Doc. N° 2179
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
106 - 2007/2
Harmonia oculta é mais poderosa do que a evidente
Idéia de harmonia nas concepções do mundo e do homem e suas expressões arquitetônicas
Jerichow. Trabalhos da A.B.E.
A.A.Bispo
A igreja conventual de Jerichow é uma das obras mais representativas da arquitetura românica do Norte da Europa. Pouco considerada pelos historiadores da arte ocidentais até há poucos anos, devido à sua localização às margens das grandes vias em região da antiga Alemanha do Leste, a igreja vem sendo cada vez mais alvo da atenção de estudiosos como um dos pontos altos do complexo denominado de "Rota do Românico".
O edifício conta com uma história de mais de 850 anos e está estreitamente vinculado com a ação dos Premonstratenses vindos de Magdeburgo. A sua presença ali justificou-se pelas intenções de cristianização de grupos populacionais eslavos da margem oriental do rio Elba. O próprio nome do convento denota uma origem eslava, designando mais tarde toda uma região, a assim chamada Terra de Jerichow, situada entre o Elba e o Havel, no nordeste da atual Saxônia-Anhalt.
O convento foi fundado em 1144, em terrenos do Conde de Stade, primeiramente no centro do povoado e, posteriorimente, fora dele, no local atual, mais propício à introspecção da vida conventual.
A igreja foi construída com tijolos de argila, material utilizado pela falta de pedras na região. Transformou-se, assim, numa das mais extraordinárias obras desse tipo de arquitetura tão característico do Norte da Alemanha e de outros países do Norte da Europa.
O convento foi extinto no século XVI em conseqüência da reforma luterana (1552); desde então, as edificações e os seus terrenos foram utilizados para fins agrícolas. Apesar de tentativas dos Premostratenses de revitalizar o convento, entre 1629 e 1631, o ataque e o saque por tropas suecas, em 1631, levou à supressão definitiva da vida conventual. Algumas décadas mais tarde, em 1685, o Príncipe Eleitor Friedrich Wilhelm de Brandenburg adaptou o edifício para uso de uma comunidade protestante. No século XIX, procedeu-se a uma restauração da igreja no espírito romântico do interesse histórico pela Idade Média.
Gravuras dos séculos XVIII e XIX demonstram uma notável conservação do edifício e de seus jardins. A partir de meados da década de 50, sob o govêrno da então Alemanha do Leste, procedeu-se a uma renovação da igreja. Desde 1965, restaurou-se as salas da clausura, do capítulo, os refeitórios e o átrio. Em 1977, instalou-se ali um museu.
Atualmente, a igreja vem sendo usada sobretudo como sala de concertos, nela se realizando as "Músicas de Verão de Jerichow". Desde o ano de 2004, uma fundação dedica-se à vivificação cultural do monumento. A extraordinária arquitetura do edifício, que propicia análises de proporções e de seu significado no pensamento medieval, confere aos projetos culturais ali realizados uma dimensão mais profunda.
As relações numéricas e geométricas que podem ser estudadas na sua fachada e na organização espacial do seu interior assumem particular interesse para os estudos relativos aos elos entre Arquitetura e Música. Para junho de 2007, planeja-se, assim, a realização de uma Matinée românica dedicada ao tema. O programa inclui uma conferência de Hans-Peter Bodenstein (Seehausen/Altmark) de tema "Do ouvir e do ver, construir e fazer música e do soar inaudível dos coros de igrejas rurais românicas". A seguir, o programa musical, com comentários, oferece um panorama do desenvolvimento musical entre os séculos IV e XII, incluindo cantos ambrosianos e gregorianos, formas primordiais da polifonia, obras organais da Ars antiqua e composições da Ars Nova.
Na jornada de estudos empreendida pela A.B.E., tratou-se da questão do conceito de harmonia nas concepções da Antiguidade e da Idade Média. Esse tema, já considerado em eventos anteriores, representa o cerne dos trabalhos desenvolvidos no âmbito do seminário dedicado à mitologia antiga e o sincretismo helenístico promovido pela Universidade de Colonia, com o apoio da A.B.E.. Esse conceito tem sido analisado com base em concepções filosófico-naturais e considerado relativamente à sua vigência em expressões culturais da tradição brasileira. A fundamentação do conceito de harmonia no edifício de concepções relativas aos elementos, à sua mistura e diferenciação a partir de forças contraditórias, permite elucidar questões da mitologia, da linguagem de imagens e da correspontende cristianização. Tem-se demonstrado que se trata, fundamentalmente, de uma questão da dinâmica mistura de relações antagônicas para a consecução da harmonia relativa ao elemento ar, tanto do micro- quanto do macrocosmo, ou seja, do espírito/alma no homem e na atmosfera do mundo exterior. Na igreja de Jerichow tratou-se da expressão arquitetônica de concepções de harmonia no Românico. Também aqui procurou-se dirigir a atenção não à estruturação harmoniosa/numérica do edifício e de seus muros. evidente, mas à função dessa estruturação na criação harmoniosa da atmosfera, do espírito dos espaços do edifício religioso.
Os debates terão prosseguimento. Este órgão trará informações a respeito do andamento dos trabalhos.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).