Doc. N° 2115
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103 - 2006/5
Continuidade do repertório de imagens e mudança confissional Perspectivas interculturais Lieberhausen
Circuito euro-brasileiro de estudos culturais de Oberberg e Vale do Agger
Na série das "igrejas coloridas" (Bunte Kerke) da região de Berg, destaca-se a da pequena localidade de Lieberhausen.
Fundada no século XI por representantes do convento de São Severino, de Colonia, em região rural afastada dos centros urbanos, então no início do processo de ocupação, é uma construção por vários motivos de particular interesse para uma história da arquitetura de orientação culturológica.
A rusticidade e a simplicidade campônea desse edifício, que apresenta a estrutura de uma basílica românica, manifesta-se na espessura de suas paredes e nas pesadas colunas que fazem com que a igreja se transforme em abrigo, em refúgio, em local de proteção, também no sentido concreto do termo.
Do maior interesse para os estudos culturais são as pinturas murais, altamente expressivas na sua ingenuidade, ao mesmo tempo manifestação da cultura popular e meio educativo para fiéis iletrados.
Em particular, salienta-se a orientação apocalíptica do programa pictórico, com representações de demônios e de monstros. A força desse imaginário medieval da história salvífica na cultura popular rural explica o singular fato de ter-se dado continuidade à decoração da igreja mesmo após a Reformação.
Esse universo cultural da Idade Média e a sua fundamentação bíblica surgem, hoje, como insólitos e de difícil compreensão. A experiência obtida nos estudos culturais latino-americanos pode, aqui, oferecer subsídios decisivos.
Neste contexto, vale lembrar a presença de representações grotescas de diabos e diablitos, de monstros e figuras grotescas nas tradições festivas de datas religiosas de vários países da América, tais como o México, Cuba, Peru e Bolívia.
Devido à inserção dessas expressões no ano litúrgico, torna-se possível entender o contexto teológico em que se inserem e os textos do Velho e do Novo Testamento que as fundamentam. A sistemática do imaginário de monstros de tradição bíblica, de dragões, de seres fantásticos do mar e da terra, é passível de reconstruída com base nas expressões populares ainda vivas da América Latina. A partir dessa tradição, abrem-se novos caminhos para a interpretação da arte medieval européia, sobretudo naquela de comunidades rurais.
Por outro lado, coloca-se a questão da sobrevivência desse universo cultural latino-americano e de suas formas de representação visual no futuro, tendo-se em vista a expansão de movimentos evangelicais no continente. A extinção dessas expressões culturais representaria uma grande perda para o patrimônio cultural do Brasil.
A igreja de Lieberhausen oferece um exemplo da possibilidade de permanência do antigo repertório de imagens. Essa sobrevivência, porém, apenas será possível se, através de estudos bem fundamentados, forem reveladas as bases bíblicas dessas representações.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).