Doc. N° 2160
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
105 - 2007/1
Temas em debate
Caminhos do passado - reorientações para o futuro Vias de processos culturais: performação, exploração e colonização
O complexo temático escolhido para dar início aos trabalhos da A.B.E. de 2007 pretendeu estabelecer pontes entre os principais temas discutidos em 2006, dando seqüência aos debates sob novas perspectivas.
A questão da relevância de estudos das vias de comunicação para os estudos culturais vem sendo tratada há anos em eventos e projetos vinculados com a A.B.E., em particular sob o ângulo da análise de rede de contatos sociais e de caminhos de difusão cultural. Relatos de alguns desses estudos, em particular referentes à Bahia, podem ser lidos em números mais antigos desta publicação. Nos últimos anos, em particular no contexto dos trabalhos desenvolvidos por motivo dos 450 anos de São Paulo, sob o título de Poética da Urbanidade, tem-se dado particular atenção aos elos existentes entre os processos de formação de nova identidade através da ação missionária nos primeiros momentos da história colonial e processo de expansão urbana então desencadeado. Essa questão foi discutida, entre outras ocasiões, em sessão realizada no Pátio do Colégio de São Paulo, quando se tratou de temas relacionados com o método missionário jesuítico, a formação de aldeias e o estabelecimento de novas redes de ligação entre os povoados que se criavam. Já em 2002, em simpósio realizado sobre o tema "Rural e Tribal", tratou-se do prosseguimento do processo expansionista em regiões da Amazônia e do Brasil Central, com a abertura de estradas e a extensão da rêde viária, sob o aspecto dos mecanismos culturais que o acompanham. Questionou-se a vigência quase que em automatismo autopoético de similares mecanismos de performação cultural dos indígenas que se confrontam com as novas situações. Um dos problemas levantados e discutidos em seminários que se seguiram relacionou-se com o fator econômico nesse processo de performação de identidades e criador de hibridismos. Salientou-se, por várias vezes, que o processo expansionista europeu, em particular de Portugal, não pode ser analisado apenas sob o aspecto de seus intuitos de propagação cristã, cabendo papel relevante aos interesses comerciais e econômicos em geral. Sobretudo numa fase posterior do processo histórico colocado em ação, é ao fator material que caberia a maior atenção da análise do expansionismo. Grande parte das vias de penetração no interior pode ser explicada sobretudo pela procura de "ouro e pedras preciosas" e, posteriormente, pela necessidade de escoamento das riquezas. O que se discute, porém, é se apesar dessa motivação material a fundamentação do processo expansionista não permaneceu assente em mecanismos inerentes a um sistema cultural que se auto-reproduzia, decorrentes da natureza anti-tipológica e transformadora de identidades - missionária - da civilização cristã. Esse seria o fato que explicaria, por exemplo, a pujança excpecional das expressões culturais em regiões de mineração, uma vez que a labilidade social levaria o homem em posição híbrida a tentar auto-afirmar-se por atos manifestadores do domínio pleno das expressões européias, sem talvez perceber que justamente essa exteriorização perpetualizava, quase que como falta de distinção, uma posição de inferioridade aos olhos europeus. Ao lado das questões relativas ao Hibridismo nas suas diferentes expressões temporais e regionais - termo que naturalmente não deve ser entendido superficialmente no sentido de mistura eclética de estilos e formas - os debates se concentraram, em 2006, sobretudo em problemas relativos à imigração, tanto à emigração de europeus ao Brasil quanto à atual imigração de brasileiros a outros países. Nos estudos relativos à imigração européia ocorrida desde o século XIX, onde os motivos econômicos que levaram os imigrados a abandonar os seus países fornecem em geral o ponto de partida para as considerações, colocam-se novos problemas relativos à análise dos mecanismos de transformação de identidades. Ocorrendo já em época de avançada secularização da sociedade em ambos os lados, e sendo grande parte dos imigrados evangélicos, levanta-se a questão da vigência ou não de mecanismos similares constatados e analisados em situações missionárias de séculos anteriores. Também aqui a entrada de imigrantes no Brasil foi acompanhada pela abertura de estradas, picadas e outras formas de estabelecimento de vias e redes de ocupação urbana em regiões, em geral, até então cobertas de florestas e habitadas por indígenas. Os trabalhos de 2007 foram assim abertos visando um tratamento conjunto mas diferenciado desses três complexos do processo de expansão: o da missão, o da exploração econômica e o da imigração/colonização. Entretanto, teve-se o cuidado de salientar que a atenção não deveria ser dirigida apenas a desenvolvimentos históricos. Partindo-se da premissa de que os mecanismos uma vez desencadeados permanecem atuantes, então conclui-se que as próprias ações do presente relativas aos caminhos do passado inserem-se nesse mesmo processo. Sob essa perspectiva, as medidas que hoje estão sendo tomadas por organismos oficiais e iniciativas particulares relativas a essas rotas e redes tornam-se elas próprias objeto de análise cultural. Nesse sentido, deu-se particular atenção aos projetos e aos empreendimentos concretos relacionados com o Caminho de Anchieta, com a Estrada Real e com as vias da imigração, no caso, no Espírito Santo. Foram tratados, no exemplo dessas três rotas, respectivamente os complexos da missão/performação de identidade cristã, da exploração e da colonização. Com a finalidade de se obter uma visão realista das iniciativas e de se garantir uma contextualização mais adequada das discussões realizou-se uma viagem de estudos às respectivas regiões e vias nos Estados de São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
A.A.B.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).