Doc. N° 2246
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
109 - 2007/5
Tópicos multilaterais Alemanha-Brasil
Análise cultural e a perspectiva culturalista no estudo das transformações político-culturais
Circuito cultural de Baden-Württemberg. 20 anos após Schloß Burg Maulbronn, 2007. Atividades da A.B.E.
A.A.Bispo
Maulbronn. Visita de membros da A.B.E. 2007 comemorativa aos 20 anos da sessão de Schloss Burg para diplomatas e pesquisadores culturais. Fotos: A.A.Bispo A visita de membros da A.B.E. a Maulbronn, em setembro de 2007, motivou a realização de um circuito cultural na região de Baden-Württenberg.
A visita deu-se por ocasião de concêrto na igreja do antigo mosteiro de Maulbronn da Orquestra Sinfônica de Remscheid e Solingen, com a qual estão vinculados alguns dos membros da organização.
Maulbronn: monumento arquitetônico-cultural
Maulbronn é o mais significativo e mais bem conservado conjunto de edifícios e de espaços de um areal cisterciense do globo. Foi fundado em 1147 e é hoje considerado monumento mundial pela UNESCO.
Desde a Reforma Protestante, há séculos, o mosteiro já não abriga monges. Nos seus edifícios instalou-se um seminário evangélico, pelo qual passaram importantes personalidades das ciências (Johannes Kepler) e da literatura (entre outros: Friedrich Hölderlin e Hermann Hesse).
Os Cistercienses na história intercultural européia
O significado histórico-cultural dos Cistercienses para a formação de Portugal e, assim, para todos os estudos que tratam dos fundamentos da cultura portuguesa e brasileira já foi salientado em vários trabalhos.O histórico dessa expansão na Península Ibérica, porém, não pode ser estudado fora do contexto global dos objetivos e das expressões da vida dessa Ordem no contexto europeu. Ao entrar-se na área, marcada que é por construções de madeira e alvenaria destinadas aos artesãos e à economia monacal, o visitante não percebe inicialmente o profundo sentido teológico e místico do conjunto. A severidade e o rigorismo purista e aperfeiçoador das intenções da reforma cisterciense se refletem na arquitetura da igreja, de nobre simplicidade e despojamento, a par de grande perfeição construtiva e de acabamento.
O Paraíso, ante-átrio à frente do portal ocidental, construído entre 1210 e 1215, também encontrado em outras igrejas da época, tal como na Abadia de Maria Laach, é, ao contrário deste, totalmente coberto e cercado por ogivas românico-góticas. A igreja abacial, iniciada em 1150 e consagrada em 1178, impressiona pela estrutura de suas cúpulas e janelas, em geral em estilo gótico tardio. No coro, por detrás de um monumental Cristo pendente na cruz, de 1473, o mobiliário de madeira esculpida (ca. de 1470) testemunha o significado da vida coral no escopo contemplativo dos mongens. As salas internas e os pátios do mosteiro apresentam espaços de expressiva grandeza - tal como o refeitório românico-tardio e gótico primitivo, de ca. de 1225, e fragmentos de pinturas murais. A Sala do Capítulo apresenta uma das mais antigas construções de tetos em forma de rêde que se conhece. De particular interesse é a capela da fonte, situada à frente do refeitório: tem funções práticas, mas é integrada no mundo simbólico que determinou toda a construção. A abadia remonta a uma fundação de Walter von Lomersheim em Eckenweiher, perto de Mühlacker, com monges provenientes da Alsácia (1138). Em 1147, foi transferida para Maulbronn, dando a partir deste local origem a outras fundações, tais como Bronnbach (1151) e Schöntal (1157).
A importância cultural do mosteiro e de suas derivações reside em parte no trabalho de colonização e cultivo de terras até então cobertas de matas. A cultura sistemática das terras e o trabalho de artesania transformou-o no mosteiro mais rico da região. Como centro religioso e cultural, adquiriu renome pela sua disciplina monacal. A queda de Maulbronn deu-se no século XVI. Com a submissão ao Duque Ulrich de Württemberg, protestante, os monges que permaneceram católicos se exilaram num dos priorados do mosteiro, em Pairis, ali vivendo de 1537 até 1548.
Maulbronn desempenhou um papel importante na história da Reformação, uma vez que ali se desenrolou o "Colóquio de Maulbronn" entre os luteranos de Württemberg e os calvinistas do Palatinado. Em 1557, o convento foi extinto pelo Duque Christoph de Württemberg. Conheceu ainda alguns periodos curtos de revivificação no século XVII.
Teoria culturalista no estudo das transformações político-culturais
As relações entre religião e transformações culturais são consideradas, nas Ciências Políticas, sobretudo por autores que consideram os fatores culturais na teoretização de transformações políticas. Esses estudiosos dirigem a sua atenção sobretudo à função da religião ou à persistência de tradições religiosas e culturais de fundamentação religiosa em processos de mudança. Essa focalização tem sido, sem dúvida, na literatura mais recente, determinada pela constatação dos obstáculos impostos por determinadas culturas religiosas na democratização de determinadas sociedades. Sob esse aspecto, salienta-se que a modificação de culturas de fundamentação religiosa é processo de longa duração, não se desenvolvendo a partir de influenciação estratégica, mas sim como resultado quase que de uma evolução. Em estudos politológicos relacionados com questões culturais encontram-se às vezes pareceres por demais generalizadores e pouco diferenciados do ponto de vista culturológico. Assim, sob o aspecto da Pesquisa da Democracia, fala-se de menor ou maior grau de incompatibilidade de religiões com o sistema democrático. Compatíveis com a democracia, apesar de todas as suas diferenciações, seriam sobretudo o Catolicismo latino-americano, o Protestantismo e a cultura japonesa; uma posição intermediária caberia à cultura eslavo-ortodoxa, à hinduista e à "cultura africana". Culturas de cunho confuciano e islâmico, ao contrário, seriam incompatíveis com a democracia liberal. Salienta-se, entretanto, que sociedades confucianas parecem não ser totalmente avessas a desenvolvimentos democráticos, como poderia ser observado em países do Extremo Oriente. O Islamismo, porém, desde que fundamentalista, encontrar-se-ia em oposição à Democracia. A legitimação política a partir de princípios religiosos e o exercício concreto da política segundo dogmas a-temporais, sob o controle de religiosos, seriam contradições a procedimentos democráticos. Quando religiões reclamam a si posição de preeminência perante decisões legitimadas democraticamente, representariam impecilhos para a democratização da sociedade. A secularização da sociedade e a separação entre Igreja e Estado representariam pressupostos para a democracia. (Samuel P. Huntington, The Third Wave. Democratization in the Late Twentieth Century, Oklahoma 1991, cit. W. Merkel, "Transformation politischer Systeme",H. Münkler (ed.), Politikwissenschaft, R.b.Hamburg: Rowohlt 2006 (2a ed.) 217) Ao lado da religião, considera-se sob o prisma culturalista tradições, valores sociais e as experiências históricas de cooperação. Faltando por exemplo uma cultura civil imbuída de simpatia pela democracia, as instituições permaneceriam instáveis. Os valores, os modos de vida e os procedimento de uma sociedade não poderiam ser criados por engenheiros sociais, ou seja, construídos em curto espaço de tempo. Necessitariam ser aprendidos, habitualizados e acumulados como capital social. Recursos morais, tais como confiança e sentido de cooperação cresceriam com o aumento desse capital. Quanto maior for a confiança social tanto mais provável haveria cooperação social e esta resultaria em crescimento de confiança. Duas fontes seriam possíveis para o incremento da confiança social: normas da reciprocidade e rêdes do engajamento cooperativo.
Necessidade de maiores diferenciações
Do ponto de vista dos estudos culturais, esses aportes politológicos, por mais sugestivos e pertinentes que sejam do ponto de vista específico da atual Pesquisa da Democracia, necessitariam ser novamente refletidos com base em estudos histórico-culturais contextualizados e mais aprofundados. O possível reconhecimento de estruturas, sistemas, mecanismos processuais e outros fatores sistemáticos que possam elucidar desenvolvimentos de transformação político-social não pode ser alcançado sem a consideração do fator temporal, ou seja, histórico-cultural. As reflexões encetadas em Maulbronn demonstraram a complexidade desse conjunto de questões na consideração da ação dos Cistercienses na história das reformas da vida monacal, da posse real de terras e seu cultivo ou colonização em diferentes regiões da Europa, das transformações culturais e político-culturais que motivaram ou com as quais se relacionaram e da persistência ou não de ideais e modos de vida comunitária nas culturas assim formadas. A aplicação de instrumentário teórico desenvolvido por politólogos de orientação culturalista mostrou-se difícil e questionável. Uma certa conotação negativa que se prende ao termo "culturalismo" deveria ser superada com uma decidida orientação realmente culturológica dos estudos. Os trabalhos terão prosseguimento
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).