajar à América do Sul. Eu sabia que no Brasil me esperava uma das belas paisagens da terra e na Argentina um convívio incomparável com camaradas de espírito. Já esse sentimento antecipado tornou a viagem maravilhosa, e tudo o que foi de mais amável convergiu a êle durante a viagem, um mar calmo, o relaxamento total no navio ligeiro e espaçoso, o estar livre de todos os laços e vexações quotidianas. Apreciei incomensuravelmente os dias paradisíacos dessa viagem. Mas repentinamente, era o sétimo ou o oitavo dia, deparei-me com uma impaciência irritante. Sempre esse céu azul, sempre esse mar azul, tranqüilo! (...)
Foi necessário apenas esse pequeno segundo, no qual conscientizei-me do meu estado impaciente, e já envergonhava-me. Aqui você viaja, disse para mim mesmo irritado, no mais seguro e todos os navios e na mais bela viagem que se pode imaginar (...) Você sabe, para onde viaja, sabe a hora exatamente quando chegará, e sabe que está sendo esperado da forma mais amiga. (...) Compare por um momento essa viagem com aquelas de antes, sobretudo com as primeiras viagens daqueles aventureiros que descobriram esses mares imensos, o mundo para nós, e envergonhe-se perante eles! Tente imaginar como eles partiram nos seus minúsculos botes pesqueiros rumo ao desconhecido, sem sber o caminha, perdidos no infinito, sempre entregues ao perigo (...)" (op.cit. 8-9; trad. A.A.B.)
A vergonha, motivo do livro, seria, portanto, de natureza moral. A preocupação de mais saber a respeito de nomes e fatos da história da navegação tornou-se um dever de consciência. Dedicando-se a estudar todos os livros que pôde alcançar sobre o assunto, aprendeu a admirar sobretudo a figura de Fernando de Magalhães, considerando a viagem ao redor do mundo como a "mais magnífica odisséia" da história das grandes navegações. Stefan Zweig aproxima, assim, a viagem de Magalhães à Odisséia, o navegador a Ulisses, tocando assim no complexo mítico que mais significado simbólico adquiriu na história dos Descobrimentos, em particular de Portugal.
"E comecei então a imaginar intimamente essas viagens dos conquistadores do mar, profundamente envergonhado da minha impaciência. Esse sentimento da vergonha, uma vez despontado, não mais me abandonou durante toda a viagem, o pensamento nesses heróis sem nome não me deixavam um momento livre. Exigia de mim saber mais sobre aqueles que foram os primeiros que ousaram a luta contra os elementos, ler mais sobre aquelas primeiras viagens nos oceanos não-explorados, cuja descrição já tinha me interessado nos meus dias de menino. Fui à biblioteca do navio e tomei ao azar alguns volumes. E de todas as figuras e viagens aprendi a admirar sobretudo o feito do homem que, segundo o meu sentimento, realizou o ato mais grandioso na História do descobrimento da terra, Fernando de Magalhães, êle, que com cinco pequenas naves partiu de Sevilla para circumnavegar toda a terra - a mais magnífica odisséia na história da humanidade (...). Muito não havia sobre êle naqueles livros, em todo o caso não o suficiente para mim; assim, retornado, li e pesquisei mais, admirado, como se tinha falado pouco e pouco seguro até então a respende desse ato heróico. (...)" (op.cit. 10-11; trad. A.A.B.)
O Brasil no contexto da odisséia de Magalhães
Nesse livro, surgido portanto antes de mudar-se para o Brasil e escrever a sua obra sobre o país, Stefan Zweig dedicou um longo trecho ao Rio de Janeiro. Baseou-se aqui naturalmente no relato de Pigafetta, e essa fonte parece ter sido decisiva para a formação da sua imagem do país. Leituras do seu "Brasilien" não poderiam ignorar esses antecedentes e pressupostos, ou seja, essa contextualização do Brasil no âmbito mais amplo da "odisséia" de Magalhães. A estadia do navegador no Rio é situada no campo de tensões criado pelo fato de estar a serviço de Espanha, tendo abandonado a sua pátria, Portugal.
"A Baia do Rio de Janeiro, do ponto de vista paisagístico com certeza não menos magnífica naqueles dias passados do que hoje na sua opulência urbana, deve ter surgido à tripulação exausta como um verdadeiro paraíso. Ro de Janeiro, batizada segundo o santo Januarius, pois foi descoberta naquele dia do calendário, e denominada errôneamente Rio, porque supunha-se haver um portentoso rio por detrás do emaranhado de ilhas, localizava-se já então dentro da esfera de possessão portuguesa. De acordo com as sua instrução, Magellan devia deixar de aportar. Mas os portugueses ainda não haviam construído nenhum estabelecimento, nem nenhuma fortaleza ameaçava com os seus canhões; a colorida baía era einda de verdade uma terra de ninguém. Despreocupadamente, os navios espanhóis podem deslizar por entre as ilhas encantadoras que protegem a praia florescente, e ancorar sem impedimentos." (op. cit. 141-142; trad. A.A.B.)
O tom de Zweig ao tratar dos indígenas brasileiros - ainda baseado em Pigafetta, revela uma certa atitude condescendente, levemente irônica. Singular é a comparação da antropofagia com a prática de distribuição de carne por ocasião de festas do Divino, uma menção que certamente deveria receber a atenção dos estudiosos da cultura. De onde conhecia Stefan Zweig essa prática tradicional?
"Logo que os botes de ir à terra se aproximaram, os indígenas vieram rapidamente de suas cabanas e florestas e receberam com curiosidade e sem desconfiança os soldados em armadura. Eles se mostravam totalmente de boas intenções e confiantes, embora Pigafetta ter de tomar conhecimento, mais tarde, para a sua decepção, que eles, como canibais, ocasionalmente atravessavam os seus inimigos com espetos e deles cortavam os pedaços mais bem fritos. como de um boi de Pentecostes. Mas os guaranís mostraram perante os estrangeiros divinamente brancos nenhum apetite dessa espécie. Assim, os soldados estão dispensados de ter de usar os arcabuzes incômodos e as pesadas lanças." (pág. 141-ss.; trad. A.A.B.)
Lealdade à pátria e fidelidade à Idéia
No capítulo de título "Uma idéia se realiza", e que se refere a fatos ocorridos entre 20 de outubro de 1517 e 22 de março de 1518, Stefan Zweig trata do episódio da traição de Fernando de Magalhães para com Portugal. Esse ato do fidalgo, de forma ainda mais agravante, é visto como fruto de decisão consciente. Nessa sua traição à Pátria, não podia ser comparado a Colombo ou a outros navegadores que estiveram a serviço de outras nações. O seu despeito pelo tratamento que recebera do rei português teria sido tão forte que estava disposto a prejudicar o seu próprio país, passando ao rival uma de suas principais posses do comércio no Oriente. Para isso, não teria nada menos do que revelado segrêdos de Estado que conseguira apenas devido à sua posição.
"Se Magalhães agora se dirige à Espanha, está consciente de que tirar de rasgar o seu nome fidalgo português como a própria pela, que o seu rei o desprezará e que será para os seus compatriotas através dos séculos o traidor, o "transfuga" sem dignidade. De fato, não é oportuno comparar o abandono da cidadania de Magalhães e a sua passagem desesperada para serviço estrangeiro com a forma de agir de um Colombo, Cabot, Cadamosto ou Vespucci, que também guiaram esquadras estrangeiras pelos mares. Magalhães não abandonou apenas a sua pátria, mas - não se deve silenciar isso - êle a prejudicou, na medida em que leva as Ilhas das Especiarias, que sabe já estarem na posse de seus conterrâneos, às mãos do rival mais ciumento de seu rei, e êle age mais do que ousadamente, até mesmo totalmente de forma não-patriótica na medida em que passa a fronteira com segredos náuticos que obtera graças à entrada na Tesoraria em Lisboa." (op. cit. 80; trad. A.A.B.)
Para tornar ainda mais evidente a gravidade do ato de Fernando de Magalhães, Zweig o transpõe para a sua época, comparando-o com crimes de lesa-pátria e de traição militar.
"Transcrito para a expressão de hoje, Magalhães, na sua qualidade de fidalgo português e antigo capitão da esquadra portuguesa, não cometeu nenhum delito menor do que um oficial que, hoje, passagem para um estado vizinho rival mapas militares secretos e planos de mobilização. E a única coisa que empresta uma certa grandeza a seu comportamento obscuro é que êle não atravessou a fronteira como covarde e medroso contrabandista (...)" (loc. cit.; trad. A.A.B.)
Entretanto, apesar de mostrar compreensão pela questionabilidade do ato e pela imagem negativa que Fernando de Magalhães manteria na sua pátria, Stefan Zweig procura relevar a gravidade de sua ação, salientando que o dever de consciência imposto a um homem por uma idéia que sabe estar a serviço de toda a Humanidade seria mais forte do que o da lealdade à Pátria. Esse homem criador teria na esfera do ideal a sua verdadeira Pátria, uma Pátria espiritual na qual viveria e pela qual entregaria a sua vida:
Mas o homem criador está submetido a outra e mais alta lei do que a nacional. Quem pretende criar uma obra, realizar uma ação ou descobrimento que sirva a toda a humanidade, a sua verdadeira terra não é a sua pátria, mas a sua obra. Será obediente somente a uma instância última: à sua tarefa; a êle será permitido antes desrespeitar interesses de Estado, temporais, do que o dever interno que lhe impõe o seu particular destino e o seu talento. Magalhães, depois de anos de lealdade à sua pátria, no meio da vida, reconheceu a sua tarefa. Como a sua pátria negou-lhe a realização, precisou fazer da sua idéia a sua nova pátria. Decididamente destruiu o seu nome temporal e a sua dignidade civil, para reerguer-se e dedicar-se à sua idéia e à sua ação imortal" (op. cit. 80-81; trad. A.A.B.)
Interesses nacionais e justiça histórica
O capítulo final do livro de Zweig traz o título significativo de "Os mortos não têm direito", o que poderia também ser entendido como "Os mortos são injustiçados". Nesse capítulo, o autor trata da chegada do resto da esquadra em Sevilha, um feito que desde a viagem de Colombo nunca teria entusiasmado tanto a Humanidade. O significado da viagem de circumnavegação tornara-se evidente. Todas as incertezas a respeito da forma da terra tinham sido vencidas: a Terra era definitivamente um globo e um só mar unia os mares. A cosmografia dos gregos e romanos estava decididamente ultrapassada.
O escritor, porém, dedica a sua principal atenção ao julgamento de atos daqueles que sobreviveram a Magalhães e à questão da justiça histórica. Particularmente questionável parece-lhe o desaparecimento do diário de Pigafetta, cujo original entregara ao imperador. Esse diário não poderia ser idêntico com o relato de viagem hoje conhecido, representando este apenas um resumo abreviado das notícias de viagem. A questão que levanta Zweig é a da razão do desaparecimento desse livro. Segundo a sua suposição esse desaparecimento misterioso servira a obscurecer tudo que havia ocorrido contra Magalhães por parte dos oficiais espanhóis, de modo a não ofuscar o triunfo de Sebastião de Cano. Fernando de Magalhães teria sido vítima de uma injustiça e o seu papel histórico deveria passar a um segundo plano. Não um português, mas um espanhol deveria receber as honras da história. Fernando de Magalhães, visto pelos portugueses como traidor, e não sendo suficientemente reconhecido pelos espanhóis, que prefeririam um de seus como realizador do feito, permanecera entre "o martelo e o ambo", sem lugar na história escrita segundo perspectivas nacionais, um destino de todos aqueles que se encontra
"Este consciente "passar para trás" parece já ter aborrecido o fiel Pigafetta. Ele percebe, que aqui se pesa com pesos trocados. Sempre o mundo recompensa o último, o felizardo, aquele que termina uma ação, e esquece todos aqueles que o preconceberam de espírito e sangue e o possibilitaram. Desta vez, porém, a distribuição é particularmente e por assim dizer irritantemente injusta. Justamente aquele que quis impedir o feito de Magalhães nos seus momentos decisivos, o revoltado de então, Sebastian del Cano, tomou toda a fama para si, todas as honras, todas as dignidades. (...) O imperador o eleva a cavaleiro e lhe outorga armas, que evidencia que Cano foi o que completou a ação imortal. (...) Primus circumdedisti me. E a injustiça torna-se ainda mais frapante com a recompensa daquele Estevão Gomez que havia desertado no Estreito de Magalhnaes (...). Toda a fama, toda a obra de Magalhães é dada maldosamente justamente àqueles que tentaram impedir a sua obra de vida durante a viagem." (op.cit. 266-267; trad. A.A.B.)
Injustiça ao maior conhecedor da ciência dos mares
Terminando o seu romance histórico, Stefan Zweig manifesta mais uma vez a sua admiração pela personalidade e pelos conhecimentos de Fernando de Magalhães, fazendo de si palavras da dedicatória de Pigafetta. Fernando de Magalhães não é apenas louvado pelas suas qualidades pessoais mas sim nada menos como o maior conhecedor de todos os tempos da ciência da cartografia e da navegação.
"Pigafetta silencia e tem os seus pensamentos. Pela primeira vez, o maravilhosamente leal jovem, até então inocentemente crédulo, percebe algo da eterna injustiça que enche o nosso mundo. (...) "Eu espero", diz Pigafetta na dedicatória do seu livro ao grão-mestre de Rhodos, "que a fama desse tão magnânimo capitão não se apague mais dos nossos tempos. Entre as muitas outras virtudes que o ornavam, uma era particularmente notável: er era o mais impávido de todos, mesmo nas maiores infelicidades. Ele agüentava mais pacientemente a fome do que outros. Não havia outro homem em toda a terra, que mais conhecesse da ciência dos mapas e da navegação" (op. cit. 268; trad. A.A.B.)
Valor do aumento do Conhecimento
Stefan Zweig expõe explicitamente a sua concepção de valor e de valorizações na história. Segundo êle, o valor não se deduz dos resultados práticos de um feito, mas sim do grau de sua contribuição ao aumento do conhecimento e do auto-conhecimento da Humanidade.
"Mas na História, o valor moral de um feito nunca é aferido pelo interêsse prático. Só enriquece duradouramente a humanidade aquêle que lhe aumenta o conhecimento de si mesma e lhe engrandece a consciência produtiva. Nêste sentido, a façanha de Magalhães supera tôdas as proezas de sua época, sendo ainda maior a sua glória pelo fato de não haver sacrificado à sua idéia, como a maioria dos chefes, a vida de milhares e centenas de milhares e sim apenas a sua. Pelo heroismo feito dêsses cinco navios pequenos, frágeis, solitários, que partiram para a guerra santa da humanidade contra o Desconhecido, e será também inesquecível aquêle que primeiro concebeu a idéia de dar a volta ao mundo, a qual se viu enfim realizada pelo último de seus navios. Com a medida da Terra em vão procurada durante um milênio, a Humanidade recebera, pela primeira vez, uma nova medida para a sua fôrça; pela magnitude do espaço terrestre vencido, comprovou, com renovado júbilo e novo valor, sua própria grandeza. Uma criatura só dá o que há de mais alto quando dá o exemplo. (...)" (Obras Completas, op.cit., 665)
(...)
G.R
. Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).