Doc. N° 2040
Direção: Prof. Dr. Antonio Alexandre Bispo e Dr. Harald Hülskath © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
96 - 2005:4
Catolicidade, ciências culturais e processo criador sob a perspectiva transatlântica Retiro de estudos O. Messiaen França-Brasil 2005 da A.B.E.
As atividades França-Brasil do ano de 2005 da Academia Brasil-Europa foram abertas com um simpósio dedicado às correntes atuais na teoria da arte e suas implicações para as ciências da cultura em memória a Jacques Derrida.
No decorrer dos trabalhos, discutiu-se, entre outros aspectos, a crítica pós-moderna de edifícios ontológicos e metafísicos da tradição ocidental. Nesse contexto, foram considerados obras e vultos da cultura e da arte representativos do Moderno na cultura do século passado, examinando-se os seus vínculos com edifícios conceituais fundamentados ontológicamente. Salientou-se que significativas correntes da arte e da música do século XX, ao contrário do que muitas vezes se supõe, foram estreitamente vinculadas com concepções de cunho religioso e/ou místico. Esse é o caso das influências teosóficas e místicas no desenvolvimento de novos princípios de organização sonora, em particular do dodecafonismo. Também o serialismo da segunda metade do século foi influenciado por concepções de natureza ontológica e metafísica. A recepção de correntes da música do século XX em países extra-europeus, nem sempre tem levado em consideração essas bases conceituais e os edifícios teóricos correspondentes das técnicas e das tendências estéticas adotadas. Os estudos desses processos culturais de difusão e de recepção transatlânticos necessitam portanto dar atenção a possíveis vigências dos edifícios conceituais subjacentes às técnicas assimiladas.
Para fomentar reflexões desse complexo de questões relativas à recepção de edifícios teóricos inerentes ao Moderno no âmbito de processos transatlânticos, a A.B.E. promoveu um retiro para contemplações e estudos na aldeia de La Grave, nos Alpes Franceses. A escolha dessa localidade deu-se pelo fato de ser ela um dos centros de cultivo da obra de O. Messiaen através dos festivais ali realizados. Recordou-se, com essa jornada de estudos, a passagem dos 35 anos das primeiras discussões relativas à recepção de obras de Messiaen no Brasil.
O. Messiaen (1908-1992), um dos mais significativos nomes da história da música francesa e universal do século XX, professor de compositores que marcaram o desenvolvimento posterior da composição musical, tais como Pierre Boulez e Karlheinz Stockhausen, é um compositor cujas obras se mostram particularmente adequadas para reflexões relativas às conexões entre a procura de novas possibilidades de organização sonora no século findo e edifícios religiosos, místicos e metafísicos. No caso de Messiaen, é a mística católica a determinante de sua obra criadora. A metafísica da luz une-se à concepção musical, e a música surge como luz sonora, capaz de se transformar em luz espiritual no ouvinte. Tais concepções extrapolam simples fenômenos sinestésicos de cor e som, sempre salientados em estudos relativos ao compositor. Trata-se antes de conceitos que apenas podem ser elucidados sob o pano de fundo de uma antropologia cristã e de uma semiologia que, além de signos e sinais, conhece também no seu repertório o sinal especial do sacramento, ou seja, um sinal que não apenas indica uma outra realidade que não é a própria, mas sim que a presentifica. Significativamente, Messiaen via a sua música similarmente a um ato litúrgico.
A.A.B.
Observação: o presente texto oferece apenas um relato suscinto de eventos, estudos e projetos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu conteúdo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).